No dia 8 de janeiro deste ano, Nova York mais uma vez chocou o mundo. A terra onde se inventou o hot dog incluiu em seu cardápio um “hambúrguer decadente”. Não se trata de um bolo de carne qualquer em meio a duas fatias de pão redondo, mas uma iguaria ao preço de US$ 41. As batatinhas fritas estão incluídas nesta conta, mas, mesmo assim, um hambúrguer de US$ 41 só pode ser visto como um escândalo. O restaurante capaz de tal ousadia é o Old Homestead, que desde 1868 está encastelado no distrito dos frigoríficos de Manhattan, no número 55 da Nona Avenida (fone: 212-242-9040). “O nome deste hambúrguer é Decadente”, disse a ISTOÉ o proprietário, Marc Sherry. Decadente, delicioso, ou desperdício, qualquer que seja o nome do bicho, uma verdade permanece: o Old Homestead teve uma onda de publicidade inigualável em seus 135 anos de funcionamento. “O hambúrguer mais caro do mundo”, explodiram as manchetes de jornais. E assim, no fim de semana da estréia, 200 unidades dessa extorsão gastronômica foram para o papo da freguesia. Mas o império dessa novidade durou exatos 19 sessões de almoços e jantares: na segunda-feira 27, o DB, outro comedouro famoso da cidade, lançava um hambúrguer de US$ 50.

A guerra dos hambúrgueres caros começava assim. Nas trincheiras do Old Homestead se aninha um bolo com 560 gramas de carne de Kobe. O boi que fornece a matéria-prima não é um bovino qualquer. Em Kobe, no Japão, o bicho leva a vida na imobilidade de um cubículo ultra-asseado e confortável, mantendo um regime rigoroso de quitutes de soja, cerveja (três garrafas por dia, na fase adulta) e massagens diárias ministradas por quatro japonesinhas especialistas em do-in. O que desqualifica o ditado de que é melhor ser touro por um dia do que boi por um ano. O resultado da paparicação é uma carne “rosadérrima”, em que a alta concentração de gordura está espalhada de modo homogênio pelas fibras, dando ao filé uma aparência de mármore de Carrara. A diferença entre o mármore, este e outros bifes é que pode se cortar o Kobe até com uma colher.

O Old Homestead detém a exclusividade dessa carne na costa leste americana e há dez anos serve clientes que vão da “vegetariana” Madonna, passando pelo “naturalista” Harrison Ford, até o carnívoro voraz Brad Pitt. No princípio, o cardápio exigia US$ 120 por este prazer, mas, com a crise econômica, hoje o filé custa meros US$ 99. “Quando decidimos incluir hambúrguer no cardápio, resolvemos que deveria ser o melhor do mundo e usamos carne Kobe moída”, disse Sherry a ISTOÉ. É claro que esta é uma história para boi dormir: o restaurante precisava achar uma fórmula de vender mais Kobe (que não tem saído muito). A solução foi moer uma quantidade menor de carne, diminuindo seu preço, mas sem aviltar seu carisma. O sucesso ultrapassou expectativas, já que a publicidade súbita e gratuita que o restaurante obteve não tem preço.

Foie gras e trufas – Foi pensando neste, digamos, valor agregado que o chef Daniel Boulud partiu para o ataque. Na verdade, Daniel – que ganhou fama no badalado restaurante Le Cirque e depois no seu Daniel – já havia perpetrado o DB Hamburger. O sanduíche serviria como atração de sua nova casa, o DB Bistro Moderne (City Club Hotel, número 55 Oeste da rua 44. Fone: 212-391-2400). Para ser diferente, o cozinheiro bolou um hambúrguer de carnes nobres, estufado com uma lasca grossa de – acredite – foie gras. A excrescência vem embalada num pão de queijo parmesão e cercada por alface, tomate e batatas fritas. O crime lhe rendia US$ 28. Para obter o pódio do livro dos recordes Guinness, o espertalhão ralou um tantinho de trufas frescas sobre a receita. E, voilà: o hambúrguer mais caro do mundo, ao preço de US$ 50 (ou mais, dependendo da flutuação do preço da trufa).

Contados os lucros, resta saber se os hambúrgueres são gostosos. O DB de US$ 50 é intragável, com aspecto repugnante e odor sufocante. Na história da culinária, apenas o canibalismo, talvez, cause maior aversão. Por seu crime, Daniel Boulud merece perder suas três estrelas e levar 25 chibatadas. Já o Decadente do Old Homestead não ganha lugar no inferno, mas no purgatório. A equipe de ISTOÉ – quatro cobaias que provaram em conjunto o hambúrguer – ressaltou a característica insossa da carne. Os críticos, com paladar mais apurado, dizem que o Kobe é filé para ser comido mal-passado e em fatias finas. Não presta, portanto, para carne moída. Assim, o ex-campeão de preço no mundo dos hambúrgueres não é de se jogar aos porcos, mas não vale os US$ 41. Na lanchonete da esquina come-se sanduíche melhor.

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