Com a identidade falsa de Manoel Ribeiro da Silva, comprada em Santa Catarina, o assaltante Pedro Ciechanovicz, 49 anos, se passava por um corretor de imóveis. Tinha planos de comprar uma ilha para, ao se “aposentar”, se refugiar com a mulher, Maria de Fátima Marcondes, e os dois filhos numa espécie de paraíso. Inteligente, educado e
leitor voraz de clássicos, viveu sete anos sem levantar suspeitas e acreditava que nunca mais voltaria a viver no inferno de uma cadeia. Mas na noite do domingo 9, os planos desmoronaram. Ele foi cercado pela polícia em sua casa em
Curitiba (PR), e só se entregou depois de nove horas de negoci-
ações. Acuado, Ciechanovicz pôs fim a um dos mais longos seques-
tros do País, o do empresário João Bertin, 82 anos, que ficou 156
dias em um cativeiro, no interior de São Paulo.

Ciechanovicz, preso pelo Departamento de Narcóticos (Denarc), foi apresentado como chefe da maior quadrilha de sequestradores que atuam no Brasil. Sua organização – composta por pelo menos 29 pessoas – contava com a participação dos doleiros libaneses, os gêmeos Osman Hassan Issa e Armand Hassan Issa, responsáveis pela lavagem do dinheiro do grupo. Osman foi morto e Armand está preso.

Ex-motorista, nascido em Tupã (SP) e criado no Paraná, Ciechanovicz
é acusado de envolvimento em pelo menos 15 sequestros. Confessou oito, com os quais arrecadou R$ 4,3 milhões. Além de João Bertin, dono de um dos maiores abatedouros do País, também foram suas vítimas
Girsz Aronson (dono das lojas G. Aronson) e outros empresários e industriais paulistas, como Abrahão Zarzur (da Tecelagem Zarzur), Eduardo Tonin (filho do ex-prefeito de Indaiatuba José Carlos Tonin) e José Luiz Lanaro, filho do dono de duas casas lotéricas de Sorocaba,
que foi morto pelos sequestradores, com 14 tiros, em 2001. Girsz
Aronson comemorou a prisão de Ciechanovicz: “Essa foi a maior alegria que eu já pude ter na vida.” Os sequestrados, em sua maioria, eram confinados em uma casa na zona rural de São Roque.

“Ele montava núcleos criminosos, com diferentes integrantes”, diz o delegado Ivaney Cayres de Souza, diretor do Denarc. “O objetivo era dificultar a ação da polícia e não ter o seu nome vinculado aos crimes”, explica o delegado Everardo Tanganelli, que o investigava há 18 meses. A sede da quadrilha funcionava em Suzano, na Grande São Paulo. Altair Rocha, braço direito de Ciechanovicz, era quem levantava os hábitos e a rotina das vítimas. Ele está foragido. A quadrilha gastava em cada sequestro cerca de R$ 150 mil. Temido pelos comandados, Ciechanovicz exigia que os reféns fossem tratados com respeito.

Condenado a 60 anos por roubo, tráfico e estelionato, Ciechanovicz foi preso pela primeira vez em 1981. Ficou três dias na Casa de Detenção, de onde foi transferido para a Penitenciária do Estado. Lá, permaneceu até dezembro de 1995, quando foi para o presídio de Mongaguá, no litoral paulista. Ele tinha cumprido 15 anos de pena ao fugir em 1996. Ciechanovicz contou para a polícia que a Penitenciária do Estado foi a escola onde aprendeu a “arte” do sequestro. Segundo ele, seus professores foram o argentino Humberto Paz, o canadense David Spencer e o cearense Raimundo Costa Freire, sequestradores do empresário Abílio Diniz, dono do grupo Pão de Açúcar.