A reeleição esmagadora do direitista Ariel Sharon como primeiro-ministro de Israel acontece em um cenário tenebroso. O país está mergulhado na pior situação econômica desde 1953, imerso num interminável banho de sangue desde o início da Segunda Intifada (levante palestino), há mais de dois anos, e agora está ameaçado de sofrer as consequências de uma iminente guerra dos EUA contra o Iraque. Nestes tempos sombrios, a linha-dura do Partido Likud de Sharon abateu de vez o Partido Trabalhista, de centro-esquerda, que teve sua mais fragorosa derrota desde a fundação do Estado de Israel em 1948. Foi um vexame para o candidato trabalhista, Amram Mitzna. O Likud pulou de 19 para 37 cadeiras e o Partido Trabalhista despencou de 25 para 19 assentos no Knesset (Parlamento israelense). A surpresa ficou para o partido anticlerical Shinui (“mudança” em hebraico), que propõe o fim dos privilégios aos religiosos ultra-ortodoxos, e passsou de seis para 14 cadeiras, tornando-se a terceira força política de Israel.

A vitória de Sharon não significa apenas que os israelenses preferem um homem de ferro no timão deste navio lutando contra grandes tempestades. A maior abstinência eleitoral da história de Israel (apenas 68,5% dos 4,7 milhões de eleitores votaram) vem demonstrar um certo descrédito da elite política de uma forma geral. Os israelenses não aguentam mais viver em constante insegurança, com medo de serem as próximas vítimas dos homens-bombas, e muitos tornaram-se pessimistas quanto a um possível acordo de paz com os palestinos. Em 28 meses de levante, cerca de 700 israelenses e mais de 1.800 palestinos morreram. Por dois mandatos, os trabalhistas não conseguiram fazer um acordo com os palestinos, nem mesmo sob o ex-premiê Ehud Barak, que quase chegou lá. Os partidos perderam a credibilidade pública não só entre israelenses, mas também com os palestinos. Além disso, não apareceu nenhum líder que fizesse frente a Sharon. O pacifista Amram Mitzna não trouxe novas idéias e não conseguiu transmitir confiança ao eleitorado. Quem trouxe novidades foi o anticlerical Shinui, que representa uma classe média moderna que não aceita um linha-dura, rejeita o poder dos religiosos ultra-ortodoxos e também não acredita nas propostas dos trabalhistas. “O povo israelense não sabe o que quer, já que há uma contradição entre o resultado das eleições e a boa aceitação de políticas trabalhistas em favor da paz”, afirmou a ISTOÉ Carol Saivetz, especialista em Oriente Médio da Universidade de Harvard.

Sharon agora se vê numa sinuca de bico. Ele não pode governar
sozinho, pois não conquistou a maioria (61 das 120 cadeiras do
Knesset) e, portanto, será obrigado a fazer coalizões. Os trabalhistas
de Amram Mitzna se negam a participar novamente de um governo
de união nacional com o Likud – e, de qualquer forma, saíram enfraquecidos. O líder do Shinui, Tommy Lapid, por sua vez, está
disposto a se unir ao Likud se Sharon descartar os religiosos. O premiê sabe que, se se aliar aos partidos da ultradireita e religiosos,
ficará engessado nas manobras no Knesset.

O primeiro-ministro poderá ter até 40 dias para montar seu governo, tempo que deverá coincidir com o início das ofensivas contra o
Iraque. Saddam Hussein à parte, os desafios políticos internos e
externos de Sharon não são poucos. Além da frágil economia, ele
terá que dar uma resposta ao plano de paz do presidente Bush,
planejado para ser implementado até 2005.