O ministro das Comunicações, Hélio Costa, está perto de realizar um sonho. Ele já escolheu o padrão tecnológico da TV digital brasileira – o japonês –, e não vê a hora de chegar a sexta-feira 10, quando o presidente Lula deverá fazer o anúncio formal da decisão. Até lá, porém, Costa vai continuar mergulhado num pesadelo de pressões. Uma batalha entre lobistas está cada vez mais acesa nos bastidores do poder em Brasília. Para defender um dos três modelos de TV digital em jogo – os outros dois são o americano e o europeu –, gigantes mundiais da tecnologia e das telecomunicações pressionam pelo adiamento do anúncio. “Não há mudança de prazo. Temos condições de decidir essa questão até o dia 10”, garante o ministro. A batalha envolve um negócio capaz de render, só na venda de novos aparelhos e acessórios, US$ 1 bilhão nos próximos cinco anos. Sem falar na ampliação do mercado televisivo, já que a tecnologia digital permite transmissões para telefones celulares e tevês instaladas em trens, ônibus e carros. E mais: Argentina e Venezuela devem seguir a opção que o Brasil fizer. Isso significa que a escolha brasileira vai influenciar na definição do padrão tecnológico em boa parte da América Latina.

Nos últimos dias, europeus e americanos em disputa com os japoneses dispararam dezenas de pedidos de audiência com ministros. Até a secretária de Estado dos Estados Unidos, Condoleezza Rice, fez pressão. Telefonemas também pipocaram no segundo e no terceiro escalões dos ministérios. Dirigentes e lobistas de fabricantes de eletroeletrônicos da Zona Franca de Manaus e de multinacionais de telefonia celular (fabricantes e operadoras) tentavam convencer o governo a adiar a escolha. O lobby avançou entre senadores e deputados. As quatro grandes emissoras de tevê estão divididas. Globo, SBT e Record querem o sistema japonês, mas a Bandeirantes busca adiar a definição do modelo, na defesa de um sistema híbrido. O modelo japonês permite, pelo mesmo canal, a transmissão de imagens para televisões fixas, em movimento e para celulares, além de alguma interatividade. O telespectador poderá gravar um programa enquanto acompanha outro, escolher ângulos de imagens, responder a pesquisas e até obter informações sobre produtos expostos no vídeo. Isso multiplicaria os ganhos publicitários das emissoras. Do outro lado está o consórcio europeu, cujo lobby é feito pela maioria das operadoras de telefonia celular do País. Para fazer a transmissão de imagens, o modelo europeu exige o auxílio de um canal de celular, o que aumentaria a receita das operadoras. Há dez dias, entrou firme na batalha o consórcio americano. A todo-poderosa Condoleezza fez chegar ao governo brasileiro o interesse dos EUA na adoção da tecnologia americana, considerada, aqui, a mais restrita. A pressão fez o Brasil, na reta final da decisão, abrir a agenda dos quatro ministros de Lula para novas apresentações dos três consórcios. Pode haver reviravolta.