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DISCRETA
A ministra Gleisi Hoffmann diz que age com sobriedade

Não está frio, mas o cafezinho no quarto andar do Palácio do Planalto – onde fica o gabinete da ministra-chefe da Casa Civil – já foi servido bem mais quente. Desde o final dos anos 1970, quando o general Golbery do Couto e Silva articulou o processo que pôs fim ao regime militar, o comandante da Casa Civil no Brasil pode ser comparado a uma espécie de primeiro-ministro. Um auxiliar inseparável do presidente, com forte ascendência sobre os demais colegas da Esplanada dos Ministérios, gestor das principais ações do governo e maestro da articulação política. Foi com a expectativa de ocupar esses espaços que a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) assumiu o cargo na manhã da segunda-feira 13 de junho. Anunciada como substituta do até então poderoso Antônio Palocci, afastado depois de ser acusado de enriquecimento ilícito e tráfico de influência, Gleisi chegou ao Palácio do Planalto como escolha pessoal da presidente Dilma Rousseff. Foi apresentada ao País como a “Dilma da Dilma”, numa referência feita pela presidente para relembrar o papel de superministra exercido por ela mesma no governo Lula. Passados quatro meses, porém, a ministra está longe de ser a Dilma da Dilma.

Gleisi não esteve ao lado da presidente nos grandes eventos dos últimos meses, como a abertura da Assembleia da ONU em Nova York ou nos encontros com os líderes europeus na semana passada. Também não está na Casa Civil a gestão dos principais projetos do governo para os próximos anos, como a Copa do Mundo de futebol, o PAC, os programas Minha Casa Minha Vida e o Brasil sem Miséria. Sob o comando da ministra Gleisi estão projetos mais pontuais, como o Brasil Maior, o Programa Ciência sem Fronteiras, a implementação da Autoridade Portuária e o processo de concessão de aeroportos, além de projetos voltados às pessoas com deficiência e à proteção de crianças e adolescentes. Na prática, segundo assessores da Presidência, a ministra Gleisi restringe-se a tarefas rotineiras, como a aprovação de contratações de pessoal e a revisão de projetos de lei de interesse do governo. “Desde que assumiu o cargo, ela não mostrou apetite político. Está fazendo um trabalho desambicioso e burocrático”, disse um parlamentar com acesso ao Planalto. Na sexta-feira 7, por intermédio de sua assessoria de imprensa, a ministra afirmou que, “como auxiliar da presidente, sua postura no governo é agir com discrição e sobriedade, o que possibilita um clima de tranquilidade e de confiança junto à equipe de governo”.

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FORTALECIDO
Pimentel, do Desenvolvimento, tem sido acionado pela presidente e ocupa cada vez mais espaço

O esvaziamento da Casa Civil, no entanto, não é uma questão de discrição ou não. As ações com relação à Copa estão centralizadas com o ministro do Esporte, Orlando Silva. Os outros grandes projetos estão sob a tutela da ministra do Planejamento, Miriam Belchior. É certo que parte disso se deve a um decreto feito por Palocci, transferindo essas ações para outras pastas. Decreto que Gleisi teve carta branca da presidente para alterar, mas ainda não o fez. A ideia de Palocci era delegar a gestão dos principais programas para outros ministros e concentrar na Casa Civil a articulação política. Gleisi, no entanto, não tem se envolvido nas grandes articulações com o Legislativo e as rotineiras ficam a cargo da ministra Ideli Salvatti.

Enquanto a presidente Dilma estava em Nova York, na conferência da ONU, o governo quase tomou uma rasteira no Congresso, durante a votação da Comissão da Verdade, criada para investigar fatos ocorridos durante a ditadura. Dilma, que carrega no DNA o enfrentamento do regime militar, tinha interesse pessoal no tema. Quando precisou reunir sua tropa para enfrentar parte da oposição que planejava limitar as ações da comissão, a presidente não telefonou para a ministra Gleisi nem a escalou. Durante horas de telefonemas, mobilizou o ministro da Justiça, a ministra dos Direitos Humanos e os líderes do governo no Congresso. Certamente, uma Dilma da Dilma que estivesse no Brasil em um momento desses seria a primeira a ser acionada.

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HERDEIRAS
Miriam Belchior (à esq.) e Ideli comandam áreas que antes eram da Casa Civil

Também deveria ter sido uma Dilma da Dilma a primeira a ser escalada na semana passada, quando deputados e senadores tramaram votar decisões contrárias aos interesses do governo em relação à distribuição dos royalties do pré-sal. Da Europa, a presidente apagou o incêndio telefonando para o ministro Guido Mantega, da Fazenda, e para o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. À ministra-chefe da Casa Civil coube uma missão mais discreta. Dilma determinou a Gleisi que se reunisse com a bancada do Distrito Federal que vinha reclamando da transferência de algumas diretorias do Banco do Brasil de Brasília para São Paulo. De imediato, a ministra-chefe da Casa Civil cumpriu a missão. Disse a deputados e senadores do DF que por determinação da presidente o Banco do Brasil não está autorizado a transferir as diretorias. “A ministra foi muito educada e convincente ao dar o recado da presidente”, disse o deputado José Antônio Reguffe (PDT-DF) após o encontro.

Ao contrário de Gleisi, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, não para de marcar pontos com a presidente Dilma. O ex-prefeito de Belo Horizonte e amigo pessoal de Dilma tem sido fundamental na discussão dos efeitos da crise econômica, na política de defesa das empresas nacionais e nas barreiras às mercadorias importadas da Ásia. Como prêmio por sua atuação, foi convidado especial da presidente na viagem a Nova York e ajudou-a na revisão do histórico discurso na abertura da Assembleia-Geral da ONU. Também integrou a seleta comitiva que acompanhou Dilma na visita sentimental à Bulgária, terra da família Rousseff.

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"A ministra foi muito educada e convincente
ao dar o recado da presidente"

deputado José Antônio Reguffe (PDT-DF)

Enquanto a presidente Dilma encontrar espaço na agenda e disposição para centralizar atos como o encontro pessoal com o secretário-geral da Fifa, por exemplo (leia reportagem na pág. 38), ou os encontros diários com líderes políticos para tratar da distribuição de cargos públicos, a ministra Gleisi manterá sua rotina de passar os dias à disposição da presidente, sem uma tentativa de ocupar novos espaços ou de enquadrar programas e colegas que não estejam marchando conforme a música. Quando a agenda não permitir uma centralização tão grande e as tarefas inerentes à Presidência exigirem que Dilma precise efetivamente de uma Dilma, certamente Gleisi será vista como forte candidata a protagonizar cenas centrais de uma reforma ministerial. 

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