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As gêmeas Laís e Júlia nasceram com 26 semanas de gestação – cerca de três meses a menos do que o habitual. Foram direto da sala de parto para a incubadora, uma espécie de berço tecnológico regulado para simular o interior do útero. Sob o olhar constante da mãe, Bianca de Camargo Silva, 22 anos, ficarão na UTI neonatal, destinada aos bebês prematuros, até completarem seu desenvolvimento. “Elas ganharam peso. A Laís nasceu com 33 centímetros e 745 gramas. Agora, 15 dias depois, já tem 855 gramas. A Júlia, mais comilona, chegou com 1,2 quilo”, lembra Bianca.

Ao lado delas estão o colega Vinícius, nascido com 26 semanas, e a mãe, Kerlly de Oliveira. Ele completou 39 semanas de vida e tem 2,8 quilos, o que seria suficiente para a alta. Mas falta uma conquista. “Vinícius continua dependente do oxigênio dado pelo suporte respiratório. Precisamos superar essa etapa”, diz Kerlly, que fica pelo menos 12 horas diárias ao lado do filho.

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Se nascessem há duas décadas, a história desses bebês seria diferente. Teriam chances bem menores de sobreviver. Hoje, as taxas de sobrevida aumentaram muito por causa de importantes descobertas. Uma delas é a de que o ambiente mais adequado a sua sobrevivência deve imitar as condições da vida intra-uterina. Isso tem causado muitas mudanças. “Eles devem se sentir como se estivessem em uma piscina aquecida e aveludada, como o útero”, diz Paulo Nader, responsável pelo setor de neonatologia da Sociedade Brasileira de Pediatria. Por isso, assim que nascem, o interior da incubadora onde serão mantidos pode chegar a 39 graus centígrados (eles têm dificuldade em manter o corpo aquecido). Muitos também são tratados com a droga surfactante nas primeiras horas de vida. Trata-se de uma substância naturalmente fabricada nos alvéolos pulmonares. Quando a produção é baixa ou inexistente, pode haver dificuldades sérias. “O medicamento ajuda a manter a elasticidade do pulmão. Isso teve grande impacto na redução das complicações respiratórias”, explica Graziela Del Ben, chefe do Atendimento Neonatal do Hospital e Maternidade São Luiz e professora da Universidade Federal de São Paulo. Até a espera pela primeira refeição diminuiu. Ela chega nas primeiras 24 horas por meio de cateter na veia fornecendo um composto de glicose, gordura, proteína, sódio, potássio, cálcio e vitaminas. “Com isso, a perda de peso é menor e eles não desidratam”, diz Paulo Nader. Antes, demorava pelo menos dois dias.

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Outra diferença é recente na política de humanização do atendimento. Os pais podem ficar 24 horas junto com os bebês. Quando ficam mais estáveis, os pais podem colocá-los sobre a pele. É o método canguru, cuja prática nos hospitais públicos virou regra em 2000. “O bebê fica mais seguro e os pais também”, garante a neonatologista Cláudia Tanuri, da Maternidade Santa Joana, em São Paulo. Paulo da Costa, 42 anos, pai dos prematuros Breno e Bruno, aprova a iniciativa. “Em contato com os batimentos do meu coração, eles relaxam e dormem”, diz. Também faz parte da humanização deixar a criança em paz. “Os procedimentos de enfermagem, fisioterapia e outros são feitos de uma só vez. É a manipulação mínima”, diz Fernanda dos Santos, enfermeira-chefe da unidade neonatal do Hospital São Luiz. Todo esse aparato técnico e emocional salva vidas. “Há uma década, bebês de 27 ou 28 semanas eram inviáveis. Hoje, com 22 semanas já conseguem vencer a luta pela vida”, diz a neonatologista Sônia Salviano, de Brasília.

A medicina também procura soluções para as seqüelas que podem acompanhar o desenvolvimento dos prematuros, como problemas de fala, audição e motores. Para vigiar a saúde deles, cresce o número de ambulatórios com essa finalidade. “Eles precisam ser estimulados”, diz a médica Graziela. A exatleta Márcia Teixeira, do Rio de Janeiro, seguiu à risca a recomendação. Desde os primeiros meses, colocou as filhas trigêmeas Ágata, Eduarda e Isadora, de seis anos, para praticar esportes e dança. “Hoje são iguais a qualquer criança da idade delas”, diz a mãe. Mas o cuidado é constante. Uma das garotas, por exemplo, precisou de fonoterapia para não trocar sílabas e usa aparelho para corrigir a posição da mandíbula, alterada por causa da falta de espaço no útero.

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Há mais novidades, como o uso da música. Uma vez por semana, a terapeuta ocupacional Mônica Lemos e o professor de música Ricardo Freire, da Universidade de Brasília, fazem audições musicais com as mães e bebês nascidos antes do tempo. Durante a execução de acalantos e temas musicais criados por Ricardo, Mônica e as mães experimentam brincadeiras para estimular os movimentos e a percepção sensorial das crianças. “Com a música, elas se desenvolvem mais rápido”, diz a terapeuta. O trabalho existe há dois anos. “A música melhora a atenção e a concentração”, diz Ricardo.