O programa Festa do Mallandro, transmitido todos os sábados pela TV Gazeta, está longe de ser a atração favorita do procurador da República do Distrito Federal Brasilino Pereira dos Santos. Contudo, não fosse sua estadia num hotel de São Paulo sem TV a cabo, no último fim de semana, ele não conheceria a incrível e triste história das brasileiras agenciadas para trabalhar em boates no Exterior. Na noite do dia 23, Sérgio Mallandro entrevistou duas mães das vítimas. Sua equipe de reportagem conseguiu localizar o cafetão e colocá-lo na frente das iradas senhoras. Deu-se, então, uma sequência de insultos. Ora as mulheres culpavam o dono da agência pelo sumiço das filhas no Japão, ora eram obrigadas a ouvir que as meninas viraram prostitutas porque assim desejaram. "Isso aqui não é brincadeira, não é novela", bradava o apresentador. Inconformado com a explícita demonstração de tráfico internacional de garotas, o procurador ligou para o plantão da Polícia Federal. Era quase meia-noite.

A delegada Silvia Candido Correia decidiu acompanhá-lo para autuar o agenciador em flagrante. Com a demora da chegada da viatura e o chá de cadeira dado pelos seguranças da emissora na avenida Paulista, os dois foram descobrir na madrugada de domingo que o programa fora gravado dias antes. A informação veio da advogada da TV Gazeta, que, por telefone, entendeu a preocupação da polícia e prometera entregar uma cópia da reportagem. Para surpresa de Brasilino e dos milhares de espectadores que compartilharam daquele suspense, tudo não passava de uma farsa, uma encenação com atores contratados.

O procurador soube disso na segunda-feira 25, horas antes de a fita ser entregue pelos advogados da Gazeta. Já os demais espectadores tiveram de se esforçar para captar a mensagem do Mallandro no programa do sábado 2. Durante a gravação, acompanhada por ISTOÉ na quarta 27, não houve sequer o pedido de desculpas pelo fato de exibir uma história forjada. "Recebemos muitos telefonemas nos parabenizando pela simulação da semana passada", repetia o malandro, como se todos soubessem o que ele queria dizer com a palavra "simulação". Essa explicação seria fundamental, pois na suposta reportagem uma mulher da equipe simula estar interessada em trabalhar no Exterior para entrar na agência com uma câmera escondida.

Segundo o diretor da Festa do Mallandro, José de Almeida, o aviso
de que se tratava de uma montagem não foi feito antes para que as cenas causassem maior impacto ao público. "Iríamos contar tudo no sábado seguinte", diz, negando que a revelação só tenha ocorrido devido às pressões do procurador. O especialista na Lei de Imprensa Luís Francisco Carvalho explica que a única punição garantida à emissora é a perda de audiência pela falta de credibilidade. Para o procurador Brasilino, que mobilizou a Polícia Federal e foi dormir de madrugada por causa da farsa, há uma grande injustiça no momento em que a suposta mãe disse já ter procurado as autoridades e nada havia sido feito. "Tanto isso é mentira que, quando a história foi ao ar, as autoridades agiram imediatamente", completa.