O público brasileiro que frequenta casas noturnas vê o crescimento de um estilo musical que agita as noites européias e americanas há cerca de três anos: a black music. Até há pouquíssimo tempo, o que imperava na maior parte das pistas de dança do País era o bate-estaca da música eletrônica. Não que o movimento esteja em decadência – ainda há muitas casas que dão preferência ao techno –, mas cada vez mais o ritmo do rap, vindo do hip hop, por exemplo, conquista adeptos por aqui. Tanto que os proprietários do ramo de entretenimento apostam no som como a promessa para 2004. Em São Paulo, são raras as boates que não têm uma noite dedicada à black music. Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre e Belo Horizonte, entre outras capitais, também se renderam ao ritmo contagiante do hip hop – verdadeiro estilo de vida que surgiu em meados da década de 70 nos guetos de Los Angeles e Nova York.

O hip hop é composto por quatro elementos: o MC ou rapper, aquele que entoa as canções, o DJ, que define a batida da música, o break, uma dança sensual cadenciada, e o grafite, a expressão visual. Surgiu na periferia como forma de protesto às péssimas condições sociais, mas logo se popularizou e caiu no gosto também das classes média e alta. “Antigamente, os proprietários de casas noturnas não queriam abrir suas portas para a música dos guetos. Hoje em dia, isso está tão invertido que quem não abrir fica por fora”, conta o cineasta Felipe Briso, autor do documentário Agosto Negro 2003 – hip hop salva.

A casa noturna Ibiza, em São Paulo, dedica sua noite de quarta-feira à música black. O projeto teve início em dezembro de 2003, com enorme sucesso: quase duas mil pessoas lotam as três pistas de dança, comandadas por DJs das rádios Transamérica, Jovem Pan e 97 FM. Tudo sob a tutela do produtor musical Primo Preto, um dos precursores em trazer o estilo musical para a noite brasileira, há quase dez anos. Além da Ibiza, ele também promove o hip hop em outras casas noturnas paulistanas e cariocas, como o Urbano e até o Lov.e, reduto absoluto da música eletrônica em São Paulo que se rendeu à moda da vez. “O estilo chegou para ficar. Não é só na noite que a onda pegou: nas rádios, nas ruas, na maneira de se vestir… O black está em toda parte”, afirma Primo Preto.

Nas pistas da Ibiza, artistas que vendem milhões de discos, como Beyoncé Knowles, Jennifer Lopez, Jay-Z, Alicia Keys, Outkast, Ja Rule, 50 Cent, e os brasileiros Racionais MC’s e Xis, fazem os frequentadores ferver. Os casais dançam junto, rebolam e inventam coreografias. Fernando Miceli, proprietário da casa, explica o sucesso. “É impossível não dançar com a batida do hip hop. É contagiante e sensual, tudo
a ver com o Brasil. Os pedidos são tantos que, além de uma noite exclusiva, temos uma pista que toca black todos os dias da semana”, diz. A estudante Priscila Oiamada, 20 anos, e a digitadora Fernanda Helena, 26, fazem coro. As duas não perdem uma noitada de quarta-feira. “Depois que começamos a ir a baladas de black music, paramos de ir às outras”, afirma Priscila.

No Rio, a badalada casa noturna Baronetti, em Ipanema, frequentada

por famosos como Luana Piovani e Eric Marmo, entre outros, ampliou o investimento no hip hop. Diante da grande expansão do ritmo, o

promoter Bruno Vilardi afirmou que “não tinha como não realizar um evento específico”. Assim, as quintas-feiras – dia “nobre” – foram bloqueadas para o evento. Dois DJs especializados no som comandam as pistas de dança, sempre lotadas, apesar dos preços salgados – R$ 55 para homens e R$ 25 para mulheres. O DJ residente Calbuque defende o gênero musical, às vezes atacado como violento e pesado. “O hip hop prega o discurso de união e camaradagem”, diz. Já o DJ Mau, da casa noturna Macao, em São Paulo, viu as boates lotarem nas quintas-feiras depois que começou a tocar black music, há seis meses. “Comecei quase por acaso, quando a DJ do dia faltou. O ritmo contagiou a galera e, na semana seguinte, o público pediu a minha presença novamente”, lembra. O sucesso foi tanto que, para evitar as enormes filas na porta e a superlotação, o Macao passou a tocar hip hop também às quartas-feiras. A modelo Juliana Bahia, 22 anos, é frequentadora assídua. “Conheci a noite black quando morei em Paris, há dois anos. Agora que está ‘pegando’ no Brasil, posso curtir o som aqui”, diz. O promoter Cadu Madocks, da produtora Chocolate Crew, também colhe os louros do sucesso das baladas de terça-feira na Lucky, em São Paulo. “Nossas noites são as mais cheias da casa noturna. 2004 vai ser excelente para o hip hop”, garante. Alguém duvida?