Assista à conversa do repórter Flávio Costa com o ex-skinhead e escritor David Vega :

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INTOLERÂNCIA
Tatuagens skinheads no corpo de Lucas Rosseti, acusado de matar a facadas
Eugênio Bozola e Murilo Rezende da Silva (no detalhe) no crime da rua Oscar Freire

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A polícia de São Paulo está diante de um desafio de dimensão e complexidade semelhantes à luta contra o Primeiro Comando da Capital, o PCC. Divididas em correntes que representam de maneira caricatural todas as matizes do espectro ideológico, gangues de skinheads se proliferam nos centros urbanos, tendo como alvo preferencial gays, negros, nordestinos e judeus. Nas últimas semanas, uma série de ataques com a marca dessa facção se impôs sobre a cidade, atordoando as forças policias, que tentam aprender a lidar com esses delinquentes que misturam violência com ideologia. “São grupos fechados e com normas rígidas de conduta capazes de matar ou morrer por uma ideologia, o que dificulta ainda mais o trabalho das autoridades de segurança pública”, afirma a antropóloga Adriana Dias, do Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação da Universidade de São Paulo (Leer-USP).

Povoado por jovens de diferentes origens sociais, com idades que variam entre 15 e 28 anos, o mundo dos skinheads é um círculo vicioso de violência. Nos últimos dois anos, as brigas ficaram ainda mais acirradas com o aumento do número de integrantes de gangues que rejeitam o preconceito racial e a homofobia. Autointituladas anarquistas e comunistas, elas são inimigas de gangues de ideais neonazistas, ou de ideologia nacionalista e conservadora, como os Carecas do ABC. O caldeirão ferve porque todos se encontram nos mesmos lugares. O show da banda inglesa Cock Sparrer em uma casa noturna no bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, no dia 3 de setembro, por exemplo, foi uma tragédia anunciada. Havia membros de pelo menos 20 facções antes do início do evento. Houve um violento confronto que fugiu ao controle da polícia presente ao local. Entre as dezenas de feridos, um morto, Johni Raoni Falcão Galanciak, 25 anos, golpeado com 20 facadas. Guilherme Losano Oliveira, o “Treze”, foi preso pelo crime. Atualmente ele está envolvido com neonazistas, segundo policiais, e foi amigo de Galanciak. A antropóloga Adriana considera as penas imputadas às gangues muito brandas. “A impunidade colabora para um ambiente de intolerância cada vez maior.”

Titular da Delegacia de Crimes Raciais e de Delitos de Intolerância de São Paulo (Decradi), a delegada Margarette Barreto afirma que sua equipe já mapeou 25 gangues que agem de maneira violenta em São Paulo. O lugar mais recorrente dos conflitos é a rua Augusta, na zona central. Quase uma semana depois do confronto de Pinheiros, ISTOÉ apurou que skinheads foram acusados de cortar a garganta de um adolescente de 15 anos, membro da facção Carecas do Subúrbio, de orientação nacionalista. “Quando eu estava saindo da boate, eles me perseguiram e me cortaram com uma garrafa”, disse o jovem, que levou 12 pontos no pescoço.

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VIOLÊNCIA
David Vega (acima) escreveu um livro sobre suas experiências com neonazistas.
Guilherme “Treze” é preso pela polícia pelo assassinato do ex-amigo Johni Galanciak

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Outro caso característico do crime de ódio é o duplo assassinato do analista de sistemas Eugênio Bozola e do modelo Murilo Rezende da Silva, em um apartamento na rua Oscar Freire, no bairro dos Jardins, região nobre de São Paulo. O autor do crime, Lucas Rosseti, 21 anos, chegou a escrever em sua conta no Twitter que “estava infiltrado no mundo gay”, antes de cometer o assassinato no final do mês passado. As vítimas foram mortas a facadas no apartamento de Bozola, que hospedava o modelo e Rosseti. As fotos do corpo de Rosseti, feitas no dia da sua detenção, no dia 10, mostram tatuagens de símbolos ligados aos skinheads, como soco-inglês, caveiras e a bandeira nacional rodeada por machados. Agora, a polícia investiga se ele tem envolvimento com facções radicais.

Foram registrados também pelo menos quatro casos de agressão contra nordestinos e negros por skinheads nos últimos dois meses em São Paulo. E esse tipo de violência ideológica atinge outras capitais brasileiras. No dia 7 de setembro, neonazistas agrediram um casal homossexual na praça da Liberdade, em Belo Horizonte. Distúrbios provocados por essas gangues foram anotados este ano no Recife e em cidades do Rio Grande do Sul. Mas há aqueles que querem dissociar o movimento do preconceito. Um protesto intitulado “Nazismo Nunca Mais”, organizado por “antifascistas” foi marcado para o sábado 17 na avenida Paulista, a fim de pontuar que há grupos contrários à violência.

Violência conhecida de perto pelo estudante de sociologia, David Vega, 22 anos. Entre os 16 e 18, ele se envolveu com skinheads de orientação neonazista e participou de várias missões, entre elas xingar homossexuais e se envolver em arruaças. O apoio dos pais e a constante sensação de medo o fizeram se afastar das antigas amizades. “Você vive numa sociedade secreta, praticamente excluído do convívio social”, afirma. “Eles não se permitem questionar nada nem tentam entender o outro.” Da experiência restou um livro, “Cadarços Brancos” (Ed. Giostri). Os skinkeads apenas são democráticos quando o assunto é destilar seu ódio. A mais recente vítima foi a Miss Universo eleita no dia 12 de setembro em São Paulo, a angolana Leila Lopes, que se tornou alvo de injúrias raciais na internet. Em inglês e português, neonazistas expressaram sua revolta em fóruns contra a vitória de uma negra com xingamentos como “Filha de King Kong” e “Macaca”.

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