Joaquim Roriz, 69 anos, diz que não guarda fotos da infância. A fotografia não era um hábito das fazendas do interior de Goiás nas décadas de 30 e 40. Mas ele tem bem guardadas na retina cenas daquela época. Lembra como o espoucar de um flash que, aos 13 anos, gostava de sentar no alpendre da velha casa de madeira da fazenda Vicente Pires para ouvir as histórias do pai, o político Lucena Roriz, do velho PSD. “Gostava quando meu pai dizia que um dia a capital do Brasil iria mudar para Goiás. Seria erguida na região onde morávamos. Desde criança, todos os dias, fui crescendo com essa esperança.” A esperança virou realidade – ele não foi para a capital federal; mas ela veio até ele. A mudança do Distrito Federal para Goiás produziu uma curiosa coincidência na sua vida. Por orientação paterna ainda nos tempos do velho Goiás, ele passou a comandar a invernada, a transferência do gado na estação seca do cerrado para uma área na qual havia fartura de água e pasto. Tratava-se de outra propriedade da família, a fazenda Águas Claras, onde o governo federal decidiu depois construir a morada oficial do governador de Brasília, chamada Residência de Águas Claras. E é lá que, pelo voto, ele hoje mora como governador do Distrito Federal.

Outra cena vem à memória, desta vez como um filme: “Era 18 de abril de 1956. Estava no meio da multidão que aguardava a chegada do presidente Juscelino Kubitschek no aeroporto de Goiânia para assinar a mensagem com o projeto de criação da nova capital. Chovia muito naquela noite e o avião não podia pousar em Goiânia. Parou numa cidade próxima, Anápolis. Lá mesmo o presidente assinou a mensagem, num botequim, enquanto eu e uma multidão ouvíamos pelo rádio, quase sem querer acreditar, que o sonho da nova capital estava virando realidade.”

Brasília foi decisiva para ele trancar a matrícula na Faculdade de Economia da Universidade de Goiás e começar a atuar como empresário no fornecimento de areia extraída do rio Corumbá para a construção da nova capital. “Lembro do primeiro caminhão de areia para a obra do Palácio da Alvorada. Estava dentro da boléia com o motorista.” Participando ativamente do sonho de Brasília, decidiu entrar na política. A sua trajetória é impressionante – quatro décadas de vida pública e nenhuma derrota. Ao contrário: vitórias e conquistas que se repetem desde o início da década de 60 como o vereador mais votado da cidade de Luiziânia. Foram 13% dos votos, marca jamais superada.

Aderiu ao grupo autêntico do PMDB em plena fúria da ditadura militar. Em 1974, elegeu-se o deputado estadual mais votado de Goiás. Reeleito quatro anos depois, colaborou com a derrota da Arena ajudando a eleger o combativo peemedebista Henrique Santillo para o Senado. Sob a influência do senador, rompe em 1980 com o PMDB e funda o PT em Goiás. “Achávamos que seria a solução para Goiás e para o Brasil.” Logo depois, diz ter se tornado “vítima do preconceito petista contra empresários” e rompe com o PT. Em 1982, retorna ao PMDB junto com Santillo e elege-se deputado federal. Quatro anos depois, é eleito vice-governador de Goiás. Com uma semana de mandato e os desmandos existentes na administração de Goiânia, foi nomeado prefeito da cidade. Colocou as finanças municipais em dia e começou ali a mostrar sua marca de administrador.

Preparando-se para disputar com chances reais de vitória o governo de Goiás, enfrenta em 1988 um desafio que marcaria sua vida: o convite do então presidente José Sarney para assumir o governo do Distrito Federal. Desiste de disputar o governo de Goiás e fica um ano e sete meses no cargo, até o fim da gestão Sarney. Depois, tem uma pequena experiência como ministro da Agricultura no governo Fernando Collor, mas bate de frente com a poderosa ministra da Economia, Zélia Cardoso de Mello. Resolve então concorrer à primeira eleição direta para governador do Distrito Federal, em 1990. Nova vitória.

Também imprimiu nesse governo a sua marca de administrador, promovendo grandes transformações em Brasília. Transferiu 64 favelas, construindo oito cidades satélites. Foram mais de 500 mil pessoas beneficiadas com o direito a casa própria, todas com saneamento básico. Onde hoje é o bairro mais valorizado da capital, o sudoeste, existia um favelão. “Acabei com todas as favelas. Minha missão é cuidar do pobre. Uma cidade não pode ser só dos ricos”, festeja. Deixou o governo com popularidade em alta, mas não havia reeleição naquela época. Decidiu não concorrer a cargo eletivo. Levou o governo até o final. Em 1998, voltou, derrotou o candidato à reeleição, o então petista Cristovam Buarque, e reelegeu-se em 2002.

Outras obras do governo mudaram a cara do DF, que tem 97% da população com água potável e 98% das crianças entre sete e 14 anos na escola. Entre elas, os 26 quilômetros de metrô, as centenas de vias e viadutos e a ponte JK, eleita a mais bonita do mundo em 2003. Atualmente, o governo desenvolve 75 projetos sociais para a melhoria da qualidade de vida do morador de Brasília, única cidade latino-americana com 100% de saneamento básico, graças à construção de estações de tratamento de esgoto. O governador sempre quer mais. Revela uma conversa com Oscar Niemeyer na qual o gênio da arquitetura explicou que Brasília não está completa. Na Esplanada dos Ministérios havia espaço para erguer o Museu e a Biblioteca Nacional. Niemeyer desenhou as obras e o governo as entregará em março do ano que vem.