gnovo.jpg

Cesar Cielo é mesmo um iluminado. Quando o mundo do esporte dava como certo o seu afastamento das piscinas por doping, ele, como todo bom atleta, se superou outra vez. Na quinta-feira 21, em Xangai, na China, a Corte Arbitral do Esporte (CAS) julgou o caso do brasileiro e, ratificando uma punição da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), apenas o advertiu. Cielo e outros três nadadores (Henrique Barbosa e Nicholas Santos, igualmente advertidos, e Vinícius Waked, suspenso por um ano por reincidência) testaram positivo para a furosemida, diurético que mascara outras substâncias dopantes, em um exame realizado em maio durante o Troféu Maria Lenk. Pelo código da Agência Mundial Antidoping (Wada), Cielo poderia pegar até dois anos de suspensão e perderia não só o Campeonato Mundial de Esportes Aquáticos, marcado para começar no domingo 24 na China, como também os jogos Pan-Americanos de Guadalajara e a Olimpíada de 2012, em Londres.

A condenação branda do nadador brasileiro é um marco. “O julgamento de doping vai ser antes e depois de Cielo”, diz o advogado especializado no tema Luciano Hostins, que defendeu a saltadora Maurrem Maggi, em 2003, quando ela foi condenada a dois anos por uso de substância ilícita. “É a primeira vez desde 2009, quando o novo código entrou em vigor, que a CAS aplica apenas uma advertência. Criou-se uma jurisprudência.” Antes disso, era raro um atleta não amargar dois anos de suspensão, no mínimo, quando o exame dava positivo. Isso ocorria porque era pequena a lista de substâncias que geravam pena branda – encontradas em medicamentos para tratamentos de doenças ou em suplementos alimentares e que comuns no dia a dia de muita gente. A lista de substâncias que resultavam em penas mais robustas era maior.

Há dois anos, a Wada resolveu inverter essa lógica. Por isso, a pena, atualmente, é menor. Hostins é advogado da atleta de arremesso de peso Geisa Arcanjo, 18 anos, que testou positivo para furosemida em uma competição no ano passado. Recebeu, como Cielo, uma advertência da Comissão Disciplinar Nacional do Atletismo e aguarda para saber se a Associação Internacional de Federações de Atletismo (Iaaf) recorrerá ao CAS por uma pena maior. “Se isso ocorrer, vou pedir a manutenção da advertência também usando o precedente aberto ao Cielo”, diz Hostins. O nadador ficou livre para competir já no Mundial ao provar que uma contaminação em um laboratório de suplementos de cafeína afetou o teste. “A verdade prevaleceu e estou virando esta página da minha vida”, disse ele.

Nenhum atleta, porém, sai ileso depois de conviver com o fantasma de uma suspensão por doping às vésperas de uma competição importante. “Sem dúvida, esse processo gera uma influência negativa no desempenho do Cielo”, diz a psicóloga do esporte Mara Raboni, da Universidade Federal de São Paulo. “Esses 20 dias de espera até o resultado da CAS já o afetaram. Vamos torcer para que seja pouco.” O brasileiro, na noite do sábado 23, participaria da eliminatória da prova dos 50 m borboleta. Para superar a ansiedade e a insegurança criadas por esse tipo de situação, é preciso fortalecimento mental, como noites de sono tranquilas, boa alimentação, convivência com pessoas amigáveis e exercícios (meditação, por exemplo).

Cielo, recordista mundial, foi um dos cinco mil atletas que são testados por ano no Brasil – desses, entre 0,8 a 1,5% é flagrado com substâncias ilícitas. Com o doping dos quatro nadadores, o Brasil chega a 13 casos registrados desde 2008. Ocupa a nada honrosa liderança do ranking de doping de esportes aquáticos da Federação Internacional de Natação (Fina), seguido da França (com nove casos), Rússia (seis) e Estados Unidos (quatro).

Desde que o Rio de Janeiro ganhou o direito de sediar a Olimpíada de 2016, as decisões tomadas pelos órgãos esportivos daqui ganham repercussão internacional. O País é a bola da vez no esporte olímpico e, por isso, estão todos de olho na forma como o Brasil trata o tema. E o controle de antidoping precisa evoluir. Há apenas um laboratório credenciado pela Wada, o que não chega a ser pouco, uma vez que apenas os Estados Unidos e a Alemanha possuem dois. Entre 2004 e 2007, o Ministério do Esporte investiu R$ 7 milhões para melhorar a infraestrutura, aquisição de novos aparelhos e capacitação da equipe técnica dele.

Está prevista a criação da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD), compromisso assumido pelo País quando a candidatura carioca venceu. Enquanto não sai do papel, o ministério disponibilizou mais R$ 563,9 mil para compra de equipamentos para detecção de hormônio do crescimento humano – uma exigência da Wada –, material de consumo e capacitação de pessoal para operar as novas máquinas. Mesmo assim, observa Eduardo de Rose, membro do Conselho de Fundação da Agência Mundial Antidoping e da Comissão Médica do COI, atualmente o laboratório não tem condições para atender às necessidades da Olimpíada. “Ainda falta muita coisa de equipamento, alguma coisa de área física e de pessoal.” Cielo pode ter vencido mais uma, mas o Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer para sediar uma Olimpíada.

g1.jpg 

 

 

g2.jpg

 

 

 

Colaborou Luciani Gomes