Desde que chegou ao Rio de Janeiro, em 1946, aos 18 anos, Murilo Melo Filho envolveu-se com o jornalismo. Filho mais velho de sete irmãos, que ficaram em Natal, Rio Grande do Norte, o jovem rapidamente passou de datilógrafo do IBGE e do Ministério da Marinha a repórter de polícia do jornal Correio da Noite. Eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1999, depois de décadas na revista Manchete, o jornalista comemora os quase 60 anos de atividade com Tempo diferente (Topbooks, 297 págs., R$ 35), 20 minibiografias de brasileiros ilustres que conviveram com o autor, não raro na condição de entrevistados.

Como assinala no prefácio o colega Villas-Bôas Corrêa, Melo Filho entrou nas redações em meio a uma festa popular de classe média – imagem irônica para a queda do Estado Novo de Getúlio Vargas, que sufocou o País entre 1937 e 1945. Uma década depois adquirira tal mobilidade no meio político que nas semanas que antecederam o suicídio do líder, em 1954, Melo Filho chegaria a servir de
ligação entre o vice-presidente João Café Filho e o maior inimigo de Vargas, o jornalista e político Carlos Lacerda. No livro, Lacerda, Vargas e Café Filho desfilam ao lado de empresários, como Assis Chateaubriand e Roberto Marinho, e escritores, como Rachel de Queiroz, Jorge Amado, Carlos Drummond de Andrade e João Guimarães Rosa. Este, em um dos vários encontros que mantiveram dentro e fora
do Brasil, confessou-lhe ter abandonado a medicina por horror a que um doente morresse em seus braços.

Os textos não se restringem ao que foi apurado pessoalmente pelo autor, mas revelam a visão que tem dos focalizados, fruto de anos de maturação política. De dois presidentes emblemáticos revela presságios que não havia tornado públicos por uma série de razões. Em Jânio Quadros, o renunciante, o jornalista destaca a fixação em Abraham Lincoln, reforçada por uma adivinha. Mas em vez de ser assassinado em um teatro, como tanto temia, Jânio morreria só e na cama. Juscelino Kubitschek, o criador de Brasília, confessou a um primo, três dias antes do acidente de carro fatal que sofreria em 1976, que seu tempo na terra estava acabado. Tudo o que queria era ver o Brasil redemocratizado. Como iria demorar muito, preferia morrer. Foi atendido.