Na vida de Edson Souza Rocha, 16 anos, nem tudo são flores. Mas são elas que estão ajudando os pais e os seis irmãos a melhorar a casa em que vivem e incrementar a pequena roça de feijão e café que possuem em São Pedro, área rural de Mucugê, município de 14 mil habitantes aos pés da Chapada Diamantina (BA). Edson é um dos 640 jovens carentes atendidos pelo projeto Flores da Bahia, um exemplo bem-sucedido da ação articulada entre governo do Estado, prefeituras e sociedade civil no combate à pobreza. Quando está no programa, Edson troca a força que o roçado exige – ele ajuda a mãe, Maria das Graças, no trabalho com a enxada – pela delicadeza e o cuidado que as rosas exigem para que vinguem e se transformem em renda para os meninos. Como tem que trabalhar em casa – o pai ganha R$ 10 por dia em uma fazenda da região –, Edson não pode se dedicar em tempo integral ao projeto, o que lhe renderia R$ 300. Mas com os R$ 50 que recebe e os ensinamentos técnicos que obteve, sua vida já é outra. “Muita coisa que tomei conhecimento aqui nas estufas, com as flores, estou usando lá em casa”, diz timidamente. Para a mãe, dona Maria, o projeto “é uma bênção”. Além de Edson, mais dois de seus filhos, Cristiano e Elizângela, também são beneficiados pela iniciativa, que já está em 12 municípios, tocada pelas Secretarias de Agricultura e de Combate à Pobreza.

Além de inserir no mercado jovens como Edson, o Flores da Bahia tem como objetivo, através dos 75 mil metros quadrados de estufas implantados, expandir um negócio altamente promissor. Atualmente, o Estado compra, principalmente do Rio de Janeiro e de São Paulo, mais de 90% das flores comercializadas na Bahia e estudos apontam que a partir do segundo ano de produção, os 12 municípios poderão injetar na economia local uma receita anual de R$ 1 milhão. Isso poderá render a cada família envolvida no projeto uma renda mensal de R$ 610 a R$ 820, uma espécie de jardim do Éden para quem começa a sentir o gostinho de cidadania e auto-estima.

Mas no plano estratégico de longo prazo desenvolvido pela administração estadual, que tem como meta a redução das desigualdades sociais e elevação do Índice de Desenvolvimento Humano, assistencialismo é o mesmo que rezar fora da cartilha. Os programas de inclusão social e geração de renda exigem uma contrapartida fundamental para que os avanços sejam sustentáveis e expressivos: o envolvimento e a responsabilidade das comunidades.

Cabras sadias – Com 40% de seu território no semi-árido e com a maior população rural do País, a Bahia é modelo quando se trata de sertão. São programas que articulam um conjunto de intervenções que asseguram o acesso à oferta de água, terra, energia, moradia, infra-estrutura e renda. Os beneficiados diretamente dessas ações públicas são os agricultores familiares e os pequenos criadores.

O programa Cabra Forte, que atinge 39 mil famílias em 49 municípios do semi-árido, assiste tecnicamente mais de 19 mil produtores, já construiu 223 barragens, sete mil cisternas e perfurou 317 poços. Tudo isso para melhorar a qualidade de vida e de renda do produtor rural. Os principais objetivos do projeto são melhorar a qualidade e a sanidade do rebanho, através da oferta de material genético, aprimorar os processos de comercialização, através da capacidade de organização dos produtores, e ajudá-los a fazer reservas estratégicas de alimento para os animais em tempos de seca. Mas não é fácil mudar a cultura do sertanejo, que criava cabras e ovelhas à própria sorte. Para os produtores, se os animais fossem contados, parte do rebanho morreria. Maior vilã que a superstição era a desinformação. A cabra é forte desde que vermifugada regularmente, alimentada adequadamente, cuidada com higiene e assistida por veterinários e técnicos que conseguiram atravessar a ponte entre a tecnologia e a tradição cultural com ajuda de agentes comunitários.

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Valdeci de Araújo Silva que o diga. Dono de 117 hectares, ele é um exemplo do Cabra Forte em Lagoa da Onça, no município sertanejo de Andorinhas. “Antes do projeto eu chegava a perder 50% do meu rebanho. Hoje, só perco uma se for
por acidente”, conta ele, mostrando sua reserva estratégica de alimento e os apriscos bem cercados e limpos. Sentado na varanda de sua casa, ele conversa com a reportagem de ISTOÉ enquanto aguarda uma equipe do projeto para fazer uma ultra-sonografia em uma das ovelhas que abortou. Valdeci lembra que seus animais chegavam a no máximo dez quilos em seis meses e hoje, com uma raça mais aprimorada e uma alimentação correta, com o mesmo tempo, uma cabra chega a 20 quilos.

Chovendo na horta – Outro exemplo de que a união faz a força é o projeto Pró-Alimento, recém-saído do forno mas que já apresenta resultados. Criado em Andorinhas, por iniciativa das comunidades locais, o objetivo inicial foi dar condições às 147 famílias de agricultores de Caldeirõezinhos e arredores para uma melhor dieta alimentar através de hortas irrigadas por gotejamento. Como a água é escassa, a que fosse usada para o banho ou na limpeza da casa seria reaproveitada para a horta. É o que faz hoje Gislene de Souza, mulher do produtor Hildebrando, na comunidade de Lagoas. Depois de banhar um dos três filhos, José Reinaldo, sete anos, ela reaproveita a água levando-a para o balde de 20 litros que vai irrigar sua horta. “A gente não tinha o hábito de comer assim, mas isso é bom para os meninos. Tem alface, agrião, cenoura, beterraba, tempero. É mais uma economia que se faz. Sem contar que isso é melhor pra saúde.” A semente do social plantada há três anos, começa a dar flores e também muitos frutos em áreas inóspitas. O principal deles é a inserção econômico-social sem assistencialismo, coisa incomum no Nordeste.


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