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ESPERA
Cegonheiras carregadas de carros
argentinos fazem fila na fronteira com o Brasil
 

Foi uma semana complicada nas pequenas cidades que dividem Brasil e Argentina. De uma hora para a outra, o intenso fluxo de caminhões que transportam os produtos comercializados entre os dois países praticamente entrou em estado de paralisia completa. A suspensão no tráfego de mercadorias começou na sexta-feira 13, quando o Brasil finalmente optou por retaliar a decisão dos argentinos e dificultar a entrada de produtos brasileiros em seu mercado com a criação de novas barreiras não tarifárias. Já no final de semana centenas de caminhões cegonhas vindos da Argentina começaram a ser proibidos de cruzar a fronteira. Na quarta-feira 18, mais de três mil automóveis produzidos no país vizinho e comprados por revendedores brasileiros apinhavam-se no entreposto de Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, aguardando liberação para seguir viagem. No lado argentino, os fiscais da aduana endureceram a fiscalização e centenas de caminhões brasileiros carregados com alimentos, pneus e baterias também foram retidos. O problema só encontrou solução – e ainda assim paliativa – na quinta-feira 19, quando os dois países decidiram liberar a entrada dos produtos que estavam retidos nos dois lados da fronteira.

A abertura alfandegária acordada pelos dois países foi apenas um gesto de boa vontade. Não significa que o imbróglio tenha sido solucionado. Para tentar acertar os ponteiros, os governos do Brasil e da Argentina decidiram promover uma reunião de emergência entre o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento brasileiro, Alessandro Teixeira, e o secretário da Indústria argentino, Eduardo Bianchi, nos dias 23 e 24, em Buenos Aires. A Casa Rosada espera que o Brasil conceda uma espécie de fast track (via rápida) às importações de veículos argentinos. Segundo autoridades da Argentina e do Brasil, o governo argentino se dispõe a acelerar a liberação de licenças não automáticas à importação de produtos brasileiros, desde que os empregos em seu país sejam preservados. “O mercado interno que construímos com políticas públicas ativas também deve ser defendido por todos”, disse Débora Giorgi, ministra da Indústria argentina, em evento público, na quarta-feira 18. Ainda não há definição sobre os produtos a ser liberados pelo país vizinho. Em um cenário otimista, os secretários colocarão fim ao conflito, durante o encontro marcado para o início da semana. Se não chegarem a um acordo, caberá a Pimentel e Débora resolverem a questão. Em última instância, as presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner terão de encontrar uma solução.

BOA VONTADE
Na quinta-feira o Brasil decidiu permitir que os mais de três mil carros
parados na fronteira entrassem no país, mas sem revogar as medidas adotadas

Dilma, em especial, espera não ter de entrar nessa questão com a colega argentina. Ainda em 2010, tão logo fora eleita, a presidente brasileira escolheu Buenos Aires como destino de sua primeira viagem internacional, num claro sinal de que queria manter azeitados os canais de diálogo com o país vizinho. No encontro de janeiro, tanto Dilma quanto a presidente argentina, Cristina Kirchner, ressaltaram a importância da união dos dois países para o desenvolvimento econômico da América Latina. Desde então, no entanto, as relações comerciais entre o Brasil e a Argentina só se deterioraram. Em fevereiro, a Casa Rosada surpreendeu negativamente o Palácio do Planalto e o Itamaraty ao anunciar medidas criando embaraços à importação de produtos brasileiros, como a que aumentou de 400 para 600 o número de itens importados incluídos em um sistema de licenças não automáticas. A medida foi encarada como uma traição pelo governo brasileiro, que registrou um superávit comercial com a Argentina, em 2010, de quase US$ 4 bilhões. Na quinta-feira 12, o Brasil devolveu na mesma moeda. Em resposta ao protecionismo argentino, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior decidiu incluir automóveis entre os itens que necessitam de licença prévia de importação, eliminando a liberação automática. Embora a salvaguarda seja para todos os países, o alvo foi a Argentina, que ficou prejudicada em um setor considerado fundamental para a economia do seu país, o automobilístico.

Com a dura resposta dada pelo governo Dilma, os argentinos terão mais dificuldades em vender ao mercado brasileiro algo em torno de US$ 5,2 bilhões ao ano. De outro lado, hoje, quase um quarto das exportações brasileiras à Argentina enfrentam algum tipo de barreira, que afetam principalmente exportadores de alimentos, pneus, baterias, eletrodomésticos e calçados, entre outros. De acordo com a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), até este mês, está pendente a liberação de nada menos do que 884.770 pares de sapatos fabricados no Brasil. Pelo histórico e pela interdependência econômica entre os dois países, essa parece ser uma briga em que o volume dos latidos será bem mais intenso do que a força das mordidas. 

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