Nariz vermelho, roupas largas, sapatos grandes e um eterno sorriso no rosto. Os mestres na arte de provocar gargalhadas acabam de ganhar um livro só para eles. Para escrever Palhaços (Editora Unesp), o filósofo paulista Mário Fernando Bolognesi, 47 anos, visitou 57 circos em 15 Estados brasileiros e conseguiu matar saudade do tempo em que também vivia debaixo da lona. Antes de virar doutor em filosofia, Bolognesi foi trapezista e, no início dos anos 1980, esteve à frente do Metrópole Arte Circo, uma trupe que atuou na capital paulista até ser vencida pelo Plano Funaro. “A história do circo no Brasil é a trajetória de companhias familiares, sempre sensíveis às oscilações da economia. Hoje, não vivemos o fim do circo, mas um fenômeno de anexação das companhias tradicionais por grandes empresas, como a de Beto Carreiro”, diz o autor. Da mesma forma, a atuação dos palhaços acompanha a evolução do espetáculo. “Nos circos maiores, o palhaço tem geralmente a função de tapar buracos durante a troca de cenários. Nos circos menores, às vezes a dupla de palhaços segura o espetáculo inteiro”, explica Bolognesi, que reproduziu em sua obra alguns dos principais esquetes do repertório circense.

Um dos primeiros palhaços brasileiros foi José Manoel Ferreira da Silva, o Polydoro, que viajou todo o País a partir de 1870. Desde então, proliferaram estilos de atuação e estruturas diferentes de espetáculo. “Uma das peculiaridades do palhaço brasileiro é sua atuação em circo-teatros e circo-rodeios. Em muitas cidades, artistas dividem o picadeiro com vacas e fazem estripulias sobre elas”, conta Bolognesi. O circo-rodeio retoma, de certa maneira, a origem do palhaço, personagem inspirado no bobo shakespeariano e influenciado pela comédia dell’arte italiana, que surgiu no século XVIII para subverter a apresentação dos equilibristas nos espetáculos do inglês Philip Astley, um dos fundadores do circo moderno. “Astley inventou o picadeiro e montou espetáculos de equilíbrio e malabarismo com cavalos. O palhaço surgiu para ridicularizar as atrações oficiais. Enquanto o equilibrista e o trapezista lidam com o sublime, o palhaço traz à cena o grotesco, o estúpido”, diz Bolognesi.

Hoje, a arte dos palhaços ainda contagia as novas gerações. O septagenário Picolino (Roger Avanzi), por exemplo, fundador da primeira escola de circo do País, a Piolin, ainda ensina seus segredos aos alunos do Circo-Escola Picadeiro, em São Paulo. É referência fundamental para o trabalho de grupos mais novos como o festejado Parlapatões, Patifes e Paspalhões. “Picolino é nosso grande mestre. Mas o grande barato do livro de Bolognesi é trazer à cena palhaços desconhecidos do público, que nunca estiveram na tevê nem em grandes companhias”, homenageia Hugo Possolo, integrante do Parlapatões. A mais recente estripulia do grupo foi oferecer uma apresentação ao presidente Lula. Eles querem levar o espetáculo As nuvens e/ou Um Deus chamado dinheiro ao Palácio do Planalto. “O governo ainda não se pronunciou, mas o convite não é nenhuma palhaçada”, afirma Possolo.