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Horror ardente

Charlotte Gainsbourg e Willem Dafoe em cena do filme O anticristo, de Lars von Trier, que mistura terror e erotismo na história de um casal que se isola após perder um filho

De tempos em tempos uma onda de erotismo invade as telas de cinema produzindo filmes invariavelmente polêmicos e com cenas de sexo que entram para a galeria das mais ousadas já produzidas na história do audiovisual. Na década de 1970, o mundo foi abalado por Império dos sentidos, de Nagisa Oshima, e O último tango em Paris, de Bernardo Bertolucci. Mais tarde, com o triste advento da Aids, as produções ficaram mais tímidas no que diz respeito à sexualidade.

Uma nova revanche do cinema erótico ocorreu no final dos anos 1990, quando até mesmo a conservadora indústria de Hollywood se rendeu aos apelos sensuais e lançou Instinto selvagem, com Sharon Stone, imortalizada com a cena em que cruza as pernas e mostra a um policial – e à plateia – que estava sem roupa íntima. Depois disso o mundo cinematográfico mergulhou na monotonia dos dramas interiores e das comédias românticas que fazem alusão ao sexo, mas nunca o mostram de fato.

Conhecido por filmes que sempre abordam o tema, como Tempestade de gelo e O segredo de Brokeback Mountain, o cineasta taiwanês radicado nos EUA Ang Lee quebrou novamente as barreiras em Desejo e perigo, em cartaz no Brasil desde a sexta-feira 15. Premiado com o Leão de Ouro no Festival de Veneza, o filme inclui uma relação sexual que dura aproximadamente 12 minutos, vivida pela estudante chinesa Wong Chia Chi (Wei Tang) e o oficial Yee (Tony Leung) que colabora com os japoneses durante a ocupação de Xangai na Segunda Guerra Mundial.

A trama centra-se na resistência de um grupo de jovens chineses que confere a Wong Chia Chi a missão de se tornar amante de Yee e criar uma situação que permita aos seus companheiros assassiná-lo. Filmados com muito realismo, os ardentes encontros do casal dispensam os disfarces do jogo de luz e sombra. É arrebatador.

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CENAS QUENTES Tony Leung e Wei Tang (acima) na sequência de 12 minutos de Desejo e perigo, e Belén Fabra em Diário proibido

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O diretor Ang Lee declarou em entrevista que nunca se sente à vontade dirigindo cenas do gênero: "Tento bloquear a minha mente e apenas dar orientações precisas aos atores. E finjo que não estou constrangido."

Esse não parece ser o caso do cineasta dinamarquês Lars von Trier, que inclusive já usou sequências de sexo explícito em O idiota, um dos trabalhos que o projetaram internacionalmente. No Festival de Cannes, aberto na quarta-feira 13, ele mostrou O anticristo, filme que é apresentado como um terror erótico (estreia no Brasil prevista para julho). A história: um casal perde o filho e se muda para uma cabana em meio a uma floresta para tentar superar o trauma. Fantasias, culpas e muita relação carnal se instalam na rotina dos dois.

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O PROVOCADOR Em O anticristo, Lars von Trier cria nova polêmica, agora com o tema do terror erótico

Autor da comédia Todo mundo tem problemas sexuais (na qual o assunto é muito discutido e pouco praticado), o diretor Domingos de Oliveira acha que não mostrar sexo no cinema é tão improvável como não exibir crimes. "A civilização cristã é muito reprimida. Desejo sempre esteve ligado ao pecado", diz ele. "O que se fazia no passado era exibir o casal indo para a cama. Enfocava-se a lareira para que ninguém visse nada. Para a nossa sorte esses tabus vêm sendo novamente quebrados."

Embora faça muito frio na Espanha, o diretor espanhol Christian Molina dispensou o recurso da lareira ao rodar Diário proibido (estreia no Brasil em setembro). O filme teve o cartaz censurado em seu país e foi massacrado na Itália por contar a história de uma mulher solteira que dorme com os mais diversos homens apenas por prazer. Ela personifica bem uma versão feminina do mítico Don Juan. "Se o personagem fosse homem não haveria tanta polêmica", diz a protagonista Belén Fabra. Não haveria tanta, ela tem razão. Mas, ainda assim, daria o que falar.