Em maio, na sua edição 1755, ISTOÉ publicou matéria de capa, às vésperas da reunião do Copom, cobrando do governo a imediata diminuição das taxas de juros, que então asfixiavam a economia e o
País. A taxa básica, chamada Selic, estava paralisada no pico desde fevereiro em estratosféricos 26,5% ao ano, o que levava os bancos a cobrar cerca de 158% ao ano dos tomadores finais de empréstimos. Ou seja, das empresas e do cidadão comum endividados. O Banco Central, na terça-feira 13 daquela semana, manteve-se inflexível e não mexeu nos juros. Grande parte da imprensa bateu palmas para os técnicos do BC e voltou suas baterias contra o vice-presidente da República, José Alencar, que, junto com as entidades empresariais, se mostrava revoltado com a ortodoxia da área econômica. A ortodoxia fora de hora do BC continuou sob aplausos da maior parte da imprensa até este mês de agosto, quando “surpreendeu” o mercado ao trazer a taxa Selic para 22%. Na quinta-feira 28, em passagem pelo Brasil, o Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz deu o veredicto final sobre aquele período:
o BC “errou a dose”. Tanto errou que, na quinta-feira 28, o IBGE divulgou seu relatório trimestral sobre o comportamento do Produto Interno Bruto, mostrando que o PIB, no segundo trimestre do ano, caiu 1,6% em comparação ao período anterior.

A segunda queda consecutiva, na avaliação fria dos manuais de economia, significa recessão. Os jornais, então, na sexta-feira 29 abriram manchete para o dado do IBGE: “Economia em recessão.” Novamente uma avaliação extemporânea. A economia estava em recessão, sim, quando o BC se mostrava inflexível, naqueles idos de maio. Mas agora não está mais. As empresas, se não retomaram seus investimentos, já vislumbram as luzes do crescimento. Os dados macroeconômicos mostram uma saudável combinação de inflação sob controle com juros em queda, câmbio estável, retomada (ainda que lenta) da produção e aumento das exportações. O chamado risco Brasil medido por bancos estrangeiros, que estava próximo dos 2.000 pontos no início do governo Lula, agora está perto dos 700 pontos, com projeções de chegar a 550 em 2004, o que será a menor taxa desde que o índice foi criado.

O espelho retrovisor não serve como foco do bom jornalismo. Nesta edição, em matéria que começa à pág. 24, assinada pelos jornalistas Sônia Filgueiras e Leonel Rocha, ISTOÉ centra seu foco na estrada. Mostra que o Orçamento para 2004, o primeiro elaborado pelo atual governo, realmente está apertado, mas que se conseguiu aumentar
a destinação de verbas para a área social. E que uma folga maior,
capaz de produzir o chamado espetáculo do crescimento, só ocorrerá quando alguns conceitos da ortodoxia forem revistos. Depois de sucessivos fracassos, até o Fundo Monetário Internacional aprendeu essa lição. E setores importantes do governo estão preparados para encarar a briga: juros e superávits primários em doses exageradas
fazem mal a qualquer país.