Num bar badalado de Nova York, quatro mulheres bonitas, bem-sucedidas e solteiras compartilham segredos de alcova. Uma delas conta ter tido o orgasmo mais intenso de sua vida, a outra anuncia a decisão de fazer greve de sexo devido aos últimos encontros frustrados, enquanto a caçula da turma está em dúvida se volta para o ex-marido que superou problemas de disfunção erétil. A conversa esquenta quando uma delas revela que descobriu os prazeres do sexo com outra mulher. Assim começa mais um episódio de Sex and the City, exibido aos domingos nos Estados Unidos pela HBO e que virou febre em vários países. No Brasil, a atração está na quarta temporada e é transmitida às segundas-feiras – com reprises às terças e sábados – pelo canal pago Multishow.

A fórmula das aventuras amorosas de quatro amigas trintonas na Big Apple é simples e poderia ter passado despercebida. Mas, segundo a direção do Multishow, a audiência de Sex and the City vai bem, obrigado. A série tem cerca de 130 mil espectadores por episódio – número representativo para o público de tevê paga. Por cada episódio a emissora paga US$ 3,7 mil à HBO, verba suprida com folga pelos anunciantes. Como explicar tal fato num país em que os fenômenos de audiência costumam ser novelas e programas de auditório?

Tudo começa pela forma como o universo feminino é tratado. As protagonistas interpretadas pelas atrizes Sarah Jessica Parker (a jornalista Carrie Bradshaw), Kim Cattral (a relações-públicas Samantha Jones), Kristin Davis (a marchand Charlotte York) e Cynthia Nixon (a advogada Miranda Hobbes) têm uma vida que toda mulher gostaria. Embora focada nos costumes de Nova York, o cotidiano do quarteto cairia como uma luva para londrinas, parisienses, paulistanas, cariocas ou qualquer garota que more em uma metrópole. Que mulher não sonha chegar aos 30 com uma carreira consolidada e amigas leais que a acompanhem nas melhores baladas?

Mas o que agrada de cara é a personalidade e o humor com que os conflitos amorosos, sexuais e existenciais das quatro personagens são apresentados. Charlotte é romântica e maternal. Samantha é o oposto: troca de parceiros com uma enorme frequência. Miranda é racional e abusa do humor negro. Inspirada nos namoros das amigas e nos próprios, a jornalista Carrie escreve a coluna que dá nome à série.

Carrie, aliás, é um clone. Seu DNA foi colhido no córtex cerebral da jornalista Candace Bushnell, autora de uma coluna sexual no jornal New York Observer. A aventuras do quarteto são baseadas em seu livro, Sex and the City (Ed. Record. 345 págs., R$ 35). “Carrie sou eu aos 35 anos”, confessou Candace em entrevista a IstoÉ. “Quando comecei minha coluna, a pergunta principal era: ‘Será que as mulheres podem ter sexo casual, como os homens?’ O curioso é que a resposta que recebemos das mulheres foi afirmativa. Para os homens foi: ‘Não! Mulheres não podem ter sexo casual.’ Acho que isso é o que incomoda”, explica Candace. “Desejamos compromisso. Mas esse não seria o desejo de todos? E enquanto isso não ocorre, vai se tentando, e fazendo sexo, pois ninguém é de ferro”, completa.

No banheiro – Sexo casual, relacionamentos com homens casados ou mais jovens, sexo a três, homens que têm medo de compromisso, vibrador… Sex and the City é um mergulho no universo feminino contemporâneo. Tanto que a identificação é imediata. “A série me ajudou a perceber que os homens têm mais dificuldades em se envolver”, completa a jornalista e fã da série Vanessa Kopersztych. Por tratar tão bem o universo feminino, os homens também acompanham a série. Trata-se da sonhada entrada no banheiro feminino para espionar o que elas tanto conversam por lá.

Não dá para falar do glamour nova-iorquino sem falar de moda. Sex and the City elevou Sarah Jessica Parker ao posto de ícone fashion graças aos modelos com que sua personagem aparece na telinha. No armário de Carrie, não faltam modelos Dolce & Gabbana, Gucci, Dior e as tais sandálias Manolo Blahnik, a obsessão fashion da personagem. “O figurino da série tem uma ligação contemporânea com a moda. É o novo prêt-à-porter”, opina o estilista Mario Queiroz. Quem veste Carrie e suas amigas é a stylist Patricia Field, que deu o ar da graça nas passarelas brasileiras no último São Paulo Fashion Week. Daqui ela levou peças dos estilistas Alexandre Herchcovitch e Lilli Piovesan, que já estão sendo usadas pelas personagens. E tudo o que Sarah Jessica Parker faz ou usa vira moda. O que dizer da febre Manolo Blahnik em Nova York ou do sucesso do drinque cosmopolitan, o preferido de Carrie? No Brasil, mais especificamente em São Paulo, garotinhas ricas e loiras que antes passavam horas na chapinha para deixar os cabelos lisos agora entregam as madeixas aos cachos. Tudo para ser Carrie.

Se Sarah Jessica Parker virou queridinha dos fashionistas, a atriz Kim Cattral, que vive a fogosa Samantha, resolveu faturar como especialista em sexo. Junto com o marido, o músico Mark Levinson, ela escreveu o livro Satisfação – a arte do orgasmo feminino (Ed. Prestígio, 143 págs.). O livro traz dicas (e ilustrações) para fazer uma mulher feliz na cama. “Uma das razões do livro é acabar com o mito de que mulheres bonitas e com uma imagem sexy têm uma vida sexual incrível”, alega Kim no primeiro capítulo da “obra”.

Sex and the City alcançou um sucesso que nem as atrizes e até mesmo a autora da coluna, Candace Bushnell, esperavam. Aos 44 anos, a Carrie original já não vive as aventuras sexuais de sua criação. “Estou namorando firme e não tenho mais energia para sair à noite”, diz a autora. Mas seu alter ego televisivo continua badalando e vivendo um cotidiano apimentado. Nos Estados Unidos, a festa está para acabar. Carrie terá, já se sabe, um romance com um personagem interpretado pelo bailarino russo Mikhail Baryshnikov, que pode – ou não – ser seu derradeiro príncipe encantado. É esperar pra ver.

 

Papo de menina

A tarefa de reunir quatro mulheres em um bar para uma conversa sobre sexo e relacionamentos não é tão fácil quanto os encontros habituais que acontecem em Sex and the City. Foi difícil conciliar as agendas corridas da dentista Luciana Aidar Guarino, 33 anos, da empresária Flavia Ceccato, 32, da jornalista Vanessa Kopersztych, 29, e da psicóloga Marina Amadeu Bragante, 24 – todas fãs da série. No melhor estilo Carrie, Samantha, Miranda e Charlotte, seguem trechos da conversa com as meninas.

As personagens de Sex and the City são bonitas e bem-sucedidas e sonham com um par. Como é conciliar carreira e relacionamento?
Flavia: Queremos ter uma carreira, um relacionamento estável, ter filhos… O problema é que é tudo ao mesmo tempo.
Luciana: As mulheres da nossa geração foram criadas para casar. Nossa criação foi de um tipo e a ação é de outro.
Flavia: Fui criada para ser uma pessoa bem-sucedida. Meus
pais me cobram filhos porque tenho um relacionamento estável,
e, para eles, já atingi meus objetivos. Acho que tenho que crescer mais profissionalmente. Mas meu relógio biológico diz que está
na hora de ser mãe.

A Samantha transa sem ter nenhum vínculo emocional.
O que vocês acham disso?

Vanessa: No fundo, ela também quer romance. Só que ela busca mais que a média normal…
Luciana: Difícil uma mulher ter esse comportamento, de transar com todo mundo, e não sentir um vazio. Nem que seja por cinco minutos.
Flavia: Acho que a questão não é a quantidade de caras com
que se transa, mas o modo como se trabalha isso na cabeça.
Ela faz o que tem vontade.

Vocês acham que o sexo casual diminui as chances de um relacionamento duradouro?
Flavia: O problema é que os homens ainda são preconceituosos.
A mulher não deve deixar de fazer o que tem vontade por
causa de machismo.
Vanessa: No fundo, todos são machistas, por mais que
alguns ostentem uma fachada liberal. Eles ainda querem
uma santinha pra casar.
Marina: Eles rotulam as mulheres que praticam o sexo casual.
É questão de criação.

Sônia Braga entrou na série para conquistar o
coração da Samantha, a “devoradora de homens”. Vocês
acreditam em bissexualidade?

Flavia: Estamos num momento de experimentação. Acho que as próximas gerações vão quebrar essas barreiras.
Luciana: Não tenho tesão por mulheres.
Flavia: Ninguém tem controle dos seus desejos até surgir um sentimento novo. Se você nunca experimentou um doce e de repente ele aparece na sua frente, você pode ter vontade de comer.

Vocês diriam para um homem que ele é incompetente na cama?
Já fingiram orgasmo?

Flavia: Claro. Toda mulher já fingiu orgasmo.
Vanessa: Às vezes, é preciso fingir até pra acabar rápido. Fazer o quê? Nem sempre o sexo é bom…
Marina: Também tem aquela coisa do primeiro encontro. O sexo pode não rolar tão legal por causa da falta de intimidade e você não pode dispensar o cara só porque daquela vez foi ruim.
Luciana: Questão de respeito…

Dolores Orosco