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O vozeirão, o balanço e o sorriso contagiante do cantor Wilson Simonal conquistaram as plateias assim que ele surgiu nos anos 60. Durante um show no Maracanãzinho, ordenou ao público de 30 mil pessoas: "Primeiro cantam os 15 mil da direita, depois os 15 mil da esquerda." E eles obedeceram. Na década seguinte, o intérprete de sucessos como Meu limão, meu limoeiro e Sá Marina desapareceu dos meios de comunicação. Passou de fenômeno musical a "dedo-duro", conforme o extinto jornal O Pasquim, e acusado de ser colaborador da ditadura militar.

 

Só reapareceu no final dos anos 90, decadente e adoentado, em programas de baixa audiência. A ascensão e a queda do chamado rei da pilantragem são mostradas no documentário Simonal – ninguém sabe o duro que dei, dirigido por Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal, que entra em cartaz na sexta-feira 15.

"A natureza humana não perdoa a delação e ele cometeu esse crime imperdoável. Mas o castigo foi desproporcional, ele sofreu demais"

Ziraldo, cartunista

O filme revê as acusações feitas ao cantor e questiona o ostracismo imposto a ele. Mas não ouve personagens importantes, como o promotor do caso que envolveu o contador Rafael Viviani, funcionário da empresa de Simonal, sequestrado em 1971.

Levado para o Departamento de Ordem Política e Social (Dops), Viviani foi torturado e obrigado a assinar uma confissão de desvio de dinheiro. A vítima acusou Simonal de ser o mandante e ele acabou condenado. ISTOÉ procurou o promotor Antonio Carlos Biscaia (deputado federal pelo PT/RJ), que não tem dúvida sobre a ligação do artista com as forças da repressão: "Pedi a condenação porque ficou claro o vínculo de Simonal com os agentes do Dops que sequestraram o rapaz." O filme apresenta entrevistas com Nelson Motta, Chico Anysio e Tony Tornado, entre outros, que relativizam as acusações. Viviani reitera o depoimento dado há 38 anos contra o cantor.

Durante o processo, Simonal admitiu que tinha prestado serviço "à revolução". No programa de Hebe Camargo, ele desabafou: "Desafio qualquer autoridade competente que prove minha ligação com qualquer órgão de segurança nacional, no sentido de prejudicar alguém." A partir daí, ganhou a fama de alcaguete. "A natureza humana não perdoa a delação e ele cometeu esse crime imperdoável", diz o cartunista Ziraldo, um dos editores de O Pasquim à época. "Mas o castigo foi desproporcional, ele sofreu demais." Ao reaparecer em eventos aquém do seu talento, Simonal tinha o aspecto decadente, vítima do alcoolismo – essas cenas são as mais emocionantes do documentário. Ele morreu em 2000, com problemas no fígado. "Desse filme saiu um Simonal mais humano", diz o diretor Cláudio Manoel.