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EXPANSÃO Em duas semanas a epidemia atingiu 24 países

O que era esperado se confirmou. A gripe suína, rebatizada A H1N1, está entre nós. Na última semana, o Ministério da Saúde anunciou a ocorrência de quatro casos no País. A notícia comprovou o fato de que, em tempos globalizados, nenhuma nação ficará imune à doença. Simultaneamente à divulgação de que a enfermidade havia desembarcado aqui, a Argentina comunicava o registro de sua primeira vítima.

No mundo, a Organização Mundial de Saúde contabilizava, na sexta-feira 8, mais de 3,1 mil doentes espalhados por 24 países e um total de 47 mortes. Diante da disseminação pelo planeta, a entidade manteve seu nível de alerta em grau 5, indicando que a gripe prossegue com o potencial de tornar-se uma pandemia. Se isso ocorrer, a OMS calcula que dois milhões de pes soas podem ser infectadas.

Dos quatro casos brasileiros, dois são de São Paulo. O primeiro é um rapaz de 24 anos que apresentou sintomas 48 horas depois de chegar da Cidade do México, no dia 24 de abril. Durante seis dias ele ficou internado no Instituto de Infectologia Emílio Ribas, na capital paulista. Em seguida, foi liberado e voltou para casa, onde permaneceu isolado até sua completa recuperação.

O outro paciente é um homem de 48 anos que apresentou sinais da gripe em 29 de abril. Um dia antes, havia desembarcado de Miami, nos EUA. Foi atendido no Emílio Ribas e depois mandado para casa, onde ficou isolado. Na sexta-feira 8 estava bem. Mas sua família permanecia sob monitoramento para ver se não havia tido contágio.

Outro paciente é do Rio de Janeiro. Também é jovem – tem 21 anos. Chegou ao Brasil no sábado 2 vindo de Cancún, no México. Foi internado na terça-feira no Hospital Clementino Fraga Filho e lá permanecia até sextafeira. Estava em um quarto isolado – com duas portas e filtro na janela. "Fiquei assustado, mas depois que fui medicado estou tranquilo", disse o rapaz em entrevista ao jornal carioca Extra. Ele passa bem. "A internação é apenas para evitar contato porque ainda há possibilidade de transmitir o vírus", disse Regina Moreira, chefe do departamento de doenças infecciosas do hospital. Esse risco permanece em média até oito dias depois do surgimento dos sintomas.

Pessoas que estiveram com ele antes da internação estão sendo monitoradas. Em Belo Horizonte houve o registro do quarto doente, uma mulher de 28 anos que também estava no México. Ela passou por uma internação no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, ficou em casa, isolada, e agora não oferece mais risco de transmitir o Influenza A H1N1, o vírus causador da doença.

A chegada da gripe ao Brasil abre um cenário de incertezas. É impossível prever, por exemplo, com que agressividade a doença se comportará. "Não temos condição de saber em que ritmo ela vai se espalhar", afirma o infectologista Artur Timerman, do Hospital Heliópolis, de São Paulo. Os vírus de gripe que circulam normalmente têm uma taxa de infecção secundária de cerca de 80%. Ou seja: uma pessoa que fica perto de alguém com gripe tem em média 80% de chance de contrair a doença.

Mas em relação ao A H1N1 isso não está claro. Outra questão que continua sem resposta é a letalidade. "No México, ela tem sido muito maior do que nos Estados Unidos, onde até sexta-feira tinham morrido duas pessoas", diz o infectologista David Uip, diretor do Emílio Ribas. "Ninguém entendeu as razões dessa diferença até agora."

Certo é que haverá mais casos no Brasil. Por alguns motivos. Primeiro por causa da chegada dos kits para identificação do vírus, fato que só ocorreu na quarta-feira 6 e que finalmente permitirá a confirmação rápida da presença do A H1N1. "Ainda há muita gente em isolamento, aguardando a resposta dos testes", explica a infectologista Nancy Bellei, da Universidade Federal de São Paulo. Depois, porque o País está às vésperas do inverno, estação propícia à disseminação de gripe.

As pessoas tendem a ficar em lugares fechados, a poluição é maior – o que reduz as defesas do corpo – e o vírus encontra facilidade para sobreviver no ambiente devido às baixas temperaturas. É verdade, contudo, que até a sexta-feira 8 os casos registrados eram de pessoas que haviam estado em áreas de risco. Não havia transmissão dentro do território nacional.

O temor dos brasileiros, agora, é saber se o País está de fato preparado para enfrentar a doença, seja ela mais branda ou não. "Queremos impedir a disseminação do vírus", disse o ministro da Saúde, José Gomes Temporão. Diversas ações foram deflagradas nesse sentido – e agora passarão por sua maior prova. O plano de controle de situações como a que se vive agora começou a ser formulado há seis anos, por causa da ameaça de proliferação da gripe aviária, causada por outro tipo de Influenza e muito mais letal.

As ações começaram a ser colocadas em prática há três semanas, quando foi acionada uma comissão composta por representantes dos Ministérios da Saúde, Agricultura, Defesa, da Presidência da República e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Sua função é acompanhar e determinar ações de prevenção. Desde então, o grupo se reúne todos os dias, em Brasília. Em termos de estrutura de atendimento, o País mobilizou 52 centros de referência para tratar os doentes (endereços no site www.saude.gov.br). Além disso, há 12,5 mil tratamentos (kit do antiviral Tamiflu) em estoque e matéria prima para fazer outros nove milhões de doses se necessário.

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TRIAGEM No Aeroporto Tom Jobim, Marcelo Felpo, da Anvisa, supervisiona sala para suspeitos de contaminação

A Anvisa colocou mais gente nas áreas de embarque e desembarque dos voos internacionais – nos aeroportos de Guarulhos, em São Paulo, e no Galeão, no Rio de Janeiro. No momento, 82 funcionários se revezam em três turnos em Guarulhos. Outros 55 atuam no Galeão, onde foram criados uma sala de isolamento com 100 assentos, cinco quartos de observação para pacientes graves e uma área com 24 lugares.

O local recebe todos os passageiros dos voos procedentes de países onde a gripe se alastrou e os que apresentam sintomas para a primeira triagem.

No entanto, apesar de tudo parecer equacionado, ainda existem falhas de continuidade nas ações. Até a sexta-feira 8 ainda havia dúvidas sobre como seria feito o contato com os passageiros que viajaram no mesmo avião dos pacientes confirmados para avisá-los que estiveram próximos de alguém com o vírus e perguntar se manifestam sintomas.

O Ministério da Saúde disse que seria a Anvisa, que disse que seriam as secretarias estaduais. A secretaria de São Paulo informou que, na verdade, o telefonema de alerta deverá partir da vigilância epidemiológica do município onde vive o passageiro que compartilhou o avião com um dos infectados. "Serão contatados a tripulação e aqueles que se sentaram nos dois lugares ao lado, na frente e atrás do assento de quem tem o vírus", disse Eduardo Lage, diretor de Vigilância Epidemiológica do Ministério da Saúde. O que se espera é que essa cadeia de informação funcione rapidamente, para localizar as pessoas com sintomas antes que elas comecem a transmitir o vírus.

Nas próximas semanas, as regras para internação e isolamento também podem mudar. Se começarem a surgir mais casos, os leitos especiais nos hospitais serão reservados às pessoas com sintomas graves. As outras serão medicadas e observadas em casa, onde deverão se precaver para não transmitir a doença. De maneira geral, as ações têm sido reconhecidas pelos especialistas como positivas. "O fato de os primeiros pacientes terem sido adequadamente diagnosticados e tratados mostra que estamos preparados para enfrentar essa gripe", diz o médico David Uip.