Internacional

Um sequestro de R$ 230 milhões
Mais de 95 navios foram atacados por piratas no Índico apenas neste ano. Entre eles um dos maiores petroleiros do mundo

Alan Rodrigues
 

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O Sirius Star é um dos maiores petroleiros do mundo, cujo comprimento equivale a nove Boeings 737 enfileirados ou a uma Torre Eiffel deitada. Ele tem capacidade de carregar dois milhões de barris de petróleo – uma carga superior à produção diária de petróleo do Brasil (1,8 milhão), estimada em US$ 100 milhões (R$ 230 milhões). Pois esse gigante foi seqüestrado no domingo 16 por seis pequenos barcos piratas somalis, a 800 quilômetros do porto de Mombaça, no Quênia. Procedente da Arábia Saudita, o navio estava a caminho dos Estados Unidos via Cabo da Boa Esperança, no sul da África. A rota era obrigatória, já que o superpetroleiro, por causa de suas dimensões gigantescas, não pode navegar pelo Canal de Suez. "Não existe precedentes para esse seqüestro. Trata-se do maior barco assaltado por piratas de que temos notícia", afirmou o tenente Nathan Christensen, porta-voz da Vela Internacional, proprietária da embarcação. O barco está retido na cidade de Xarardhere, na Somália, um porto seguro para a pirataria. Os seqüestradores exigem um resgate de 20 milhões de euros – mais de R$ 55 milhões – e mantêm 25 reféns.

O Oceano Índico, principalmente o golfo de Áden, é atualmente a área mais infestada de piratas no mundo. Analistas dizem que naquela região ocorre hoje a maior ofensiva criminosa contra a exportação e importação de mercadorias já vista desde o apogeu da pirataria, no Caribe do século XVIII. Somente neste mês, 36 embarcações foram seqüestradas ali. Neste ano já são 95 os navios retidos, de 296 ataques. Na quarta-feira 19, em meio às negociações pela libertação do Sirius Star, um navio da Marinha indiana afundou um barco pirata no Golfo de Áden. Também são alvo de ataques piratas embarcações que passam pelo Canal de Suez, no Egito, e pelo sul da África, rotas estratégicas para o comércio marítimo. Na semana passada, a cada dia um grande navio foi parar nas mãos deles. Somente em outubro, as ações dos piratas renderam mais de US$ 30 milhões em resgate só no Oceano Índico. Segundo a Agência Marítima Internacional (AMI), 339 pessoas e 17 embarcações estão atualmente em poder dos seqüestradores.

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A pirataria tornou-se o mais próspero dos negócios na Somália, um país falido e virtualmente sem Estado, afundado numa guerra civil que dura duas décadas. Os assaltos começaram a se desenvolver no início da década de 1990. Miseráveis e sem perspectiva, muitos ex-combatentes, unidos a pescadores famintos, partiram para ataques a embarcações. Mas esses novos piratas se sofisticaram. Eles utilizam-se da mais refinada tecnologia de rastreamento e armas. A bordo de navios-mães, cerca de 60 piratas dividem-se em pequenas embarcações para se aproximar dos alvos. Dessas super lanchas, eles lançam foguetes em direção aos cargueiros para obrigá-los a diminuir a velocidade. Como em um filme, os piratas sobem pelos cascos dos cargueiros armados com fuzis Kalishnikov, granadas e pistolas automáticas, dominam a tripulação e rebocam as embarcações para os portos da Somália. Segundo especialistas, num único assalto os piratas utilizam- se até de nove lanchas rápidas, numa ação que não demora mais de 15 minutos – tempo insuficiente para chegada de socorro. A audácia dos piratas vai a ponto de eles usarem telefones por satélite e só aceitarem o resgate em dinheiro vivo ou pagamento via on-line creditado em bancos na Somália. Segundo o centro britânico Chatham House, este ano os criminosos obtiveram mais de 24 milhões de euros em resgates. "Não existem mais águas seguras enquanto os piratas estiverem em ação", diz o vice-diretor da AMI.

A União Européia trata as ações criminosas como ataques terroristas e promete ampliar os esforços para dobrar o número de navios de guerra na costa da Somália. Atualmente, a Otan (aliança militar ocidental) mantém quatro embarcações de combate no Índico.

Até que o reforço das tropas chegue, a própria AMI adverte que não existem águas seguras para navegação na costa africana. "A crise com a segurança no transporte marítimo está fazendo com que as empresas desviem seus barcos por rotas utilizadas nos primórdios da navegação mercante. A navegação por algumas dessas rotas provoca atrasos de até 15 dias na entrega das mercadorias. As companhias de seguros já aumentaram em dez vezes o preço das apólices. "Uma das soluções é o uso de escoltas privadas", diz Paul Burton, da ONU.