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PRESSÃO
Ana de Hollanda continua sendo criticada
por setores do PT e do meio cultural

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ATAQUE
Sader tentou aproveitar fraqueza da ministra,
mas acabou perdendo o embate

A paulista Ana de Hollanda é mulher de predicados. Faz parte há quatro décadas da elite cultural brasileira, pertence a uma família ilustre e é formada em administração de empresas. Mas não foi por isso que ela assumiu o Ministério da Cultura. Na verdade, Ana não era a primeira opção da presidente Dilma Rousseff. Estavam no páreo o ex-ministro Juca Ferreira, que fez tudo para permanecer no cargo; o sociólogo Emir Sader, tido como referência da esquerda brasileira; e o próprio compositor Chico Buarque, dono de afinidades com o ex-presidente Lula e que, na campanha, liderou um grupo de artistas em favor de Dilma. Ao fim e ao cabo, porém, a presidente decidiu engrossar a ala feminina de seu governo e escolheu a irmã menos famosa de Chico. Com esse pano de fundo, Ana assumiu em janeiro a Cultura, mas já enfraquecida. Tem enfrentado marcação cerrada dentro do ministério e de alas do PT. Na semana passada, Emir Sader, percebendo essa fragilidade, tentou abater a ministra em pleno voo. Em entrevista ao jornal “Folha de S.Paulo”, ao discorrer sobre cortes no Orçamento, criticou a falta de repasses para programas do órgão. “Teve uma manifestação em Brasília. Está estourando na mão da Ana porque ela fica quieta, é meio autista.” O sociólogo exagerou na dose e perdeu a indicação para presidir a Fundação Casa de Rui Barbosa.

Ao apostar na queda da ministra, Sader não levou em conta um detalhe crucial. A presidente Dilma Rousseff, como ninguém, é extremamente zelosa em relação à hierarquia e à subordinação. Logo na primeira semana de seu governo demitiu o advogado Pedro Abramovay, da Secretaria Nacional de Política sobre Drogas, porque ele deu uma entrevista defendendo penas alternativas para pequenos traficantes. Com Sader não poderia ser diferente. A decisão do Palácio do Planalto só não foi automática porque o sociólogo é um dos ícones da esquerda petista. Na pré-campanha, em maio do ano passado, Sader organizou encontros de artistas e intelectuais no Rio em apoio à candidatura de Dilma. Dentro do governo tem padrinhos poderosos: Gilberto Carvalho, ministro da Secretaria-Geral da Presidência, e Marco Aurélio Garcia, assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência. No período de transição, foi forte a movimentação a seu favor para assumir a Cultura. Apesar de todo o seu prestígio, Dilma preferiu não abrir exceção e fulminou pela raiz a rebelião liderada por Sader. Em nota divulgada à imprensa na quarta 2, depois do sinal verde de Dilma, Ana, que se manteve em silêncio durante o episódio, deu uma resposta curta e grossa: “Comunico que o senhor Emir Sader não será mais nomeado presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa. O nome do novo dirigente será anunciado em breve.” Já na quinta-feira 3 Ana anunciou o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos para o lugar que seria ocupado por Sader.

Embora tenha mantido a ministra no cargo, Dilma está preocupada com a gestão de Ana à frente da Cultura. Comenta-se no Palácio do Planalto que, se não demonstrar pulso forte, a irmã de Chico pode deixar o cargo na primeira reforma ministerial do governo. Ana se desgastou desde sua indicação, quando afirmou que precisava de tempo para se familiarizar com as questões da pasta. O que foi considerado uma heresia, já que todo intelectual brasileiro que se preza se considera especialista nos desafios da Cultura. A experiência de Ana na área também é limitada. Ela foi secretária de Cultura do município de Osasco de 1986 a 1988 e dirigiu o Centro de Música da Funarte de 2003 a 2007. Os próprios funcionários do MinC, promovidos durante a gestão de Gilberto Gil, não viram com bons olhos o currículo da irmã de Chico. O quadro se agravou pelo fato de Ana não ter levado adiante os programas e planos elaborados no fim do governo Lula. O principal deles envolve a reforma da política de direitos autorais no País, sobre a qual não há consenso. Na verdade, ela colocou uma pedra sobre o tema, gerando forte insatisfação no meio artístico e no PT. A substituição do titular da Diretoria de Direitos Autorais, Marcos Souza, por Márcia Regina Barbosa também repercutiu mal. “Foi uma atitude precipitada”, diz o cantor Jorge Vercillo. “O MinC deveria ser o primeiro a querer a reforma da lei.” A seu lado, a ministra conta apenas com o ator Antônio Grassi, uma das pessoas que sustentaram sua indicação. Petista de carteirinha, Grassi foi reconduzido por ela à direção da Funarte.

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ESCOLHA
Wanderley Guilherme dos Santos foi o escalado para
comandar a Casa de Rui Barbosa (acima) no lugar de Sader

Em meio à polêmica, Sader, profundo conhecedor do PT, tentou alçar voo próprio. Assim que foi indicado para presidir a Fundação Casa de Rui Barbosa, defendeu mudanças na orientação da tradicional instituição. Disse que a fundação deveria participar das grandes discussões do País, tendo como eixo o slogan do governo Lula “O Brasil de Todos”. Para ele, as grandes questões nacionais deveriam nortear o trabalho da fundação. Sua posição gerou grande mal-estar no meio acadêmico porque a Casa Rui Barbosa é um centro de pesquisa e não um polo de debates políticos. Conclui-se rapidamente que a verdadeira intenção de Sader era aparelhar a entidade localizada no bairro carioca de Botafogo, na casa em que Rui Barbosa viveu de 1895 a 1923. “As propostas de Sader não eram típicas de uma instituição de memória”, disse a filóloga Rachel Valença, presidente do Museu da Imagem e do Som. Confirmado seu afastamento, ele soltou uma nota atribuindo sua queda a setores da mídia conservadora e à direita brasileira. E trombeteou: “O MinC tem assumido posições das quais discordo frontalmente, tornando impossível, para mim, trabalhar no ministério neste contexto.”

Na verdade, quem decidiu que Sader não vai mais trabalhar no Ministério da Cultura foi a presidente Dilma, assessorada pelo ministro da Casa Civil, Antônio Palocci. Ele atuou para contornar a crise e reforçar a autoridade da ministra. No Palácio do Planalto, comentou-se que Sader passou dos limites e mostrou não saber que, no governo Dilma, ninguém sairá ileso se atacar seu superior. A primeira crise no Ministério de Dilma foi contornada com resposta à altura, mas isso não significa que a irmã de Chico Buarque terá um futuro sorridente e tranquilo na Esplanada dos Ministérios. Se quiser sobreviver no cargo até o fim do governo, Ana não poderá ficar em cima do muro. Terá de administrar vaidades, amansar o PT e mostrar competência à frente do setor.

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