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Incerteza Mesmo que fique, Battisti ainda terá problemas judiciais

Na Roma antiga, o gesto do polegar para cima ou para baixo decidia o destino de muitos acusados. Esse sinal definitivo, símbolo do poder dos cesares, agora cabe ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para, ironicamente, definir o caso do ex-ativista de esquerda Cesare Battisti.
 
Na noite da quarta-feira 18, por 5 votos a 4, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela extradição do escritor italiano, mas julgou que a última palavra é de Lula. Se optar por ignorar os apelos do primeiroministro da Itália, Silvio Berlusconi, feitos pessoalmente na segunda-feira 16, Lula abrirá uma crise diplomática com aquele país porque estaria desrespeitando um tratado internacional.
 
Segundo interlocutores privilegiados no Palácio do Planalto, Lula tende a conceder asilo político a Battisti. Antevendo uma decisão contrária aos seus interesses, o governo italiano ampliou a pressão com novos apelos. “Estou otimista. O meu primeiro pensamento vai para as famílias das vítimas de Battisti, que finalmente veem reconhecido o seu direito legítimo de obter justiça”, disse o ministro italiano dos Negócios Estrangeiros, Franco Frattini, que manifestou “grande satisfação” com a decisão do Supremo.
 
Além de o STF ter colocado a responsabilidade em suas mãos, o presidente ainda tem outro argumento para manter o ativista no País. Battisti responde a processo na Justiça Federal sobre falsificação de documentos, usados para entrar aqui em 2007. E só pode ser enviado a outro país depois de cumprir a pena. Em conversas reservadas, colaboradores diretos de Lula têm dito que apoiar a extradição do italiano poderia ter efeito negativo na sucessão presidencial, pois Battisti ganhou apoio de vários movimentos sociais.
 
Na terça-feira 17, um grupo de políticos foi ao presídio da Papuda para prestar solidariedade ao ex-terrorista. Na Itália, Alberto Torregiani, filho de uma das quatro vítimas dos assassinatos atribuídos a Cesare Battisti, só acredita na extradição quando ele pisar em solo italiano. “Antes de cantar vitória, prefiro aguardar para ver a decisão por escrito”, declarou.
 
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Torregiani perdeu o pai, o joalheiro Pierluigi Torregiani, e ficou paraplégico, num ataque ocorrido em 16 de fevereiro de 1979 em Milão do
qual Battisti teria participado. “Se Battisti ficasse onde está, nossos familiares queridos seriam mortos duas vezes”, afirmou Adriano Sabbadin, filho de Lino Sabbadin, morto também no dia 16 de fevereiro de 1979. Adriano tinha 17 anos. “Quando meu pai morreu, minhas irmãs tinham 12 e 6 anos. Coube a mim sustentar a família. Nós é que sentimos na pele o que é estar preso, e não o senhor Battisti.”
 
Em greve de fome, extremamente abatido e com o acompanhamento de um psiquiatra, Battisti disse que só sai do Brasil morto. “Não volto vivo para a Itália”, afirmou. O ex-ativista italiano, de 54 anos, foi condenado à revelia em seu país à prisão perpétua pelos quatro assassinatos, ocorridos entre 1977 e 1979. Na época, Battisti, que alega inocência, integrava a organização Proletários Armados Pelo Comunismo (PAC).
 
SÍMBOLO
Berlusconi e Lula:
gesto positivo pode salvar
Battisti e abrir crise entre países
 

 A condenação ocorreu após sua fuga em 1981 para a França, que acolheu italianos sob a condição de que abandonassem a luta armada. Em 2007, Battisti deixou a França após a revogação de sua condição de refugiado, vindo para o Brasil. O italiano então foi preso no Rio de Janeiro e desde então cumpre prisão preventiva para fins de extradição. Em janeiro deste ano, o ministro da Justiça, Tarso Genro, concedeu status de refugiado político a Battisti, baseado no “fundado temor de perseguição por opinião política”, contrariando decisão do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare).
 
A ação de Genro foi criticada por autoridades italianas, incluindo o premiê Berlusconi e o presidente Giorgio Napolitano. A decisão do governo brasileiro provocou ainda uma crise diplomática com a Itália, que chamou de volta seu embaixador no Brasil para manifestar “surpresa e pesar” e discutir o caso. Lula então reagiu às críticas ao afirmar que os italianos deveriam respeitar a decisão soberana do Estado brasileiro. Em fevereiro, o STF negou pedido de liminar do governo italiano contra a decisão de conceder refúgio a Battisti, e o julgamento só começou em setembro.
 
Agora, depois de quase um ano, o STF confirma que a última palavra é de Lula.
 

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