Estou me despedindo desse espaço como tantas vezes já me despedi nessa vida. Por pura falta de tempo, por querer abraçar o mundo com  as pernas, como dizia minha avó, sempre vestida com algum motivo floral, acho eu que para disfarçar as cicatrizes que a vida lhe foi trazendo, ano após ano. Havia sempre um vestido com flores verdes, azuis, lilases, dálias vermelhas sobre fundo branco e uma cabeça que balançava, quando alguma gargalhada adolescente cortava a noite de verão: vai, rindo, vai… – ela sacudia a mão magra no ar e repetia, como se vaticinasse. – Vai rindo! Minha avó era a formiga da fábula, sempre lançando um olhar de soslaio para as cigarras que animavam os fins de tarde de verão, com aquela cantoria louca, eu penso.

Tenho, assim como todo mundo que já avançou na estrada, um grande repertório de despedidas e elas gostam de se juntar, vez ou outra, todas aquelas despedidas que andam soltas aqui por dentro, muitas estações, aeroportos, portas que se fecharam, malas que se perderam, frases que ficaram pelo meio, porque já chamavam o embarque e o pensamento acabou não se completando, alguém que disse tchau na manhã seguinte e o tchau era adeus, sempre alguém tentando não chorar, sempre alguém se arrependendo logo depois de o avião levantar voo, e por aí vai. O repertório é vasto. Tão vasto quanto o vosso, ouso afirmar! E eu descobri que o melhor remédio para esses ajuntamentos de despedidas, que vão ganhando espaço entre as costelas e nos roubando o ar, é mergulhar no universo do folhetim de vez, de modo que confesso que estou deixando o espaço porque vou escrever novela, que é uma experiência muito curiosa e divertida, de quando em vez. Lá, no meio das tramas urbanas, num capítulo qualquer, vai uma frase que você quis muito dizer para alguém que você amou, mas que na época não achou cabível. Foi-se o amor e ficou a frase. A ideia da frase. Pois você coloca na boca de uma personagem e livra-se dela. E usa, de quebra, grande parte das despedidas acumuladas que podem estar lhe roubando o sono. Vão-se antigas despedidas para que novas possam chegar, pois assim é a vida, o que se há de fazer? – pareceu-me ouvir minha avó, saindo de cena, com seu vestido de flores amarelas sobre o fundo azul-escuro.

Estou-me despedindo desse espaço e deixo um abraço para aqueles que acompanharam minhas palavras, porque são elas que contam no fim da história. As tais palavras que, no caso das crônicas, costumam ser especialmente travessas e ariscas. São elas que vão ficar no fim das contas, ao lado dos anéis. Apenas as palavras, cada uma delas, todas arrumadas, em seus vestidos alegres, as bocas vermelhas, agrupadas para uma fotografia num dia claro de verão. As palavras que dissemos e, principalmente, aquelas que não conseguimos dizer a tempo, antes que partisse o avião. Se alguma coisa sobrar, vão ser essas palavras, não tenho dúvida.

Abro o derradeiro parágrafo e deixo um até breve, porque a vida me ensinou que as portas não se fecham, elas simplesmente se abrem para outras, de modo que vou-me pesaroso, mas vou determinado. Foi um grande prazer dividir com vocês esses momentos de vida. De verdade.