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REVOLUÇÃO
Após 18 dias de manisfestações, Mubarak não resistiu
e acabou fugindo com a família para um resort no Mar Vermelho
na sexta-feira 11. No Cairo, milhões foram às ruas comemorar a queda do ditador

Hosni Mubarak repetiu a sina de muitos tiranos ao fugir com a família na sexta-feira 11 rumo ao balneário de Sharm el-Sheik, na península do Sinai, de onde anunciou sua renúncia. Três décadas de um regime opressor e corrupto terminaram sob intensos protestos populares, que obrigaram o ditador a abandonar o palácio de governo pela porta dos fundos. Na noite anterior, Mubarak, aos 82 anos, tentou uma última cartada ao convocar rede nacional de tevê para dizer que ficaria no cargo até as eleições de setembro. Mas seu pronunciamento só serviu para engrossar o coro dos descontentes, que aos milhares voltaram às ruas do país e acamparam na praça Tahir, no centro do Cairo. Confirmado o adeus, o ex-chanceler Mohamed El Baradei, líder da oposição, sintetizou o sentimento de vitória dos manifestantes. “Este é o maior dia da minha vida. O país foi libertado”, disse. A queda de Mubarak marca o início de uma nova era para o Egito e consolida a crise no mundo árabe, já que o governo egípcio era peça-chave no tabuleiro político regional, por seus profundos vínculos com os Estados Unidos e o único aliado de Israel na região.

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A longa ditadura egípcia é a segunda a ruir em menos de um mês, depois da queda do tunisiano Zine El Abdine Ben Ali, em 14 de janeiro, e certamente animará as massas descontentes em lugares como Mauritânia, Argélia, Jordânia, Síria e Iêmen. As razões dos protestos, aliás, são as mesmas: desemprego, pobreza, aumento do custo de vida, censura e violações de direitos humanos. Mas o embaixador brasileiro no Cairo, Cesário Melantônio, pondera sobre a aplicação automática da chamada teoria do dominó. “Há uma tendência de colocarmos todos os países do Oriente Médio no mesmo saco, mas são realidades diferentes”, diz. Tendo servido também no Irã e na Turquia, o diplomata, há dois anos e meio no Cairo, faz questão de frisar, entretanto, que a mudança no Egito terá consequências. “É um país importantíssimo, tem a maior nação árabe do mundo, desfruta de uma localização estratégica no Mar Mediterrâneo e mantém relações diplomáticas bastante próximas com Israel”, explica.

O analista de segurança internacional Salvador Ghelfi Raza, membro da equipe de consultores de Barack Obama, afirma que o prolongamento da crise no Egito acabou dando tempo para que outros países, como Síria e Arábia Saudita, se preparassem para evitar protestos semelhantes. “Em países mais fracos é possível que ocorram rebeliões, mas, nos regimes de segurança fortes, ações repressivas já começaram a ser aplicadas, como o controle de internet, a prisão de líderes opositores e a identificação de grupos rebeldes”, afirma. De qualquer forma, o analista acredita que a crise no Egito terá impacto a médio prazo no mundo árabe. Raza e outros consultores fizeram prognósticos sobre as consequências políticas e econômicas da saída de Mubarak. “Há questões econômicas e de segurança importantes. Israel, por exemplo, avalia que a queda repentina de Mubarak pode enfraquecer a contenção de movimentos violentos no sudeste e prejudicar também o fornecimento de gás, já que o país importa do Egito cerca de 70% do combustível. “Não há risco de aumento do preço do petróleo em nível internacional”, acredita.

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ALIANÇA
Militares aderiram às manifestações populares, o que
precipitou a queda Mubarak

O vento forte que transformou o destino do Egito deve, a partir de agora, ser canalizado para correntes políticas, inclusive a Irmandade Muçulmana, que farão um esforço conjunto para construir um novo pacto nacional. Embora a renúncia de Mubarak tenha sido anunciada por seu vice, Omar Suleiman, o poder interino será exercido pelo Conselho Supremo das Forças Armadas, que há uma semana passou a ser o único interlocutor válido dentro e fora do país. É da caserna que emana o poder político desde o fim da monarquia, em 1952. “Mas, constitucionalmente, as Forças Armadas egípcias não podem assumir um governo interino”, alerta o analista egípcio Talat Musallam, que é militar aposentado. Nada impede, no entanto, que o Conselho Supremo das Forças Armadas designe um militar para assumir a Presidência.

Seja como for, caberá ao governo interino a convocação de novas eleições presidenciais, que devem acontecer já sob novas regras, em no máximo dois meses. Para isso, será necessária uma reforma constitucional urgente, além da suspensão imediata das leis de exceção em vigor desde 1981. Os Estados Unidos, principal aliado do Egito, prometeram apoiar a transição, mas cobraram clareza. “O governo egípcio deve mostrar um caminho crível, concreto e inequívoco em direção a uma democracia genuína”, disse o presidente Barack Obama, pouco depois do pronunciamento de Mubarak no fim da noite da quinta-feira 10. Fontes ligadas às negociações no Egito disseram que a saída de Mubarak vinha sendo articulada pela Casa Branca com o Conselho Supremo das Forças Armadas do Egito. As conversas de bastidor ocorreram ao longo da semana, com a participação de Moscou, Pequim, Riad e Beirute.

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O ditador também não encontrou em Barack Obama o apoio que esperava.
Em 2009  a relação entre os dois ainda era próxima

O Egito também precisará de apoio internacional para reativar sua economia, paralisada após 18 dias de protestos, com greves no serviço público, fechamento de bancos e suspensão das atividades turísticas. Segundo estimativas de bancos privados, o país árabe perdeu ao menos US$ 10 bilhões no período. Uma situação nada confortável, considerando que o antigo governo já planejava emitir novos títulos da dívida pública para captar US$ 2,5 bilhões no mercado. A questão econômica funcionou como estopim dos protestos populares. E exige providências urgentes, já que os problemas não estão resolvidos com a renúncia de Mubarak.

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