A proposta de emenda constitucional proibindo o casamento entre pessoas do mesmo gênero nos Estados Unidos foi derrotada na quarta-feira 14. No dia anterior, os líderes republicanos no Senado já reconheciam que dificilmente conseguiriam os votos necessários na Câmara dos Representantes para que o assunto fosse ao menos considerado. O tema, uma das bandeiras políticas mais queridas dos conservadores religiosos, foi incorporado ao proselitismo de palanque do presidente George W. Bush em sua campanha para a reeleição. Mas poucos no país acreditavam que a mudança na Constituição fosse necessária ou possível. Até mesmo Linney Cheney, esposa do vice-presidente Dick Cheney e nome de projeção na direita do país, enfiou sua colher no assunto e disse preferir que cada Estado na União legislasse de acordo com os costumes locais. Esta idéia parece excelente, caso não se conheçam as formas que o estabelecimento de regras sobre condutas sexuais adquirem quando deixadas apenas na competência destas instâncias.

Uma amostragem do que é o pé da letra legal nos 50 Estados americanos
parece ter saído diretamente de um almanaque do absurdo. A começar, por
exemplo, pelos padrões de decoro parlamentar impostos aos deputados de
Nevada. “É ilegal a qualquer membro da legislatura conduzir negócios oficiais fantasiado de pênis, quando o Legislativo estiver em sessão”, diz literalmente
a lei. Não explica, porém, se o ilustre representante público pode ostentar o traje
viril caso o plenário esteja em recesso.

Peixe vivo – Existem vários sites de internet nos Estados Unidos dedicados apenas às importantes pesquisas sobre leis sexuais no país. Competem entre si para mostrar à curiosidade pública aquilo que os legisladores acreditam ser condutas sexuais apropriadas a seus constituintes. Pegue-se o Estado de Minnesota. Lá, está totalmente proibido a um homem manter relações sexuais com um peixe vivo. No Brasil, o povão teria apelidado de “Lei JK”, em homenagem ao ex-presidente Juscelino Kubitschek e sua canção predileta. A lei, porém, é omissa no trato de peixes mortos. Já os habitantes de Ohio têm mais permissividade no campo do bestialismo. Naquele Estado, a cópula com qualquer animal é permitida, contanto que não seja feita visando lucro.

Os humanos, porém, são os mais atingidos pelas legislações específicas à sexualidade. Está na jurisprudência de Kentucky: “É vedado às mulheres o uso de trajes de banho em autoestradas estaduais, a menos que cada cidadã esteja acompanhada por dois soldados, ou armada de um porrete.” É a lei Inezita Barroso (De braço dado com dois soldados). Em Oxford, Ohio, é ainda pior: a lei proíbe mulheres de fazerem strip-tease na frente da foto de um homem, mesmo que elas estejam na própria casa.

As mulheres que estão em Tremonton, Utah, arriscam-se a pegar cana caso façam amor ao serem transportadas numa ambulância. Além da detenção, o nome da infratora será publicado no jornal local. Seus concidadãos masculinos, porém, podem praticar o coito no mesmo tipo de viatura, contanto, é claro, que achem uma parceira disposta a quebrar a lei. No Oregon, na pacata estância de Willowdale, as meninas têm vida mais relaxada. Seus companheiros são proibidos de falar palavrões durante a cópula, mesmo que seja no ouvido da esposa. Por outro lado, as obscenidades, em tais casos, são liberadas para as bocas femininas. Em Alexandria, Minnesota, atende-se à capacidade olfativa, sempre mais acurada, das fêmeas: maridos cheirando a alho ou cebola não podem exigir carinhos das patroas. Também estão protegidos por lei os orgasmos das moradoras de Connorsville, Wisconsin: os amantes machos estão proibidos de disparar armas de fogo no momento do clímax delas.

Camisolões – No país onde se inventou o termo “revolução sexual”, nem tudo é paz no campo do amor. Os quartos de hotéis de Sioux Falls, em Dakota do Sul, são obrigados legalmente a ter duas camas separadas por meio metro de distância, mesmo que a ocupação seja feita por pessoas casadas. Quem quiser transar por lá terá de fazê-lo numa única cama. A lei coloca também o chão fora dos limites permissíveis para o ato sexual. Mas isso não é nada comparado ao que estão sujeitos os turistas que vão a Hasting, em Nebraska, onde se exige dos hotéis o fornecimento a seus clientes de camisolas de dormir. É terminantemente proibido ficar pelado no quarto alugado. Caso o desejo carnal arrebate a parelha, a cópula deverá se realizar com os amantes vestidos com as tais camisolas. Nem pense em se entregar aos chamados de Eros com as luzes acesas em dormitórios de Romboch, Michigan. A legislação local é clara: sacanagem, só no escurinho.

Durante séculos, a dureza da Justiça punia os sodomitas em todo o território americano. Hoje em dia, apenas 14 Estados ainda mantêm leis contra a sodomia. Por “sodomia”, os americanos entendem os atos de sexo oral e anal. As comuni-dades gays do país reclamam que deste modo são discriminadas legalmente, o
que é proibido pela Constituição. Mas o Estado da Geórgia recentemente provou equidade ao condenar a cinco anos de prisão um homem heterossexual por ter feito sexo oral. Com a própria esposa. No lar, com o consentimento e incentivos dela. Seu crime, dizem, ainda causa hilaridade entre seus colegas detentos. Em Nova York a sodomia não é criminalizada, contanto que haja acordo entre as partes envolvidas. É perfeitamente legal até mesmo o chamado “fist sex” – o ato de introduzir toda a mão ou braço no esfíncter de alguém. A exigência que se faz é que o consenti-
mento para a performance seja dado na frente de testemunhas ou em documento autenticado por notário. Imagina-se que os possuidores de sangue frio suficiente para se engajar numa manobra sexual destas não terão constrangimentos em levar mais dois dedinhos de prosa no cartório para oficializar o contrato.