O Brasil virou uma verdadeira máquina de exportação. O superávit da balança comercial – ou a diferença entre o que o País vendeu e o que comprou lá fora – já soma US$ 16 bilhões em 2004, um recorde histórico. O grosso continua saindo das linhas de produção das grandes companhias ou do eficiente setor agrícola, e assim será para sempre. A diferença é que agora as micro e pequenas empresas começam a participar com força no comércio exterior. Para superar as dificuldades inerentes ao pequeno negócio, elas estão se reunindo em consórcios e, com isso, ganhando escala, porte internacional e reduzindo custos com embarque e logística. Nas palavras de Luiz Carlos Barboza, diretor técnico do Serviço Nacional de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), “juntas, elas se comparam aos grandes conglomerados”.

Esse espírito exportador dos negócios de menor porte já foi detectado pelas estatísticas da Agência de Promoção de Exportações do Brasil (Apex-Brasil), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Só no ano passado, 342 empresas de pequeno porte venderam para fora pela primeira vez. Em muito breve, serão dez mil as micro e pequenas com transações internacionais. O valor das vendas dessas companhias chegou a US$ 1,736 bilhão, o que representa um crescimento de 30% em relação a 2002. A curva continua em franca ascendência, já que os negócios contabilizados no primeiro semestre deste ano já atingem US$ 2 bilhões. “Muitos desses empresários nunca tinham viajado de avião. Hoje eles estão tendo sucesso no mercado internacional”, diz Juan Quirós, presidente da Apex Brasil.

Os Correios também sentem o impacto da elevação das vendas externas pelas pequenas empresas. O Exporta Fácil, produto que desburocratiza o despacho
de produtos para qualquer parte do mundo no valor de até US$ 10 mil (em breve, US$ 20 mil), é um sucesso. Nos primeiros seis meses de 2004, o valor das operações cresceu 108% em relação ao mesmo período em 2003. “Isso comprova que as pequenas estão aumentando o valor médio de suas vendas”, diz Osório Carvalho Dias, chefe da Divisão de Comércio Exterior da estatal.

A agência administra cerca de 200 projetos em 45 setores da economia brasileira. Só na viagem feita recentemente à China, logo após a visita do presidente Lula ao país, 85 empresas de pequeno porte fecharam US$ 462 milhões em negócios. Os setores de alimentos processados, como massas, café em grão, doces e frutas secas, além de carnes, sucos de frutas e cachaça, foram os preferidos dos chineses. Nos três dias que ficaram na China, os empresários brasileiros participaram de nada menos que 536 encontros comerciais com os chineses.

A cada nova investida no mercado internacional – só neste ano a Apex já realizou 224 eventos no Exterior com a participação de pouco mais de quatro mil empresas brasileiras –, aumentam os interessados em fazer negócio com o Brasil. O caso do Bahia Beach Export, um consórcio de produtores de moda praia, é exemplar. Foi participando de feiras internacionais que Cilli Abreu, uma das sócias da empreitada, descobriu que podia vender seus biquínis para qualquer país do mundo. Antes de conhecer o sucesso, porém, foi preciso muito trabalho para transformar um grupo de seis confecções em referência como exportador no Estado. Hoje, são 14 empresas consorciadas que produzem 360 mil peças por ano. Mais de 30 mil vão para países como França, África do Sul, Angola, Itália, Espanha e Líbano. Este ano, além do biquíni, seguem para fora todos os acessórios e complementos que fazem parte da coleção, como shortinhos, viseiras, saídas de banho. No ano passado, as exportações renderam US$ 400 mil. “Já temos representantes na Itália e na África do Sul”, diz Cilli, que está fechando a venda de toda a coleção 2004/2005 para a cadeia espanhola de lojas El Corte Inglês.

Silvania Nuto, proprietária da Flora Tropical, de Fortaleza, Ceará, produz flores
em 16 hectares nos municípios de Redenção e Baturité, a 100 quilômetros da capital. Sua família trabalha com flores há 25 anos, mas foi em 2001 que ela descobriu o mercado externo como uma saída para a queda nas vendas.
Associada a uma empresa maior e que exporta 95% de sua produção, a Quinta
das Flores, ela foi apresentada a um pequeno importador português que comprou
as primeiras quatro caixas como experiência. Hoje, são embarcadas três toneladas por ano de helicônias, alpínias e folhagens para Lisboa, o que representa 25% de toda a produção. “Nosso comprador é pequeno, mas estamos crescendo junto com ele”, diz Silvania.

Mel – Crescer também é o desejo das 700 famílias que produzem mel na região do semi-árido do Piauí. Reunidos na Associação de Apicultores de Simplício Mendes (Aapi), município localizado a 416 quilômetros de Teresina, os produtores se tornaram referência na exportação de mel no País. São 12 mil colméias (em média, 30 para cada apicultor), de onde saem 100 toneladas de mel anualmente. Ao longo de 2004, 60% do que foi produzido seguiu para os Estados Unidos, 20% foi para a Itália e o restante foi vendido na região. No total, a associação faturou R$ 600 mil.

Os números ainda são pequenos, se comparados com apicultores do Sul do País, mas o município de Simplício Mendes serve como exemplo de articulação para mudar a situação econômica das famílias da região. Antes da associação, as pessoas viviam da roça e tinham que se virar com cerca de R$ 50 por mês ou de favores políticos. Hoje, a média salarial é de um salário mínimo e muitos já possuem televisão e geladeira, bens antes considerados de luxo.

As iniciativas em prol da inserção dos pequenos no comércio global vêm de várias frentes. A pesca está se beneficiando de um projeto de R$ 2 milhões que pretende transformar peixes nativos brasileiros, como o surubim, o tambaqui e o tucunaré, em pratos da culinária internacional. Na França, 140 produtos brasileiros, como café, amendoim, doces e água de coco, estão sendo oferecidos nas mais de 700 lojas de supermercado do Grupo Casino, sócio do Pão de Açúcar no Brasil. As frutas brasileiras estão sendo promovidas em 18 países com a ajuda de outra rede francesa, o Carrefour. Aos poucos, os empreendedores brasileiros vão percebendo que o mundo não é tão grande quanto parece.