No início da epidemia, a Aids era considerada doença de homossexual. Depois, passou para homens heterossexuais. Há alguns anos, porém, tem avançado sobre as mulheres. Primeiro, foram particularmente as casadas. Agora, atinge com força as adolescentes. A revelação foi feita durante a 15ª Conferência Mundial de Aids, realizada na semana passada em Bangcoc, Tailândia. Um relatório do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para as Mulheres (Unifem) divulgado no encontro mostrou que dos portadores do HIV entre 15 e 24 anos no mundo, 60% são do sexo feminino. E a principal forma de contaminação é a relação heterossexual. No Brasil, a situação também é preocupante. Em 1993, existiam 281 meninos entre 13 e 19 anos com a doença. Naquele ano, eram 119 meninas portadoras do HIV na mesma faixa etária. A partir de 2000, houve uma inversão. A taxa passou a ser de 208 garotos para 262 jovens. Em 2002, último dado disponível, havia 147 meninos e 180 meninas infectadas.

Há muitas razões para esse aumento. Uma delas reside na própria anatomia feminina. A vagina é uma região mais propícia a lesões do que o pênis, o que aumenta a chance de aparecimento de pequenos machucados que podem servir de porta de entrada para o vírus. Mas, de acordo com o documento da Unifem, as condições de vida das mulheres, em especial as habitantes dos países mais pobres, também contribuem para que elas se tornem vítimas da doença. Ainda há falta de acesso à informação e a pobreza de muitos locais empurra várias jovens para a prostituição.

Além disso, há um sério problema cultural. Boa parte das mulheres não consegue negociar a prática do sexo seguro com seus parceiros. Algumas têm medo de pedir ao companheiro que use camisinha e outras abandonam o hábito de usar preservativo na relação quando se apaixonam. Em adolescentes, pesa ainda a rebeldia inerente a essa fase da vida. “É natural o jovem partir para o enfrentamento e achar que nada irá acontecer com ele. É o período da perda do limite. Para piorar, hoje ele tem muito acesso a drogas e álcool, o que dificulta estar consciente para tomar decisões”, diz o infectologista David Uip, de São Paulo.

De acordo com os especialistas, uma das formas de enfrentar o problema é investir nas escolas. Algumas iniciativas nesse sentido já estão sendo feitas. O Ministério da Saúde, por exemplo, pretende implantar, neste ano, em 211 colégios da rede pública um programa de prevenção. “Vários trabalhos mostram que os adolescentes escutam muito mais os professores do que os pais”, explica Alexandre Grangeiro, diretor do Programa Nacional de DST/Aids. O objetivo é capacitar os professores para falar sobre educação sexual e também disponibilizar o preservativo.

Ações semelhantes a essa têm se mostrado promissoras. A ONG Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual (GTPOS) realiza desde 1996 um programa com adolescentes de escolas de São Paulo. Eles participam de oficinas durante as quais tiram dúvidas, revelam angústias, aprendem a conhecer melhor seu corpo e a usar a camisinha. Depois, são capacitados para passar a informação aos colegas e organizar eventos para discutir o assunto na escola e na comunidade em que vivem. “Eles precisam de um espaço para discutir valores e conhecer seus direitos sexuais e reprodutivos. Quando isso acontece, a tendência é que eles fiquem menos ansiosos. Dessa forma, acabam vivendo a sexualidade com maior responsabilidade”, diz a psicóloga Beth Gonçalves, do GTPOS.