A morte de Marina Simonetti Bandeira de Melo, sete anos, no Colégio Dante Alighieri, em São Paulo, transformou-se num mistério. As explicações dadas pelos diretores da escola não convenceram a família e, mais do que isso, contradizem o próprio laudo do IML. Os pais de Marina, o casal de juízes Ricardo Procópio e Isaura Simonetti Bandeira de Melo, estão diante de um duplo problema: a trágica perda da filha e o desconhecimento sobre como aconteceu a morte da criança.

Marina Simonetti e o irmão, João, cinco anos, estudavam há cinco meses no tradicional colégio paulista, fundado em 1911. Eles moravam com os pais em Natal (RN) e se transferiram para São Paulo quando o casal de juízes foi fazer mestrado. Faltavam apenas dois dias para os irmãos entrarem em férias. Era a tarde do dia 28 de junho, quando Isaura Simonetti recebeu um telefonema da direção do colégio. O coordenador pedagógico Lauro Spaggiari informava que a filha dela havia sofrido uma parada cardíaca. Começavam aí os trágicos momentos que a família de Marina passaria e que ainda não tiveram fim, já que as explicações sobre sua morte continuam cercadas de dúvidas.

São contradições entre as afirmações dos diretores do colégio e o laudo provisório do IML. O colégio já chegou até a “admitir” que Marina poderia ter sofrido uma queda no dia 28 pela manhã em casa e que o traumatismo cervical sofrido na escola seria consequência disso. “Jamais. Minha filha esteve comigo o tempo todo em casa”, reage, em tom de indignação, Ricardo Procópio. Ele classifica a hipótese levantada pela escola como “cínica”. Pelos questionamentos sem resposta, o caso ganha repercussão e a Procuradoria Geral de Justiça de São Paulo já confirmou que designará um promotor especial para acompanhar o inquérito.

Os pais de Marina estão em Natal, na companhia de familiares. Diferentemente das primeiras declarações, aceitando a “fatalidade”, e do comportamento silencioso logo após o acidente, hoje eles são contundentes ao cobrar explicações e exigem a verdade dos fatos. “Acidentes podem acontecer em qualquer lugar, mas o que precisamos conter são os acidentes morais”, afirma Ricardo. Nesta entrevista a ISTOÉ, ele faz um desabafo, conta da decepção com o comportamento da escola e confirma que não desistirá de descobrir a verdade sobre a morte da sua filha.

ISTOÉ – Quais são as contradições que o sr. vê nas explicações sobre
a morte de Marina?
Ricardo Procópio Bandeira de Melo
– Meu cunhado, advogado Sílvio Simonetti, esteve reunido com a direção do colégio no dia 12 e as explicações são contraditórias. Eles disseram que Marina caiu de bruços. Mas, no rosto da minha filha, não havia nenhum arranhão. Ele também pediu para ver o local onde havia ocorrido a “queda” com Marina. O ponto indicado era uma superfície plana, onde não havia câmera do sistema de segurança. O colégio fez, junto com Sílvio, todo o caminho percorrido durante o socorro. Em toda essa área havia nove câmeras do sistema de segurança. Perguntamos pelas fitas e o colégio diz que o sistema havia sido desligado dois dias antes para manutenção. Ou o Dante não tem a segurança que eles dizem ou o colégio está mentindo e as fitas foram destruídas. No colégio há 72 câmeras. Como eles desligaram o sistema de segurança se ainda faltavam dois dias para o semestre terminar? O colégio também é muito cínico. Chegou a dizer que minha filha poderia ter sofrido o traumatismo cervical (como indica o laudo do IML) em consequência de uma queda sofrida em casa. Na minha casa não aconteceu nada. Eu estive com Marina o tempo todo. Agora, o colégio também está negando que houve parada cardíaca. Mas o bombeiro que acompanhou o socorro de Marina até o hospital disse que o desfibrilador (equipamento usado como choque para reanimação), pertencente ao colégio, foi usado. Além do mais, quando o professor Lauro (Spaggiari) telefonou para avisar do acidente, foi claro ao afirmar que havia sido uma parada cardíaca.

ISTOÉ – O que mais lhe chocou na postura do Dante Alighieri?
Ricardo
– Eles não deram explicação sobre a morte da minha filha. O laudo do IML indica traumatismo cervical. Já conversei com especialistas e esse traumatismo não pode ter ocorrido por uma queda em superfície plana. Ele foi causado por um impacto violento. Além do mais, o colégio também falhou muito no comportamento com os colegas dela.

ISTOÉ – Em que sentido?
Ricardo –
Uma mãe me telefonou e contou que no dia seguinte à morte de
Marina – mesmo os colegas tendo presenciado a queda dela – os diretores
foram na sala onde ela estudava e disseram categoricamente: “Não houve queda. Tirem isso da cabeça e assunto encerrado.” Como podem tratar o caso da minha filha dessa forma?

ISTOÉ – O que aconteceu de fato?
Ricardo
– Não sei se foi só mesmo um acidente; pode ser que tenha sido algo muito mais grave. Quero saber a verdade e tenho esse direito.

ISTOÉ – A solidariedade dos pais dos outros alunos lhe surpreendeu?
Ricardo
– Não. Mas estou surpreso com as queixas que alguns deles me relatam, afirmando que o fato ocorrido com Marina não foi o primeiro. Estou surpreso por eles (os pais) saberem de acidentes passados e nunca terem comentado. Recebi vários telefonemas. Inclusive, uma mãe me ligou para contar que houve outras quedas nas escadarias do Dante. Estou com todos os dados dela e passarei para a polícia. Ela também vai depor no inquérito.

ISTOÉ – O colégio será processado?
Ricardo
– No momento, não penso nisso. Penso só em esclarecer toda a verdade.

ISTOÉ – Logo após a morte de Marina, o sr. silenciou. O que foi que mudou?
Ricardo
– Ficamos em silêncio devido à grande dor que estávamos passando. Mas o colégio não deu explicações. O caso da minha filha não pode ser tratado dessa forma. O que estou querendo saber é só a verdade.

ISTOÉ – Como foi seu último contato com sua filha ainda viva?
Ricardo
– Às 12h15 do dia 28 de junho, Marina e João saíram do apartamento e entraram no transporte do colégio. A partir daquele momento, ela estava sob
os cuidados do Dante. Como sempre fazia, quando eles foram saindo eu disse:
“Que Deus abençoe vocês.” Já passava das 15h, quando minha esposa recebeu o telefonema da escola dizendo que Marina havia sofrido parada cardíaca. Até o Hospital das Clínicas levamos uma hora. Foi a hora mais demorada que já vivi.
No fundo, acreditava que iria encontrar Marina viva. Mas, quando cheguei, vi minha filha morta.