chamada_livros.jpg

 

 

 

Escrito em 1989, o livro póstumo do escritor chileno Roberto Bolaño, “O Terceiro Reich” (Companhia das Letras), tem como protagonista um escritor alemão vidrado em estratégias de guerra. Ele é campeão em um jogo intitulado “Terceiro Reich”, no qual atua ao lado das forças nazistas, embora não nutra nenhuma simpatia pela causa. A sua guerra virtual desencadeia conflitos reais e íntimos que irão afetar seu comportamento racional e equilibrado num thriller psicológico crescente.

livros.jpg

 

Leia um trecho do livro:
 
20 de agosto

Pela janela entra o rumor do mar mesclado com os risos dos últimos noctâmbulos, um ruído que talvez seja o dos garçons recolhendo as mesas do terraço, de vez em quando um carro que circula com lentidão pelo Passeio Marítimo e zumbidos apagados e inidentificáveis que proveem dos outros quartos do hotel. Ingeborg dorme; seu rosto parece o de um anjo cujo sono nada perturba; na mesinha de cabeceira há um copo de leite que ela não provou e que agora deve estar morno, e junto do seu travesseiro, meio coberto pelo lençol, um livro do detetive Florian Linden do qual leu apenas um par de páginas antes de adormecer.
Comigo acontece exatamente o contrário: o calor e o cansaço tiram meu sono. Geralmente durmo bem, entre sete e oito horas por dia, embora muito raras vezes me deite cansado. Pelas manhãs acordo fresco como uma alface e com uma energia que não decai ao cabo de oito ou dez horas de atividade. Que me lembre, foi sempre assim; faz parte da minha natureza. Ninguém me inculcou isso, simplesmente sou assim e com isso não quero dizer que seja melhor ou pior que os outros; a própria Ingeborg, por exemplo, sábado e domingo não se levanta antes do meio‑dia, e durante a semana só uma segunda xícara de café e um cigarro conseguem acorda‑la totalmente e empurra‑la para o trabalho.Esta noite, porém, o cansaço e o calor tiram meu sono. Também a vontade de escrever, de registrar os acontecimentos do dia, me impede de ir para a cama e apagar a luz.