Cerca de 1.800 municípios brasileiros não tem Conselho Tutelar. Outros 1.200 não contam com Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente. E muitos dos já existentes funcionam precariamente. Isso apesar de o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), desde a sua criação há 14 anos, prever a existência desses órgãos. Os dados são da Secretaria Especial dos Direitos Humanos e demonstram o descaso com que são tratados os temas da infância e da adolescência em boa parte do Brasil. Para alterar esta situação, a secretaria e o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), em parceria com o Instituto Telemig Celular, criaram o Pró-Conselho Brasil. O objetivo é implantar e fortalecer os conselhos nos mais de cinco mil municípios brasileiros. “Muitos existem apenas no papel. É preciso conhecer os entraves encontrados pelas prefeituras”, explica Antonia Puertas Jimenez, da coordenação executiva do programa. “Esse programa é transformador e será instrumento para a efetivação de uma ampla política pública infanto-juvenil no País”, avalia Denise Paiva, subsecretária de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Uma das iniciativas de mobilização será a reunião em Brasília, nos dias 11, 12 e 13, de conselheiros de todo o Brasil. “Nossa meta é chegar a 2007 com 100% dos conselhos de Direitos instituídos no território nacional e 80% dos Tutelares”, afirma José Fernando da Silva, vice-presidente do Conanda. Está previsto ainda, para outubro, o lançamento na mídia da campanha Fundo Amigo, que conscientizará os contribuintes sobre a possibilidade de aportar parte do imposto devido ao Fundo da Infância e Adolescência (FIA). Empresas podem contribuir com 1% e pessoas físicas com até 6%. A Petrobras, por exemplo, doou R$ 32 milhões em dezembro do ano passado para programas do Conanda, de conselhos estaduais e de municipais, beneficiando 130 cidades.

Há, na verdade, uma grande desinformação da sociedade a respeito desses conselhos. É preciso, inicialmente, esclarecer o que são e a que se destinam. O Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente deve existir em âmbito federal, estadual, distrital e municipal. Tem a responsabilidade de formular, deliberar e controlar a política infanto-juvenil em sua área de ação. Também controla o Fundo da Infância e Adolescência. Já o Conselho Tutelar, recebe denúncias de ameaças ou violação de direitos e faz o encaminhamento e a cobrança de soluções. Metade de seus membros, em geral voluntários, é indicada pelo poder público e a outra metade, eleita pela sociedade civil. O Conselho Tutelar é constituído por cinco pessoas escolhidas pela comunidade, que trabalham em dedicação exclusiva.

A falta de verbas para remunerar o Conselho Tutelar é uma das alegações feitas pelos prefeitos que estão em desacordo com a lei, mas, para a maioria, falta mesmo preparo. Há também um problema cultural, como aponta o pedagogo Antonio Carlos Gomes da Costa, que participou da elaboração do ECA. “Com a Constituição Federal de 1988, nossa democracia, que era representativa, passou a ser também participativa. O ECA reforçou mais este valor. Tivemos grandes avanços, mas ainda perdura uma cultura impeditiva à participação popular. Há o clientelismo, o fisiologismo, a burocracia do governo e o conformismo do povo”, explica. Para ele, a implantação dos conselhos pode mudar essa realidade. “Se eles estiverem funcionando, podemos dizer que a democracia existe de fato no Brasil”, conclui.

Nas cidades pequenas, também é precária a organização da sociedade civil. Em consequência, faltam lideranças para a composição dos conselhos. O governo pretende atacar essas dificuldades com a campanha de conscientização e programas de capacitação, tendo como base a experiência do Instituto Telemig. Em 2001, o instituto criou o Projeto Pró-Conselho em Minas Gerais. Na época, apenas 276 dos 853 municípios mineiros apresentavam conselho de direitos em funcionamento e 223 tinham o Tutelar. “Em dois anos, esses números pularam para 626 e 509 no Estado. Com uma forte campanha de esclarecimento, a contribuição aos fundos também cresceu. As doações com incentivo fiscal de empresas aumentaram 1.317% e as de pessoas físicas, 591%”, informa Francisco de Assis Azevedo, diretor executivo do instituto.