Diretor criativo da Calvin Klein, o brasileiro diz que a primeira-dama dos EUA e a da França falham em suas escolhas de roupas

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CIFRÕES
“Apesar de muitos estilistas acharem que fazem arte, moda é antes
de tudo um negócio”, diz ele

O estilista brasileiro Francisco Costa ocupa, desde 2003, uma das posições de maior prestígio da moda. Após trabalhar durante 15 anos com os grandes Oscar de la Renta e Tom Ford, ele é hoje o diretor criativo do prêt-à-porter feminino da famosa grife Calvin Klein. Escolhido pelo próprio Calvin para assumir o cargo, Francisco já conquistou elogios de críticos especializados e abocanhou dois troféus de melhor estilista pelo Council of Fashion Designers of America, considerado o Oscar da moda. Mineiro natural da pequena cidade de Guarani, interessou-se pela moda ainda na infância, quando brincava na fábrica de roupas infantis da família. Com a morte da mãe, aos 18 anos, decidiu mudar-se para Nova York, onde mora há mais de duas décadas, mas nunca perdeu o contato com seu país de origem. “Adoro visitar o Bra­sil sempre que posso. Queria ir mais ao Nordeste, mas viajar para lá está muito caro”, conta, bem-humorado.

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"Eu gostaria de vestir
a Marisa Monte. Ela tem um estilo bem próprio
e bem simples, como a Calvin Klein”

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“Pedro Lourenço é um talento enorme, apesar de supernovo.
Tem muitas chances de ganhar cada
vez mais projeção no mercado internacional”

 

 

 

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ISTOÉ

Vestir celebridades é mais difícil do que vestir uma consumidora comum?

Francisco Costa

Não, é mais fácil. Para a consumidora comum, não existe mais o conceito de roupa de ocasião. Hoje a mulher precisa usar o mesmo look para ir ao trabalho, fazer compras no shopping e sair para beber com as amigas à noite, por exemplo. Já as celebridades recorrem à marca para ocasiões bem específicas, com regras de vestimenta. Então, nesse sentido, facilita nosso trabalho. A única parte difícil é ter de lidar com os agen­tes e produtores dessas celebridades.

ISTOÉ

Qual mulher gostaria de vestir e ainda não teve oportunidade?

Francisco Costa

Eu gostaria que as brasileiras vestissem mais minhas roupas, mas ainda estamos num processo de expansão do número de lojas no País. Gostaria de vestir a (diretora da Daslu) Donata Meirelles mais vezes, porque ela é uma referência de estilo. A (cantora) Marisa Monte também, que eu adoro. Ela tem um estilo bem próprio e bem simples, como a marca.

ISTOÉ

O que você gosta de usar?


Francisco Costa

Jeans e camiseta branca, o básico. Mas tenho uns oito smo­kings, por obrigação (risos).

ISTOÉ

Quem é a mulher para a qual você desenha? Tem alguma musa inspiradora?

Francisco Costa

Tenho várias, de diferentes etnias. (A atriz) Eva Mendes, que é latina, (a atriz) Zoe Saldaña, negra, (a atriz) Diane Kruger, loira. Isso é bem representativo do conceito de moda global da Calvin, destinada a todos os perfis de mulheres. Uma pessoa que também me inspira bastante é a Camilla Nickerson, minha companheira de trabalho.

ISTOÉ

Que conselho daria para um jovem que pensa em seguir carreira como estilista? É importante cursar faculdade de moda?

Francisco Costa

Qualquer escola é um canal para desenvolver técnicas. Os cursos de moda são bons para aprender as técnicas de modelagem, corte, etc. Mas no fundo acho que não precisa fazer faculdade. Acho que a experiência prática vai dando as ferramentas necessárias para o seu aprimoramento.

ISTOÉ

Você acha que existe espaço no mercado de moda internacional para novos criadores brasileiros?


Francisco Costa

Acho que existe espaço para criadores, ponto. Não importa a origem. Acho muito antigo pensar em moda brasileira, moda americana, moda francesa. Hoje fazemos parte de uma sociedade muito mais global. Então, se você tem talento, terá oportunidade.

ISTOÉ

Acompanha o trabalho de algum estilista brasileiro?

Francisco Costa

Em outubro fui convidado para assistir ao desfile do Pedro Lourenço, em Paris, e foi uma maravilha. Ele é um talento enorme, apesar de supernovo. E tem muitas chances de ganhar cada vez mais projeção no mercado internacional.

ISTOÉ

 Seu começo nos Estados Unidos foi difícil?

Francisco Costa

Quando cheguei, fiquei seis meses, viajei pelo país, me diverti horrores e gastei quase todo o dinheiro que tinha. Com o pouco que me sobrou, me matriculei numa escola de inglês aqui em Nova York. Voltei ao Brasil, peguei o visto de estudante e vim novamente para os Estados Unidos, dessa vez para estudar inglês, pela manhã, e moda no FIT (Fashion Institute of Technology) à noite.

ISTOÉ

 Trabalhava no quê?

Francisco Costa

 Passeava com cachorros à tarde e também era uma espécie de babá de cachorros. Tinha uma mulher que eu visitava três vezes por semana. No porão da casa dela havia roupas maravilhosas. Ela era maníaca por roupas e sapatos. Eu deveria cuidar dos cachorros dela, mas passava o tempo todo no closet (risos). Era começo dos anos 1980, época de peças incríveis da Chanel couture, Fendi. E os sapatos? Ela tinha uns 500 pares de sapatos. Eu me ofereci para catalogar o acervo dela. Para mim, foi o paraíso, uma verdadeira escola de moda. Há pouco tempo, vi essa senhora atravessando a Sétima Avenida e foi muito engraçado. Depois de todo esse tempo…

ISTOÉ

 Como foi a experiência de trabalhar ao lado de mestres como Oscar de la Renta e Tom Ford?

Francisco Costa

 O Oscar me deu a noção da importância da cor. Mesmo sendo brasileiro, eu nunca havia dado valor à cor. Não sei. Lá em Minas, minha família não vestia roupas muito coloridas. Com ele entendi que cor é fundamental. E também aprendi técnicas, como fazer uma roupa trabalhada, estruturada. E com o Tom Ford aprendi uma visão muito mais minimalista e moderna da moda. O Tom via tudo como se estivesse olhando através de uma câmera, tanto que fez o filme lançado neste ano. Ele me deu muita consciência do poder da imagem.

ISTOÉ

 Como recebeu o convite de Calvin Klein para assumir a criação do prêt-à-porter feminino da marca?

Francisco Costa

 Fiz uma entrevista com Calvin um ano antes de sair da Gucci e não era o momento certo para mim. Logo depois o Oscar de la Renta me ligou e pediu para que eu assumisse a alta-costura e o prêt-à-porter da Balmain, porque ele estava saindo da marca. Então me despedi da Gucci e pensei: “Que bom! Vou para Paris!” Mas a minha advogada levantou a situação financeira da Balmain e era um desastre (risos). Como eles estavam quebrados na época, resolvi não pegar esse trabalho e fiquei sem emprego. Meu namorado, que é treinador de cavalos, conhecia o Barry Schwartz, sócio-fundador da Calvin Klein. Um dia no hipódromo o Barry disse que o Calvin ainda estava precisando de um diretor de criação e novamente entramos em contato. E ele me deu o trabalho.

ISTOÉ

 Assumir essa nova função substituindo o próprio dono da empresa na direção de criação foi difícil?

Francisco Costa

Bom, um ano depois que assumi o posto, o Calvin vendeu a empresa, que agora faz parte de um grupo de acionistas. Por isso, acabei não sofrendo uma interferência direta dele em meu trabalho. Mas o legado que ele deixou é muito forte. É algo ao mesmo tempo assustador e inspirador.

ISTOÉ

 Calvin Klein adora o Brasil e mantém um apartamento no Rio de Janeiro. O fato de ser brasileiro conta pontos com o patrão?

Francisco Costa

 Acho que sim, né? Esse jeito brasileiro descomplicado, gostoso, fácil de lidar, reflete muito o estilo de vida dele e também da história da companhia.

ISTOÉ

 A crise econômica influenciou os negócios da empresa?

Francisco Costa

 A vantagem da Calvin Klein é que temos desde as roupas íntimas até a linha Collection, a mais cara. É uma gama bem variada de produtos, com várias faixas de preços. Quando a crise chegou, já tínhamos tantas linhas no mercado internacional que nosso negócio permaneceu forte. A linha Collection sofreu mais, é claro, como todo item de luxo, mas no geral o desempenho da Calvin foi muito bom. Até aumentamos nossa fatia de mercado. Hoje estamos extremamente bem e com um bom futuro à frente.

ISTOÉ

 A crise também motivou a marca a voltar as atenções para os mercados emergentes?

Francisco Costa

 Isso já estava nos planos de negócio da Calvin, mas ficou mais evidente após a crise. O mundo inteiro está voltando as atenções para a China, a Rússia, o Brasil e a Índia. E, entre todos, acho que o Brasil tem mais chances de conquistar grandes investimentos estrangeiros a longo prazo porque nossa sociedade é muito mais sofisticada, livre. Temos um “espírito europeu”.

ISTOÉ

 Moda é arte ou negócio?

Francisco Costa

 Negócio, sem dúvida. Apesar de muitos estilistas acharem que fazem arte, moda é antes de tudo um negócio.

ISTOÉ

 Dá para conciliar consumo de massa com informação de moda?

Francisco Costa

 Acho que o consumo em larga escala vem depois que aquele conceito de moda já está bem gasto. Demora pelo menos um ano para que algo couture vá para o mercadão. Mas a partir do momento que se popularizou já não é mais alta moda. Vira algo comercial, vazio de significado.

ISTOÉ

 É possível vestir-se bem com fast fashion?

Francisco Costa

 Se você tem estilo, sim. Eu acho que é algo individual. Sempre gosto de dizer que você pode se vestir bem com um jeans da GAP, que cai bem no corpo, ou se vestir mal mesmo usando um jeans caríssimo, mas que não tem bom caimento.

ISTOÉ

 Existe algum segredo para ser elegante?

Francisco Costa

 Acho que conforto e simplicidade são fundamentais. Tem que saber o que é melhor para você, em termos de proporção, corte, enfim. Itens individuais, com significado, também demonstram elegância. Uma bolsa de palha comprada numa viagem à Bahia é um toque diferente, por exemplo.

ISTOÉ

 Quem é mais elegante, Michelle Obama ou Carla Bruni?

Francisco Costa

 Ô, meu Deus! Não posso responder essa (risos). Acho que as duas precisam de ajuda, elas não são infalíveis nas escolhas. Mas posso dizer que a Michelle Obama é mais elegante porque eu já a vesti mais vezes do que a Carla Bruni.

ISTOÉ

 O que acha do estilo de Dilma Rousseff?

Francisco Costa

 Sabe que não sei o estilo dela? Eu a vi uma vez num evento realizado pela embaixada do Brasil em Nova York e achei muito simples, um figurino de uma mulher de negócios, sóbrio como deve ser. Mas não sei quais roupas ela usou durante a campanha. Seria muito legal vê-la de Calvin Klein, já pensou?


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