Comportamento

Loucuras por um ídolo
Fãs acampam na fila de shows, largam a escola, são expulsos de casa. Tudo em nome de seus astros

Carina Rabelo

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Se a década de 60 foi marcada pela febre Beatles e a de 80 pelos garotos porto-riquenhos do Menudo, a histeria juvenil da geração atual é a banda mexicana RBD – fenômeno que estourou entre os adolescentes em 2004 com a novela Rebelde. A banda lançou oito discos em quatro anos e vendeu cerca de 22 milhões de cópias em todo o mundo. Em agosto, um comunicado oficial anunciou o fim do grupo e a turnê de despedida. Após a notícia se espalhar entre os fãs, o que era uma adoração se tornou uma obsessão nostálgica.

Ansiosos pelo último adeus, cerca de 400 jovens, entre 14 e 22 anos, revezados em grupos de 20, acamparam durante 23 dias na área externa da Arena do Anhembi, em São Paulo, para garantir um lugar próximo aos seus ídolos no show, que ocorre no dia 29 de novembro na capital paulista e em outras três cidades do País. No dia 19 a Guarda Municipal proibiu a utilização das barracas, mas eles não desistiram e continuam concentrados no local dormindo em colchões infláveis. O acampamento começou em agosto em frente ao Estádio do Morumbi e da casa de shows Via Funchal, locais cotados para a realização do evento. Desde então, os fãs abandonaram suas casas e se assentaram em frente às bilheterias.

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"O meu ingresso é o número quatro. Quando os portões se abrirem, quero estar entre os primeiros", diz o estudante de administração Felipe Leandro Silva, 19 anos. Roberta Vilarinho, 22 anos, a líder do grupo, trancou a faculdade para se dedicar à profissão-fã. Ela recebe a cada semana R$ 20 para manter a estrutura funcionando e imprimiu senhas com 750 nomes para garantir o lugar de cada "sócio" na fila. "Quando a polícia baixou aqui pela primeira vez, passei a noite na delegacia e já fui até expulsa de casa. Mas nada me intimida. Faço tudo pelo RBD", afirma Roberta, menina de cabelo lilás que exibe uma tatuagem em todo o braço com o nome ‘Christian’, em homenagem ao seu ídolo-mor na banda.

O acampamento gerou polêmica entre os pais. Alguns, revoltados, colocaram os filhos para fora de casa. É o caso da estudante Giulianna Fortuna, 18 anos, que deixou a família indignada após largar o terceiro ano colegial para se juntar aos demais. "As aulas estavam atrapalhando", argumenta a menina, que ficou obcecada pelo RBD após uma viagem à Argentina, onde diz ter recebido um beijo de Poncho, outro integrante da banda. "Vou montar uma república para abrigar os que não têm onde morar", promete Roberta. "Ninguém aqui quer voltar para casa", diz Leandro Bruno, 17 anos, que obteve autorização do Conselho Tutelar para permanecer no acampamento. Engana-se quem pensa que o fanatismo acabará junto com a banda. Alguns juntam dinheiro para ir ao México acompanhar os artistas. "Aqui a gente é muito carente e se apaixona por quem nos dá atenção. Amamos o RBD porque eles são muito humildes e carinhosos", afirma Felipe. Metade dos fãs tem alguma tatuagem em referência aos ídolos.

Outro fenômeno atual é o filme Camp Rock, lançado neste ano e estrelado pela banda Jonas Brothers e a cantora Demi Lovato.

i76961.jpgA produção teve mais de 8,9 milhões de espectadores. A estudante de direito Marília de Freitas, 18 anos, presidente do fã-clube Jonas Brothers Brasil, se engajou com todo o empenho no projeto de trazer o grupo para o Brasil. Em abril do ano passado, criou uma comunidade no Orkut e divulgou para amigos de amigos na rede. Reuniu fãs, organizou passeatas, foi até os escritórios da Universal e da Disney, em redações e programas de rádio para divulgar o trabalho dos fãs.

Por amor aos Jonas Brothers, ela terminou com um namorado, fez uma viagem de oito horas para assistir a um show que iria passar na tevê a cabo e abriu uma conta no banco para comprar produtos da banda.

"Se eles não vierem ao Brasil no ano que vem, vou atrás deles. Nem que eu tenha que dormir na porta do hotel", promete a jovem, que juntou R$ 3,5 mil para conhecer os rapazes nos Estados Unidos. O esforço valeu a pena.

A banda Jonas Brothers se apresenta no dia 11 de julho, no HSBC Arena, no Rio de Janeiro. Segundo a antropóloga Ana Lúcia Modesto, autora da tese O ídolo e os seus devotos, da Universidade Federal de Minas Gerais, diferentemente das demais gerações, os adolescentes de hoje sentem-se mais próximos dos seus ídolos por terem acesso à vida deles através da internet. "Alguns se sentem tão íntimos que perdem a noção da própria identidade e podem se tornar obsessivos".

Vale lembrar que, ao contrário das paixões na adolescência, que são transitórias, a tatuagem com o nome do herói do momento é para a vida toda.


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