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Durante a Idade Média, a Rota da Seda, conjunto de estradas que liga o Mediterrâneo ao Extremo Oriente, funcionou como um canal de comunicação entre os povos do oeste e leste do planeta. Por ela, civilizações se conectavam e trocavam informações sobre os mais diversos temas. A Europa, por exemplo, exportou conhecimentos matemáticos, astrológicos e médicos. A China, por sua vez, invenções revolucionárias, como o papel e a pólvora. Séculos depois, uma equipe brasileira formada por seis profissionais – entre eles historiadores, antropólogos e documentaristas – vai mergulhar neste turbilhão cultural a partir de abril de 2009, seguindo as pistas de seu mais célebre viajante, Marco Polo. Veneziano e filho de nobres comerciantes, ele deixou a cidade natal rumo a Cambaluc (atual Pequim, na China), em 1271, quando tinha 17 anos, levado pelo pai e pelo tio. Seus ricos relatos de viagem originaram o Livro das maravilhas, obra-prima que percorreu o mundo e é reverenciada até hoje.

Idealizado pelo historiador Rodrigo Silva, o Projeto Rota da Seda pretende entrar em contato com as manifestações culturais, hábitos e costumes dos povos que habitam as regiões que permeiam o trajeto. E mostrar aos brasileiros toda a riqueza e diversidade observada. "O conteúdo captado será apresentado aos domingos, ao longo dos cinco meses que vai durar a aventura, no programa Domingo Espetacular (Record)", explica Pierre Schurmann, que faz a produção executiva do projeto. As imagens também serão transformadas em um documentário de 120 minutos. Para que a idéia saia do papel, Schurmann se debruça na captação de recursos.

EQUIPE IRÁ PERCORRER 13 MIL KM, PASSAR POR 400 CIDADES
E ENTRAR EM CONTATO COM 20 ETNIAS

Por ser muito antiga e cruzar diversos países que ao longo da história registraram batalhas e guerras, a Rota da Seda possui variações de percurso. Ou seja, quando uma região enfrentava turbulências políticas ou religiosas, o trajeto era desviado. O caminho escolhido pelos brasileiros tem como base a viagem realizada por Marco Polo. A expedição irá cruzar nove países em dois continentes, passar por 400 cidades e entrar em contato com 20 etnias, que falam 30 línguas e dialetos. Serão 13 mil km percorridos em cinco meses – Marco Polo fez cerca de 12 mil km, em três anos e meio. Para se locomover, revezava lombo de camelo com as próprias pernas.

Silva – que teve o primeiro contato com o Livro das maravilhas aos 14 anos – está planejando a aventura há pelo menos três. O historiador preferiu incluir no roteiro as regiões mais preservadas culturalmente, ou seja, locais onde a globalização ainda não mudou completamente os costumes da população. "Ao definirmos o trajeto, conciliamos locais interessantes com níveis satisfatórios de segurança", diz o historiador. Dessa forma, a expedição evitará áreas turbulentas, como o sul da Turquia, sua fronteira com a Armênia e o Afeganistão. Todos os trechos da viagem possuem rotas alternativas. Para que flua bem, a equipe conta com a experiência de Christian Trombetta, que será o produtor da equipe e se dividirá entre a base, no Brasil, e os colegas, no Exterior. Especialista em logística, ele é experiente na organização de operações em áreas remotas e em condições adversas. "Há países fechados, como o Irã, com os quais estamos negociando a entrada", explica Trombetta. Da mesma forma que se preocupou com o trajeto, o historiador Silva pesquisou qual a melhor época para cair na estrada. "Largamos em Istambul no finalzinho do frio e chegamos à China antes do início do inverno", explica. "Tempo ruim no Himalaia é completamente inviável", completa Silva.

A primeira parte da viagem, de Veneza (Itália) a Istambul (Turquia), será feita de avião. É na capital turca, portanto, que a aventura realmente começa. A equipe irá percorrer o trecho restante até Pequim, na China, em uma única tacada por terra. O meio de transporte será um caminhão overland – com força de 360 cavalos, autonomia de 1.800 km e resistente às mais variadas condições de solo e clima, como desertos, montanhas e neve. O veículo será totalmente customizado, a partir das necessidades da equipe. Além de objetos pessoais e equipamentos de trabalho, ele levará água potável e alimentos desidratados. "Nas cidades, o grupo dormirá em pousadas e comerá em restaurantes. Nas áreas mais remotas, o caminhão servirá de apoio para a montagem de barracas e na preparação das refeições", diz Shurmann, aventureiro de carteirinha (membro da família que percorreu o mundo em um veleiro, durante dez anos), que irá encontrar a equipe em alguns trechos da viagem. No caminhão, também funcionará uma ilha de edição capaz de transmitir dados e imagens em tempo real.

Silva está ansioso para alcançar a região da ex-URSS. "Acredito que a grande surpresa virá de países como Turcomenistão e Uzbequistão", diz ele. Com a dissolução da União Soviética, essas repúblicas conquistaram a independência e reabriram suas fronteiras. A expressão "Rota da Seda" foi cunhada no século XIX pelo geógrafo alemão Ferdinand von Richthofen, que escolheu o nome inspirado no produto mais famoso entre os transportados por aqueles caminhos. Agora é a vez de o Brasil também fazer parte dessa história.

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