Por uma semana, o Brasil vai estar estrategicamente posicionado no centro do mapa das artes mundial. Desde a quarta-feira 13, obras de 108 artistas de 32 galerias brasileiras estão localizadas em um pavilhão de mil metros quadrados na 27ª Feira Internacional de Arte Contemporânea de Madri – Arco’08. Se considerarmos a intensa programação de performances, mesas-redondas e mostras paralelas de arte, filmes e vídeos que se prolongam até o mês de abril em diversos espaços culturais da capital espanhola, o número de artistas passa de 150. O acontecimento é uma operação cultural e comercial, acionada pelo Ministério da Cultura do Brasil – que destinou R$ 2,6 milhões ao projeto -, em parceria com a Arco e outras importantes instituições espanholas. Embora o evento promova uma superexposição, há divergências sobre que tipo de impacto essa visibilidade pode gerar sobre a valorização brasileira no mercado internacional. "Não será mais uma homenagem que irá provocar o descobrimento do Brasil. A arte nacional já foi descoberta nos anos 1960. Waltercio Caldas foi convidado para o Pavilhão Itália da Bienal de Veneza, Iole de Freitas para a Documenta e Carmela Gross para o El Matadero, em Madri, todos por méritos próprios e não por delimitações geográficas", afirma a galerista Raquel Arnaud.

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 Se alguns questionam o real interesse dos circuitos europeu ocidental e americano pela produção brasileira como um bloco, outros vislumbram, a médio prazo, sua expansão nos moldes do crescimento da arte contemporânea chinesa, que nos últimos anos teve uma valorização explosiva de até 400%. "Uma das principais nações emergentes economicamente, o Brasil também tem sido visto como um país com grande potencial de desenvolvimento de artistas interessantes e integrados ao cenário artístico contemporâneo", afirma Daniel Roesler, diretor da Galeria Nara Roesler. A globalização é apontada como um facilitador para o processo de internacionalização da arte nacional e as feiras internacionais, ao lado dos leilões, são os lugares onde os vínculos comerciais se estabelecem. Recomenda-se que uma galeria participe, no mínimo, de três edições de uma mesma feira, para então começar a conquistar clientes. "Foi o que aconteceu conosco. Após três anos na feira Miami Basel, pagamos nossos custos", diz Akio Aoki, responsável pelas vendas internacionais da Galeria Vermelho, hoje em torno de 40% do faturamento total.

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Todos admitem, no entanto, que as condições de concorrência são desiguais. Visibilidade não implica diretamente valorização de mercado. "Sob o ponto de vista geopolítico, não existe democracia na arte. O artista americano ou inglês custa muito mais caro que o brasileiro", diz Alex Gabriel, diretor artístico da Galeria Fortes Vilaça, que tem mais da metade de seus clientes entre estrangeiros. "Veja os resultados de leilão; eles são um bom termômetro para medir a influência do fator nacionalidade sobre o preço", completa ele. Os brasileiros de maior projeção, como Vik Muniz, Beatriz Milhazes, Miguel Rio Branco ou Ernesto Neto, raramente alcançam o lance mínimo de US$ 100 mil, que costuma acionar as operações do mercado internacional. Esse bom desempenho depende sempre do tripé mercado, crítica de arte e circuito institucional.

"O reconhecimento internacional de um artista tem que passar por essas três instâncias", diz a crítica de arte e pesquisadora Ana Letícia Fialho, que detectou um superdimensionamento da presença da arte brasileira no Exterior na defesa de tese de doutorado na École des Hautes Études en Sciences Sociales de Paris, em 2006.

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VITRINE Elas em transe, de Ernesto Neto (pág. ao lado),
custa US$ 60 mil. Fotos de Rochelle Costi,
como Desvios, têm preço mínimo de R$ 40 mil.
A tela de Caetano de Almeida vale US$ 2,5 mil

Ana Letícia admite que hoje a produção nacional está mais bem posicionada lá fora do que no início dos anos 1990. Mas pondera: "Até aqui, conquistamos mais reconhecimento da crítica e das instituições do que valor de mercado. No contexto atual, não é raro artistas fora do eixo obterem visibilidade internacional, mas em geral trata-se de uma visibilidade instável, momentânea." Para a almejada valorização, vender para instituições é tão – ou mais – importante quanto vender para colecionadores. Foi decisivo o fato de a Tate Modern, de Londres, ter adquirido obras de Cildo Meireles, Adriana Varejão e Rosangela Rennó, e de o MoMA, de Nova York, ter assimilado Jac Leirner, Beatriz Milhazes e Rivane Neuenschwander. O mesmo se deu com Ernesto Neto e Janaina Tschäpe, incorporados ao acervo do Centro Georges Pompidou, em Paris. Há cada vez mais artistas brasileiros representados por galerias estrangeiras. Na atual edição da Arco, o País está representado por 34 galerias. O efeito real dessa homenagem será conferido no número de participantes da Arco 2009.