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EMBATE
Dilma se dirige para o segundo bloco do último debate, na sexta-feira 29

 

Apesar do pé machucado, das dores na perna e da ansiedade natural de quem estava na iminência de se tornar a primeira mulher presidente do Brasil, Dilma Rousseff enfrentou bravamente a reta final de uma das campanhas eleitorais mais acirradas desde 1989. Faltando sete dias para o segundo turno, a ordem no comitê de Dilma era de não baixar a guarda, mesmo com as pesquisas apontando a provável vitória da petista. A estratégia foi seguida à risca. Na manhã do domingo 24, à base de corticoides e de um polivitamínico para diminuir as dores e lhe garantir energia extra, Dilma participou de uma carreata na zona oeste do Rio de Janeiro. Durante o trajeto, em um jipe aberto, que percorreu os bairros de Realengo, Padre Miguel e Bangu, Dilma, tomada pela emoção, ficou com os olhos cheios de lágrimas. “A carreata está linda, linda demais”, repetia a petista ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo um dos aliados presentes ao evento, naquele momento Dilma começou a acreditar na vitória. Como havia muito trabalho pela frente, a petista, aconselhada por Lula, manteve os pés no chão. Escaldado com o primeiro turno, o presidente insistia com todos, não só com Dilma: “Está perto. Não podemos errar agora.”

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RETA FINAL
Em 25 de outubro, Dilma se reuniu, em São Paulo,
com líderes da coligação petista

 

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NORDESTE
A petista percorreu o País. Em setembro, gravou para
o horário eleitoral em Salvador

 

Com o tempo escasso e a preocupação de não derrapar na reta de chegada, Dilma aproveitou as viagens de jatinho, entre um compromisso e outro, para calibrar a voz, cada dia mais desgastada pela rouquidão. No trajeto Rio-São Paulo, no cair da tarde do domingo 24, ao lado do presidente do PT, José Eduardo Dutra, a petista entoou a plenos pulmões a célebre “Biquíni de bolinha amarelinha”, sucesso de Celly Campelo, intérprete dos anos 60. “Voltamos para São Paulo numa cantoria só”, disse Dutra à ISTOÉ. “Dilma sabe tudo de cor, inclusive as músicas da jovem guarda.” O número de passageiros do jatinho usado na campanha foi diminuído de nove para oito, por causa do problema no tendão do tornozelo direito da ex-ministra, inflamado desde setembro depois de um exercício mal executado na esteira. Sentada na poltrona à esquerda, na parte do fundo da aeronave, Dilma passou a viajar com a perna apoiada no assento à sua frente.

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PAUSA
Depois de um debate na RedeTV!, Dilma janta com
membros da cúpula petista em São Paulo

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As últimas horas daquele domingo foram utilizadas por Dilma para a preparação para o debate da Rede Record, que aconteceria no dia seguinte. “Não vamos deixar nada sem resposta”, disse Dilma, enquanto degustava uma canja de galinha. “Se vierem com Erenice, rebateremos com Paulo Preto.” Pouco antes do debate, na segunda-feira 25, ainda sobrou tempo para a divulgação do documento intitulado “Os 13 compromissos programáticos de Dilma Rousseff para debate na sociedade brasileira”. O anúncio ocorreu em uma reunião fechada com lideranças dos partidos da coligação. Dilma permaneceu por 20 minutos no local. “Preciso poupar a voz”, alegou.

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NAVAL
Dilma cumprimenta trabalhadores no
lançamento de navio em Ipojuca (PE)

 

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APOIO
A candidata almoça com aliados na
Associação Comercial do Rio de Janeiro

 

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COLETIVA
Na Confederação Nacional de Saúde, a petista fala à imprensa

 

O programa na Record transcorreu dentro do esperado e a preocupação da campanha passou a ser com o preparo físico da candidata, que enfrentaria uma verdadeira maratona no dia seguinte. “Ela precisa dormir bem para estar tinindo amanhã”, comentou o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), um dos principais integrantes da campanha. Na terça-feira 26, o dia realmente foi cheio. E bastante quente. A candidata fez o percurso do aeroporto de Fortaleza até o heliponto do Hotel Marina, onde foi recebida por populares, a bordo do helicóptero de propriedade do senador eleito Eunício Oliveira (PMDB-CE). Sob um sol escaldante de 36 graus, Dilma subiu em uma picape para discursar para dez mil pessoas, na praça do Ferreira, centro da capital cearense. A petista suava em bicas e o pronunciamento durou apenas 5 minutos. No discurso, ela agradeceu aos 66% dos votos que obteve no primeiro turno no Ceará. Devido ao forte calor, algumas pessoas presentes na plateia passaram mal. A brevidade do ato foi plenamente justificável. Além do clima insuportavelmente quente, Dilma ainda percorreria mais duas cidades em dois Estados diferentes do Nordeste: Caruaru (PE) e Vitória da Conquista (BA). Na Bahia, o prefeito de Vitória da Conquista, Guilherme Menezes, e 40 gestores de municípios da região mobilizaram os militantes para o comício, uma espécie de resposta ao evento que o candidato tucano havia realizado na semana seguinte ao primeiro turno. “Sabem qual o energético que me leva para cima?”, perguntou Dilma durante o evento. “A energia que vem a cada vez que me abraçam.”

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MULTIDÃO
Corpo a corpo com eleitores, na carreata em Guarulhos (SP)

 

No encerramento da “superterça”, como os aliados batizaram um dos dias mais movimentados da campanha, petistas e ministros do governo reuniram-se no Palácio da Alvorada para comemorar o aniversário do presidente Lula. A candidata chegou ao local acompanhada do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci. Embora chamada de presidente por alguns petistas mais apressados, Dilma manteve a discrição, cercando-se de cuidados para que o evento não soasse como uma comemoração antecipada da vitória. Por esse motivo, deixou cedo a festa. Enquanto a maioria dos convidados varou a madrugada, Dilma preferiu retirar-se por volta das 22h. Suas atenções já estavam voltadas para o derradeiro debate da Rede Globo, na sexta-feira 29. “Ela está preocupada com a voz”, disse o ex-ministro do Turismo Walfrido dos Mares Guia, que, ao lado de Palocci, foi quem mais conversou com a candidata durante o aniversário de Lula. “Está muito afônica.”

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GLOBO
Em julho, a viúva de Roberto Marinho, Lily,
ofereceu um almoço para a petista

 

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DIVERSIDADE
Dilma e líder caiapó em evento no dia 20 de outubro

 

Os dois dias seguintes seriam de agenda mais amena. Na quarta-feira 27, já no Hotel Naoum, em Brasília, onde funcionou o QG petista nas semanas que antecederam a eleição, Dilma assistiu aos debates de 2002 e 2006 realizados na Rede Globo. Estava acompanhada de sua assessora Olga Curado. O objetivo da iniciativa foi observar como o presidente e então candidato Lula reagiu às provocações do candidato do PSDB ao Planalto, Geraldo Alckmin, e do próprio Serra, sem perder a linha. “O momento agora é de tranquilidade”, disse um de seus assessores. “Afinal, estamos na dianteira.” Na quinta-feira, ainda em Brasília, Dilma encontrou-se com petroleiros, em um evento breve – a candidata partiria no mesmo dia para o Rio de Janeiro, sede da Rede Globo. Na sexta-feira 29, Dilma, como um jogador de futebol às vésperas de um clássico decisivo, passou o dia concentrada no hotel Marriot, em Copacabana. Ao lado de Palocci, Dutra, Cardozo e de Nelson Barbosa, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, a candidata do PT repassou os temas que seriam abordados no debate. Barbosa, já no Projac, sede da Rede Globo, chamava a atenção não só pelo porte avantajado. Cotadíssimo para assumir o Ministério da Fazenda de Dilma, ele circulava com desenvoltura pelos bastidores do programa, distribuindo sorrisos. Seu semblante só mudou quando a torcida de Serra se manifestou contra a petista.

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RAPIDEZ
Para cumprir a agenda, a candidata percorreu
o País em voos fretados e de carreira


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CONECTADA
Dilma, no lançamento de seu blog, em abril.
A internet foi fundamental na campanha

 

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AUDIÊNCIA
Eleitores veem o derradeiro debate em
restaurante no Rio, na sexta-feira 29

 
 

Além do desembaraço de Barbosa, a maneira como os integrantes do staff de Dilma foram acomodados no debate também mostrou o que poderá vir a ser o primeiro escalão da presidente eleita. Na fileira da frente do espaço reservado ao PT estavam o governador eleito do Acre, Tião Viana, a senadora eleita Marta Suplicy, o vice Michel Temer e o assessor de Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, coordenador do programa de governo e tido, nas rodas de conversa, como possível ministeriável. Bem à vontade e com cotação altíssima, também marcou presença no evento o diretor da Caixa Econômica, Moreira Franco, cogitado para assumir uma pasta na Esplanada dos Ministérios na cota do PMDB. Os ministros das Cidades, Márcio Fortes, e de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que devem permanecer no governo, também foram alvo de atenção, além do deputado José Eduardo Cardozo, um dos principais conselheiros de Dilma e forte nome para o Ministério da Justiça.

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MARATONA
Dilma chega para o debate do primeiro turno, na Globo

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PREPARAÇÃO
Dilma nos estúdios da Globo. Ela analisou
embates antigos entre Lula e Serra

 
 

Mas foi Antônio Palocci quem mais se destacou. Se no debate do primeiro turno o ex-ministro de Lula apenas assistiu ao programa na plateia de convidados petistas, desta vez ele teve lugar cativo no palco. Com Dutra e o marqueteiro João Santana, formou o trio de assessores que orientou Dilma durante o debate. Embora não estivessem de salto alto, ninguém deixava de assumir o favoritismo já apontado, naquele momento, por todos os institutos de pesquisas. “Todos os institutos mostravam números bem semelhantes, com uma diferença que nos dava uma vantagem confortável”, disse Dutra à ISTOÉ. Às 23h32 de sexta, ao responder uma questão sobre política social, Dilma usaria pela primeira vez, neste segundo turno, o termo “no meu futuro governo”. Na rápida entrevista coletiva, que encerrou o debate, Dilma falou da dor na perna que a incomodou por toda a corrida eleitoral. Ao final do debate, o pé de Dilma estava completamente inchado. Devido ao formato do programa, ela teve de se movimentar o tempo todo pelo estúdio. “Vocês não sabem a dor que eu estou sentindo”, contou.

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POPULAR
Gravação de programa na favela da Rocinha para o horário eleitoral

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ALEGRIA
Em Brasília, na comemoração do Dia das Crianças.
A essa altura, vitória era quase certa

 
 

No dia seguinte ao debate da Rede Globo, não havia, de fato, mais nenhuma dúvida sobre a eleição de Dilma. Tanto assim que o coordenador do programa de governo, Alessandro Teixeira, acionou outros integrantes da campanha no fim da tarde. Queria saber o número do telefone por meio do qual Dilma atenderia as ligações de presidentes estrangeiros assim que tivesse a vitória confirmada nas urnas. É que representantes de governos de pelo menos quatro países – Portugal, Colômbia, Peru e Venezuela – haviam ligado para o número usado por Teixeira na campanha. No sábado 30, Dilma também já não conseguia esconder de ninguém sua empolgação com o desfecho da campanha. A futura presidente do Brasil fez questão de trocar a caminhada prevista na agenda por uma carreata pelas ruas de Belo Horizonte. Temia que no chão, rodeada por militantes e bandeiras, não fosse vista pelos eleitores.

– “Eu quero o povo”, disse Dilma a assessores.

Colaborou: Luiza Villaméa

 



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