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MAIORIA
Dilma conseguiu conquistar eleitores de todas as classes sociais

 

O caminho de Dilma Rousseff até o Palácio do Planalto pode ser considerado curto. Em pouco mais de oito anos ela saiu da Secretaria de Minas e Energia do Rio Grande do Sul para se tornar a primeira mulher a ser eleita presidente do Brasil. Mas a rapidez com que se transformou de uma técnica afeita à burocracia do poder público em uma personalidade do mundo político não significa que esse trajeto tenha sido suave – mesmo contando com o apoio de um presidente com alto nível de aprovação popular como Lula. Além da quase sanguinária campanha eleitoral em que enfrentou José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV), Dilma também teve que superar obstáculos internos e pessoais para conquistar o direito de dirigir o País. Ao longo dos últimos três anos, quando sua candidatura foi de fato construída, a agora presidente eleita lidou com a desconfiança interna do seu próprio partido, a inexperiência eleitoral, a falta de traquejo político e até um tratamento de saúde.

Para conquistar a larga maioria dos 134 milhões de eleitores brasileiros, Dilma passou por uma transformação da sua persona pública. Além dos retoques no visual, precisou mudar a maneira pela qual ela seria vista pelo eleitor. Ainda na pré-campanha, o primeiro objetivo foi substituir a imagem de gerente “pulso firme” pela de estadista maleável e política, apta a abordar temas importantes para o País. O discurso excessivamente técnico de Dilma no lançamento de sua pré-candidatura, no dia 13 de junho, no Centro de Convenções de Brasília, porém, acendeu uma luz amarela no QG petista.

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EXECUTIVA
Os investimentos no pré-sal e a administração das obras do PAC foram utilizados
na campanha para reforçar a imagem de administradora da candidata

 

Foi o próprio presidente Lula quem deu os primeiros conselhos à já candidata oficial do PT. “Dilma, agora você esqueça os PowerPoints e faça discursos sobre a geração de empregos, o Bolsa Família e o aumento real do salário mínimo. Também é importante que você sorria mais”, sugeriu o presidente. Um assessor da campanha conseguiu, com certa dificuldade, convencer Dilma a fazer exercícios a partir das lições de alguns teatrólogos: “A senhora pode sorrir ao falar até sobre temas espinhosos, como um hipotético aumento da inflação”, foi a lição.

Além dos ajustes sobre o discurso e o comportamento, pesquisas de intenção de voto auxiliaram a candidata a tratar de afinar a campanha conforme interesses específicos do eleitorado. Os assessores de Dilma se dedicavam a aspectos que podem parecer meros detalhes. Foi assim, por exemplo, quando as primeiras sondagens eleitorais apontaram a dificuldade da candidatura em conseguir o apoio do eleitorado feminino. Numa reunião no QG de Dilma no Lago Sul, em Brasília, o marqueteiro João Santana ponderou: “A mulher é muito mais seletiva, mais crítica e espera mais tempo para agregar informações.” Apesar disso, alertou ele, era preciso fazer algo para aproximar Dilma desse segmento da população. Ficou definido, então, que a candidata participaria de encontros com socialites do eixo Rio-São Paulo. O primeiro deles, em junho, foi organizado pelo casal Abilio e Geyse Diniz. No mês seguinte foi a vez de Dilma ser recebida por Lily Marinho, viúva de Roberto Marinho. Nos comícios, Dilma também passou a se voltar mais para esse público. “Esse discurso de que ‘ela cuida’ e que ‘ela é mãe’ aumentou a identificação entre Dilma e as mulheres”, atestou a socióloga Fátima Pacheco Jordão.

Realçando as obras do PAC e os investimentos do pré-sal, a ex-ministra reforçava, em paralelo, a fama de executiva, com duas décadas de vida pública. Dilma empenhou-se em absorver dos colegas com mais horas de palanque as dicas, o traquejo e a forma de ser uma candidata. A estratégia deu resultados. No dia 23 de junho o Ibope já confirmava a ultrapassagem sobre Serra nas pesquisas de intenção de voto: 40% a 35%. Com a candidatura ganhando capilaridade em todas as classes sociais, Dilma passou a ampliar a abordagem sobre alguns temas. Em outros, como no caso do aborto, enfrentou uma campanha difamatória raras vezes vista na história política brasileira. Além de panfletos financiados por segmentos obscuros da sociedade brasileira, até mesmo a mulher do candidato tucano, Mônica Serra, adotou a tática de disseminacão do medo ao afirmar que Dilma era a favor de “matar cirancinhas”.

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O GRANDE TESTE
Encarar pela primeira vez o embate nas ruas e convencer a militância
do partido foi um desafio superado em pouco tempo

 

A presidente eleita acabou colecionando votos nas mais diversas classes sociais. Entre seus eleitores, as explicações para o apoio são variadas. Para a classe D, a maior vantagem identificada era a manutenção das políticas sociais do governo Lula. “Gostei das propostas dela, de gerar mais empregos e ampliar o Bolsa Família”, explica o sapateiro brasiliense Edmilson Félix dos Santos, que votou na candidata do PT. Afirmou-se ainda como a representante das mulheres: “A Dilma demonstrou ser uma guerreira e trabalhadora”, afirma a salgadeira paraibana Gildecleide Dias Dantas. Filho de funcionário público, o estudante Iago Araújo de Oliveira também se sentiu contemplado pelo discurso da candidata do PT. Com 17 anos de idade, o estudante votou pela primeira vez na vida. “A Dilma conseguiu me convencer sobre os projetos que ela apresenta, por isso votei nela.”

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Dilma também foi, aos poucos, garantindo mais confiança no meio empresarial, como atesta o presidente da Riachuelo, Flavio Rocha, que, no primeiro turno, votou na candidata do PT na embaixada brasileira em Paris. Ele se disse atraído pelos compromissos da candidata petista com a cartilha econômica adotada pelo ex-ministro Antônio Palocci, para quem o empresário promoveu um jantar no dia 10 de setembro nos Jardins, em São Paulo. “A Dilma fez uma boa campanha, ao prometer a preservação das virtudes dos dois governos do presidente Lula, garantindo a continuidade na economia”, diz Rocha. O empresário entende que a transformação que o Brasil sofreu em menos de uma década alimentou de cima a baixo no País o desejo de continuidade. “Superamos contrastes abissais e transformamos uma classe C quase em extinção em classe majoritária”, aponta Rocha.

Ao conseguir atingir os mais distintos segmentos do eleitorado, já em agosto Dilma se consolidou em primeiro lugar e abriu dez pontos sobre José Serra. Nos debates, em vez de uma adversária frágil, dona de um temperamento explosivo, suscetível a provocações, a oposição se viu diante de uma candidata preparada e firme. Esta performance foi decisiva para fazer sumir velhas restrições partidárias. “Temos um milhão e 300 mil filiados e o que posso dizer é que a campanha de Dilma empolgou a militância do PT”, afirmou o coordenador da campanha José Eduardo Cardozo. O resultado desses cuidados na corrida eleitoral se concretizou na diferença confortável que Dilma obteve sobre o candidato tucano José Serra.

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