A verdadeira beleza, segundo o escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, não se pode contemplar com os olhos, só com o coração. Tão essencial quanto o cérebro, a pele é o maior órgão do corpo humano. Se estendida no chão, a cútis de uma pessoa de estatura média ocuparia dois metros quadrados, quase o tamanho de uma mesa de bilhar. Escudo de defesa contra vírus, bactérias e radiação ultravioleta do sol, ela é nosso veículo primordial de contato com o mundo. Há tempos a ciência investiga as questões práticas e as implicações políticas e filosóficas de um rosto abençoado pela natureza. Entre os estudos, alguns são polêmicos. Revelam que homens e mulheres de boa aparência recebem mais atenção do sexo oposto, maior afeto de suas mães, salários mais altos no trabalho, mais votos – e simpatia – do eleitorado.

A boa notícia é que quem não nasceu Gisele Bündchen, nem Brad Pitt, pode usar as armas da medicina estética para recauchutar o visual. Com uma esticadinha aqui, um corte ali, um enxerto acolá, a beleza está ao alcance de qualquer um com dinheiro, coragem e disposição. O melhor indicador é o desempenho da indústria brasileira dos cosméticos. Avessa às crises econômicas, ela cresceu à taxa média de 6,5% nos últimos cinco anos. Seu faturamento saltou de R$ 5,9 bilhões, em 1998, para R$ 11 bilhões, em 2003. Entre as razões desse aumento estão a maior participação feminina no mercado de trabalho, o desenvolvimento tecnológico e o aumento da expectativa de vida, um estímulo para preservar o frescor e a juventude do rosto e do corpo.

As exportações são outro termômetro. Devem crescer mais de 20% este ano, somando US$ 280 milhões. “Só perdemos para a indústria têxtil”, compara João Carlos Basílio, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). O diferencial dos produtos nacionais, ele diz, está nos ingredientes da natureza, como a andiroba, o açaí e o cupuaçu, para ficar nos mais populares. “É através da nossa biodiversidade que vamos construir a personalidade do cosmético brasileiro lá fora”, afirma.

Além dos ingredientes retirados da mata, o Brasil dá outras mostras de avanço. Bom exemplo disso é um aparelho que usa nanotecnologia para recuperar as fibras de cabelos danificados. “Nosso cabelo é agredido pela poluição, pela água de má qualidade e pela eletricidade estática porque não andamos mais descalços”, diz Osvaldo Alcântara, que tem 53 anos de experiência em beleza e dirige o centro técnico da loja de cosméticos Ikesaki, em São Paulo. A mistura étnica e a variedade de cabelos e peles trabalham a favor da indústria nacional. “Mais da metade das brasileiras tem cabelo de cafuzo”, estima Alcântara. Louras, ruivas, mulatas e morenas, nenhum outro país atende a tamanha variedade.

A área mais promissora, porém, é a dos cosméticos de efeito terapêutico, que se multiplicaram nos últimos dez anos. Usando ingredientes retirados do oceano e substâncias químicas sintetizadas em laboratório, eles prometem suavizar rugas e linhas de expressão, atenuar manchas da idade, reduzir a celulite e as gordurinhas localizadas. Engana-se quem pensa que essa parafernália seja restrita ao público feminino. Desde 1999, cresceu seis vezes o número de homens que usam cosméticos no rosto. Aí incluídos hidratante, filtro solar, loções para pele sensível e barba cerrada.

“É tanta novidade que a gente tem dificuldade de acompanhar e é grande a concorrência para lançar produtos que se dizem milagrosos”, diz o dermatologista Mario Grinblat, do Hospital Albert Einstein, um dos pioneiros em aplicação estética do laser. Nem tudo é elixir da juventude, ele avisa. “Substâncias como o Argireline, o Matrixyl, o Densiskin e o Elastinol ajudam a prolongar os efeitos das plásticas e já demonstram resultados práticos”, diz Grinblat. Nada que se compare às injeções de toxina butolínica, o botox, cujos efeitos duram em média cinco meses. Hoje, o Brasil é o segundo maior consumidor da toxina. Perde só para os EUA.

“A cada ano, a expectativa de vida da população mundial aumenta em uma  semana, e todo mundo quer envelhecer com saúde e beleza”, diz a americana Jeanine Recckio, consultora de empresas como Dior, Chanel, Revlon e L’Oréal. “Daqui até 2025 haverá uma valorização de produtos com ingredientes orgânicos e naturais feitos a partir da nanotecnologia e da biotecnologia”, disse Jeanine na semana passada, durante a Cosmoprof, templo da vaidade e principal evento nacional de cosmética.

De acordo com a teoria evolucionista, a maioria dos animais, aí incluídos os humanos, não busca apenas a beleza num parceiro, e sim saúde e fertilidade. Por isso, se sentem atraídos por quem tem maior probabilidade de reproduzir sua espécie. Homens e mulheres se mobilizam por traços hiperfemininos: lábios carnudos, sobrancelhas arqueadas, olhos grandes, queixo e mandíbula pequenos. Um prato cheio para Vinicius de Moraes, o poeta que mais odes cantou à mulher brasileira e para quem a beleza era fundamental. Infinita enquanto durar.