Ruy Ohtake e Oscar Niemeyer, ícones da arquitetura brasileira, ficarão, no mínimo, intrigados se virem como seus monumentos estão sendo interpretados por alguns jovens de capitais do Brasil. O negócio desses garotos é usar obras notáveis e elementos urbanos como obstáculos e ferramentas para saltar, rolar e girar nas alturas. Ou, nas palavras deles, praticar Le Parkour (palavra inspirada no francês parcour, que significa percurso). A “brincadeira” já se difundiu pela Inglaterra e pelos Estados Unidos e começa a ganhar adeptos por aqui. Os parkours, como eles se chamam, desafiam a gravidade e a sorte pulando, escalando e explorando com manobras o cenário de cidades como Brasília, São Paulo e Florianópolis. E isso sem nenhum aparato de segurança.

Por enquanto, a turma brasileira é pequena. Mas chama atenção de quem passa por prédios e monumentos onde se concentram os praticantes. Tal qual o inventor da modalidade, o parisiense David Belle, os adeptos, em sua maioria, tiveram contato com artes marciais ou ginástica olímpica. “Já fiz kung fu e ginástica olímpica. Uso minhas experiências nesses esportes como base”, afirma o animador gráfico Jacques Kaufmann, 27 anos, de São Paulo. Ele, o publicitário Rodrigo Bélgamo, 29, e o psicanalista Eduardo Bittencourt, 28, formaram em fevereiro, na capital paulista, o grupo pioneiro da modalidade no País. “Começamos saltando de alturas e espaços de meio metro. Hoje, encaramos quatro metros”, diz Bittencourt.

Os parkours ressaltam que é precisotreinar para desenvolver habilidades que resguardam o praticante de acidentes. Um dos truques é rolar o corpo nas quedas para amortecer o impacto contra o chão. Além disso, deve-se recorrer ao bom senso. Eles podem dar um salto maior do que a perna. O problema é exagerar na distância. Com tudo isso, os estragos não são poucos. Eles vão de uma torção até fraturas (por ora, não se sabe de mortes). Segundo o publicitário João Paulo da Silva, 25 anos, um dos praticantes de Brasília, oito de seus colegas estão machucados. “Às vezes, a gente tem a certeza de que consegue completar a manobra, mas se machuca”, diz. Por envolver tantos acidentes, o médico Moisés Cohen, da Universidade Federal de São Paulo, desconsidera o parkour como esporte. “Não há regras nem aparatos de segurança. Qualquer descuido pode ser fatal. Desaprovo totalmente”, critica.

Apesar dos perigos, os parkours celebram o caráter artístico dessa aventura urbana. Há coreografia nos movimentos, algo que consideram tão importante quanto a ousadia. É evidente, porém, que eles são seduzidos por riscos e por sua consequente adrenalina. Muitos destacam a superação pessoal e a apropriação do espaço urbano entre os motivos que fazem o desafio valer a pena. Desafios, aliás, não faltam. A começar pelas autoridades que não acham graça alguma em ver marmanjos dependurados em patrimônios públicos. “Subir em monumentos sem cercados não é crime. Mas danificá-los é uma infração prevista na lei”, pondera a delegada Elizabeth Sato, do 78º Distrito Policial de São Paulo. Lá fora, os parkours estão mais à vontade. Em Londres, por exemplo, um grupo conseguiu autorização para explorar monumentos e telhados de museus. Experientes, os estrangeiros estão ousando mais. Chegam a descer altos edifícios saltando de sacada em sacada. Qualquer semelhança com os personagens da trilogia Matrix não é mera coincidência.