A conversa já estava no futebol. O primeiro-ministro japonês, Junichiro Koizumi, falava para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva da influência do Brasil no Japão, onde até o técnico da sua seleção é brasileiro, o craque Zico. Lula brincou e disse que, se chupassem mangas, os jogadores renderiam mais. Koizumi não titubeou: “Então está liberada a exportação de mangas brasileiras para o Japão”, afirmou. Na verdade, por trás da brincadeira estava o fim de um embargo fito-sanitário de 27 anos às frutas brasileiras, solucionado depois de meses de reuniões técnicas entre brasileiros e japoneses. O filão que se abre aos produtores nacionais, como os de Petrolina, no rio São Francisco, é rico. Uma manga escolhida, no Japão, pode chegar a custar US$ 30 (quase R$ 90). Mas a passagem de Koizumi pelo Brasil não se resumiu às mangas, servidas simbolicamente como sobremesa no almoço oferecido por Lula no Itamaraty, em Brasília. O Japão quer importar álcool anidro para misturar à gasolina e reduzir a poluição – uma lei recém-aprovada permite a mistura de 3% de etanol à gasolina japonesa. Isto pode representar um volume inicial de 1,8 bilhão de litros anuais ou 15% da produção brasileira. Mais ainda: pretende investir nos projetos brasileiros de biodiesel, usando mamona, por exemplo. “As possibilidades de cooperação no campo ambiental são promissoras”, afirmou Lula em seu discurso, na mesma linha de Koizumi, que vê no uso de biocombustíveis uma maneira de Brasil e Japão atenderem às exigências do Protocolo de Kioto.

Foi pensando nisso que o governador Geraldo Alckmin pediu que a visita do premiê japonês ao País começasse por São Paulo. Na terça-feira 14, lá estava Koizumi plantando uma muda de pau-brasil às margens do Tietê, onde vistoriou as obras da calha do rio – um projeto de US$ 700 milhões dos quais o Japão financia mais de 50%. Sempre na companhia do governador, Koizumi sobrevoou as culturas de cana-de-açúcar, laranja, café e fábricas de papel e celulose na região de Proadópolis. Também conheceu algumas granjas de imigrantes japoneses, uma fábrica conjunta da Embraer com a Kavasaki e a usina de açúcar e álcool São Martinho, uma das maiores do País. Os japoneses também financiam, através do Japan Bank for International Cooperation (JBIC), a Linha 4 do metrô paulistano (cerca de US$ 209 milhões) e a limpeza das praias da Baixada Santista (mais US$ 192 milhões). Alckmin esteve no Japão recentemente, quando assinou os acordos e fez o convite oficial ao primeiro-ministro japonês. O governador está de olho no fornecimento de álcool anidro pelas usinas paulistas ao Japão. Tanto que durante os dois dias que permaneceu na capital paulista, Koizumi foi apresentado aos principais produtores de álcool e participou de várias reuniões para ter a garantia de que, se o acordo de venda de álcool for realmente assinado, os usineiros não deixarão os japoneses na mão.

Já o encontro entre Lula e Koizumi, que contou até com a presença, a pedido do premiê japonês, do maratonista medalha de bronze na Olimpíada, Vanderlei Cordeiro de Lima, ídolo no Japão, onde já venceu duas maratonas, coroou uma rápida mas, ao que tudo indica, altamente produtiva passagem do cabeludo primeiro-ministro pelo Brasil. Parceiros privilegiados até o começo dos anos 80, Brasil e Japão ainda mantêm uma corrente de comércio de US$ 6 bilhões, dividida praticamente em partes iguais. A viagem de Lula à China, com a promessa de grandes negócios para os dois lados, acabou acordando os japoneses. Pouco tempo depois da festejada passagem de Lula pelo gigante chinês, o governo japonês agendou a viagem de Koizumi ao Brasil. Na pauta, reativar todo tipo de negócio, desde a exportação de mangas e álcool até os produtos industrializados, passando também pela volta da entrada da carne brasileira no Japão. Todo esse movimento teve como consequência a reativação do Comitê Econômico CNI (Confederação Nacional da Indústria) – Nippon Keidaren (a poderosa associação das indústrias do Japão). Lula e Koizumi consideram que a maior interação entre os setores empresariais dos dois países é fundamental para que os números das importações e exportações cresçam e a parceria volte a ter a importância de 30 anos trás. “O presidente Lula esteve no Japão em 1975, quando os dois países mantinham estreita relação comercial, refletindo o crescimento econômico daqui e de lá. Uma nova visita, passados 30 anos, agora como presidente da República, será esplêndida para construir uma nova relação de cooperação?”, disse Koizumi em seu discurso.

Mas Lula e Koizumi não se resumiram aos temas econômicos. Candidatos declarados a vagas permanentes de um reformulado Conselho de Segurança das Nações Unidas, Japão e Brasil decidiram fazer campanha juntos. E o lobby conjunto – uma espécie de coligação internacional – deverá ganhar o reforço da Alemanha e da Índia, também interessadas em novas vagas. Pelo combinado, quando o Brasil pedir apoio, o fará também em nome da Índia, seu novo parceiro no time dos países em desenvolvimento, e também dos amigos ricos. E os parceiros, pelo trato, farão o mesmo. A esperança é que, juntando o dinheiro japonês e alemão com os bilhões de pessoas da Índia e do Brasil, o quarteto consiga arrombar a porta do Conselho de Segurança, criando uma nova ordem mundial.