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Censo da vida marinha

Engana-se quem pensa que os peixes formam a comunidade mais rica dos oceanos. Enquanto cerca de 16 mil espécies deles são conhecidas em todo o mundo, estima-se que em apenas um litro de água salgada haja 18 mil tipos de bactérias. Mais: segundo os cálculos dos cientistas, quase um bilhão de espécies desses seres microscópicos habitam os mares. A informação é apenas uma das surpresas levantadas pelo maior estudo sobre a biodiversidade oceânica já realizado. Divulgada na semana passada e batizada de Censo da Vida Marinha, a pesquisa durou dez anos e envolveu 2,7 mil pesquisadores de 670 instituições, provenientes de mais de 80 países.
 

“O mais surpreendente é a constatação de que os oceanos são riquíssimos, muito mais interconectados do que se pensava e passam por mudanças que ainda não compreendemos”, diz Paul Snelgrove, um dos cientistas participantes do estudo e autor do novo livro “Discoveries of the Census of Marine Life” (“Descobertas do Censo da Vida Marinha”), uma das publicações resultantes da pesquisa. “Há bastante trabalho sendo feito, mas também existe uma urgência quanto à sustentabilidade”, afirma.

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Outro exemplo de como a vida nos oceanos é interligada é uma criatura de meio milímetro. O Ceratonotus steiningeri é parecido com uma lacraia e nunca tinha sido visto até 2006. O invertebrado foi achado a 5,4 mil metros de profundidade, na costa atlântica da África. Para surpresa dos biólogos, ele foi encontrado novamente a uma distância de 13 mil quilômetros, no Pacífico Central. Outro registro intrigante diz respeito ao deslocamento de certas espécies. A migração do atum de barbatana azul do Pacífico, por exemplo, nunca havia sido monitorada em detalhes antes do censo. Sabe-se agora que esses peixes de até 15 quilos cruzam três vezes o oceano em 600 dias.
 

No Brasil, embora as pesquisas tenham avançado nos últimos tempos, há pouco sendo feito para conhecer profundamente a fauna marinha. Nosso olhar para o oceano pode ser explicado em parte por uma frase proferida por um cientista francês à bióloga Lucia Campos, uma das brasileiras que colaboraram com o estudo. “Ele disse que nós vamos à praia, mas muitas vezes sentamos de costas para o mar”, conta Lucia. Segundo a pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, existem cerca de dez mil espécies brasileiras catalogadas, mas esse número deve representar apenas 28% de nosso patrimônio.
 

“É importante que haja mais investimentos no conhecimento da nossa biodiversidade marinha, seus benefícios e papéis no funcionamento dos ecossistemas”, afirma a bióloga. Esse conhecimento é essencial para a conservação. O País participa entre 18 e 29 de outubro da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) das Nações Unidas, no Japão, sem ter cumprido a meta de preservar 10% dos ecossistemas costeiros e marítimos – apenas 1,5% dos hábitats marinhos dispõe dessa proteção. A importância de novas pesquisas é resumida pelo canadense Snelgrove: “Conhecer a vida nos oceanos pode nos tornar melhores guardiões do que temos sido até agora.”

 

 

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