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Há dois anos, João Batista, 46 anos, trabalhava no setor administrativo de uma das maiores penitenciárias de São Paulo, quando o Primeiro Comando da Capital (PCC) promoveu uma série de ataques que aterrorizaram o Estado. Junto com outros funcionários, João conviveu diariamente com as ameaças dos bandidos e temia se tornar refém durante as rebeliões. Apavorado, ansioso e sem dormir, ele não conseguia voltar ao trabalho e tinha medo de sair de casa. Após se submeter a exames psicológicos, foi diagnosticado com stress pós-traumático e precisou de medicação para controle da ansiedade. Foi encaminhado às sessões de terapia de grupo do Hospital do Servidor Público, mas desistiu logo no primeiro encontro. "Não me sentia pronto para compartilhar com outras pessoas as experiências que tive na cadeia e também não podia pagar um analista. O preço de uma sessão era o equivalente a um terço do meu salário", lembra.

Até que conheceu o Centro de Psicanálise, um instituto que reúne mais de 100 médicos e psicólogos com formação psicanalítica. Ao contrário dos profissionais que cobram até R$ 500 numa sessão de 50 minutos, eles oferecem o mesmo tratamento a um preço acessível. "Ele sugere o valor com base na condição financeira do paciente. Pode ir de R$ 1 a R$ 50", explica o diretor do centro, Ernesto Duvidovich. João foi encaminhado ao psicanalista Márcio Alexandre Rocha, que cobra entre R$ 25 e R$ 50 dos pacientes que vêm ao centro, o equivalente a 50% da sua clientela. Para os demais, fica em R$ 180. "A tendência é a democratização da terapia. Muitas pessoas precisam e deixam de fazer porque não podem pagar", diz. Após um ano e quatro meses em tratamento, João deixou os remédios. "Continuo na terapia por opção, mas nada mais me deixa inseguro. Aprendi a trabalhar o meu medo", revela o funcionário, que retomou as suas funções na penitenciária após quatro meses de análise.

"Continuo na terapia por opção, mas nada mais me deixa inseguro.
Aprendi a trabalhar o meu medo"
JOÃO BATISTA, que trabalha em uma penitenciária

A terapia chegou ao Brasil em meados do século passado e, durante anos, poucos profissionais tiveram acesso aos estudos clínicos, disponíveis apenas na Europa. "Era identificada como uma ciência para a elite, específica para as classes privilegiadas", afirma Humberto Verona, presidente do Conselho Federal de Psicologia. Se, no passado, havia escassez de profissionais, hoje, a situação é diferente. No Brasil, há 4,9 mil psicanalistas, 160 mil psicólogos e 360 cursos universitários de psicologia, que disponibilizam o tratamento nas clínicas-escolas a preços populares. Diante do aumento da oferta e da procura, a Federação Brasileira de Psicanálise criou em alguns Estados os centros de triagem dos profissionais que atendem por valores mais acessíveis. "Não se faz análise uma vez por mês, mas, no mínimo, uma vez por semana. É um tratamento que exige uma freqüência constante do paciente, o que obriga o profissional a flexibilizar o valor da sessão", pondera o coordenador José Carlos Carpilovsky, do programa de psicoterapia de grupo da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro.

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O que fazer

O interessado deve procurar os centros de atendimento ou clínicas sociais disponíveis em seu município. A relação está disponível na Federação Brasileira de Psicanálise, no telefone (21) 2235-5922. Na ficha de inscrição, descreva os seus problemas e diga o que pretende resolver com a terapia e informe sua renda. Em uma semana, o paciente é encaminhado a um profissional próximo à sua residência. Na primeira sessão, geralmente gratuita, é negociado o honorário do profissional (em média, até R$ 50).

Uma das preocupações mais comuns entre aqueles que procuram os centros de triagem é não ter acesso a um serviço de qualidade por estarem pagando menos. Mas quem experimentou, aprova.

Angelina Zolacicco Holpert, 55 anos, garante que as duas sessões de psicanálise durante dois anos a R$ 45 foram mais eficazes do que os 20 anos de psicoterapia a R$ 160. "É um trabalho mais aprofundado porque nos ensina a nos conhecer melhor e mudar os padrões negativos no nosso comportamento", reflete. Ela é atendida pela psicanalista Nilda Jock, que não estabelece um valor fixo por sessão. "Cada um paga o que pode e o valor é renegociado quando a pessoa tem condições de pagar mais. Além de ampliar o acesso, é interessante ao profissional pluralizar o seu trabalho e lidar com pessoas de todas as classes sociais", afirma.