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OS ELEITOS
Palocci, Mantega e Coutinho: um dos três será
o escolhido de Dilma para assumir a Fazenda

 

Até o início do processo de estabilização da moeda brasileira, em 1994, os pesados móveis de jacarandá que decoram o gabinete principal do Ministério da Fazenda pareciam guardar uma maldição. Mal um novo ministro tomava posse para que seu processo de fritura tivesse início. Nos dez anos que separaram a posse dos ex-presidentes José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, nada menos do que 13 deles ocuparam o austero gabinete, uma média superior a um por ano. Desde o primeiro governo de FHC, no entanto, a coisa mudou. Nos últimos oito anos foram apenas três ministros da Fazenda que, cada um a seu jeito, deram continuidade à gestão do antecessor. Agora, tudo tende a seguir esse modelo. Dificilmente o próximo ministro terá destino semelhante ao dos colegas do passado e, por certo, ele também dará continuidade à gestão de Guido Mantega, o atual chefe da pasta e um dos mais cotados para ser o escolhido pela presidente eleita, Dilma Rousseff, para comandar a economia. O ex-ministro e coordenador da campanha de Dilma, Antônio Palocci, e o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, são os outros dois nomes que Dilma analisa para ocupar o Ministério da Fazenda.

Independentemente de quem for o escolhido, o tripé baseado nas metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário que foi implantado ainda em 1999, no final do governo Fernando Henrique Cardoso, não será desfeito. Ao contrário, deve ser reforçado, com mais ou menos ênfase em cada uma de suas pernas, a depender de quem for o novo ministro. Isso porque Palocci, Mantega e Coutinho têm poucos pontos de divergência sobre como devem se comportar os fundamentos macroeconômicos e concordam que o Brasil entra em 2011 em um novo ciclo de expansão, que, espera-se, não deve enfrentar mais os sobressaltos que acabaram cunhando a expressão “voo de galinha”.

Os três são os preferidos de Dilma por compartilharem com a presidente eleita a opinião de que, a partir de agora, é preciso imprimir uma agenda desenvolvimentista ao governo, a quem caberá o papel de importante indutor do crescimento econômico. Mantega, por exemplo, defende até mesmo uma redução nas agressivas metas de superávit primário a fim de que não haja comprometimento na expansão econômica. Foi um dos principais defensores da redução de 3,8% para 2,5% do superávit em 2009, abrindo espaço para a adoção das chamadas políticas anticíclicas durante o período mais agudo da crise financeira mundial. “Não podemos sacrificar o crescimento do País por conta do déficit”, disse ele, ao defender a redução na meta de superávit primário durante a crise.

Apesar do nome cabeludo, esse índice mede basicamente quanto o governo conseguiu economizar durante um ano, sem contar os gastos com juros. Ou seja, pega-se toda a arrecadação e subtraem-se os gastos feitos naquele período. Este ano o governo pretende não gastar 3,3% de tudo o que arrecadar. Ao reduzir essa meta, como fez no ano passado, há mais espaço para o governo fazer investimentos, como em infraestrutura ou mesmo na redução, temporária dos impostos, como ocorreu em 2009 com a diminuição do IPI para a indústria automotiva.

Palocci e Coutinho nunca discordaram das políticas anticíclicas implantadas pelo governo Lula durante o período de crise, mas ambos têm uma visão mais conservadora sobre como o País deve crescer. Tanto um quanto o outro defendem um controle austero das contas públicas, e isso envolve, por certo, uma meta de superávit primário cada vez maior. “Eu nunca consegui convencer muitos dos meus interlocutores, mas acho, insisto, que um bom comportamento fiscal dá mais recursos para os programas sociais, e não menos”, afirmou o ex-ministro da Fazenda do primeiro governo Lula. Coutinho também é defensor de uma política fiscal comprometida e já deu vários sinais de que sendo ministro da Fazenda defenderá o ponto de vista de que é preciso enxugar os gastos da máquina pública para que o País tenha mais musculatura para crescer.

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Para isso ser possível, se­gundo ele, é necessário promover uma ampliação considerável do nível de investimento no Brasil. O que só ocorrerá se Estado e iniciativa privada ampliarem a injeção de recursos em bens de capital, como instalações, maquinário, transporte e infraestrutura. Ao governo cabe não apenas criar um ambiente macroeconômico favorável como também fazer sua parte em áreas que são de sua responsabilidade, notadamente a infraestrutura, ainda tão carente no Brasil. Hoje, todos os atores da economia brasileira investem um montante equivalente a 19% do Produto Interno Bruto. O que é pouco, em sua opinião. “A relação do nível de investimento com o PIB não é fundamental, o importante é que o nível cresça ao menos três vezes mais do que o Produto Interno Bruto”, afirmou em recente entrevista. Em sua opinião, só com uma taxa anual de investimento de 25% o Brasil conseguiria crescer entre 7% e 7,5%. A visão de Coutinho é compartilhada por Mantega e Palocci.

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Mas os dois divergem sobre outro tema central na condução da política econômica e assunto quase tabu para a maior parte dos economistas brasileiros: a inflação. Palocci é um árduo defensor dos controles de inflação. Para ele, o governo deve usar todos os mecanismos que tem a seu dispor para impedir uma escalada de preços. “Nós temos os olhos voltados para a produção e para a renda do trabalhador”, diz. “E é preciso sempre lembrar que a renda tem como grande inimiga a inflação.”

Por dar prioridade absoluta ao crescimento, Mantega, ao contrário de Palocci, não é obcecado pelo controle inflacionário e chega até mesmo a dizer que há no País um “alarmismo” quando o assunto é aumento de preços. Hoje existe uma meta de inflação, que serve como paradigma para as ações do governo, em especial às do Banco Central, de 4,5%. Na prática, isso significa dizer que o governo se compromete a fazer todo o possível para que a taxa encerre o ano perto deste índice. No entanto, 4,5% é o chamado centro da meta. Pelas regras estabelecidas, há uma margem de variação de até dois pontos percentuais, podendo chegar a, no máximo, 6,5%. Mantega, assim como Coutinho, defendem que essa margem de manobra seja usada com mais frequência a fim de não incentivar o Banco Central a adotar uma política monetária mais austera.

Mantega considera a preocupação do BC com as pressões inflacionárias por demais excessiva. Para ele, o comitê de Política Monetária do banco, o Copom, exagera nos juros para combater o aumento do consumo e, por consequência, uma possível onda de aumento de preços. A cada reunião do Comitê, Mantega faz questão de deixar que seus assessores façam todos entenderem que ele não concordou com a decisão. “Para viabilizar o crescimento é preciso que os juros continuem caindo e o crédito aumentando”, afirma ele com frequência. Coutinho é outro que comunga dessa tese. Para ele, o Banco Central acaba, muitas vezes, sendo vítima de pressões do próprio mercado, que faz projeções exageradas em relação à expectativa de inflação.

É no câmbio, no entanto, que os três homens cotados para assumir o Ministério da Fazenda concordam quase integralmente. Palocci, Coutinho e Mantega são defensores ferrenhos da política adotada desde janeiro de 1999, após a maxi-desvalorização do real. Todos os três nem pensam em mudar a política de câmbio flutuante, sem controle direto do governo na cotação do dólar, como ocorreu no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, quando, por uma decisão do Executivo, R$ 1 era capaz de comprar US$ 1. A questão da valorização do real diante da moeda americana, e a consequente perda de competitividade dos produtos brasileiros no Exterior, preocupa. Mas não a ponto de se realizar uma desvalorização por meio de uma canetada. “É preciso entender que a maneira correta de enfrentar a valorização cambial é a produtividade”, afirmou Palocci. Mantega também se diz vigilante em relação à valorização da moeda brasileira, mas é enfático ao afirmar que não será tomada nenhuma medida que vá contra a política de câmbio flutuante.

Apesar das divergências entre os três, uma coisa é certa: as linhas gerais de condução da economia brasileira pouco mudarão nos próximos quatro anos.

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