i53452.jpgUm dos poucos ministros remanescentes da equipe de Lula do primeiro mandato, o ministro da Cultura, Gilberto Gil, resolveu despedir-se do cargo na quartafeira 30. Em duas ocasiões anteriores – final do primeiro mandato e final de 2007– Gil havia pedido a Lula para sair. Agora, o presidente finalmente aceitou. No lugar de Gil, assume definitivamente o secretário-executivo, Juca Ferreira, que, com as constantes licenças do titular da Pasta, já era quem comandava de fato o Ministério. Criticado por se dedicar mais à música do que ao cargo público, Gil realmente era, mas não estava mais ministro da Cultura. A situação do ministro- cantor no governo chegou ao fundo do poço depois de reportagem publicada por ISTOÉ, há um mês, sob o título “O ministro sumiu”. De acordo com a matéria, com base em consulta à agenda oficial do ministro, este ano Gil havia passado mais tempo de licença – três meses e meio – do que em atividade pelo Ministério, contados os dias em que efetivamente despachou. No total, Gil percorreu, durante as viagens e turnês destinadas a apresentar a europeus e americanos o álbum Gil luminoso, mais de 60.745 quilômetros, o que corresponde a uma volta e meia ao redor do mundo.

A ausência do ministro vinha irritando o presidente Lula e também integrantes do Ministério da Cultura, pois, de acordo com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siaf), a Pasta só havia executado até o final de junho 12,8% do seu orçamento para 2008.

Numa entrevista no Palácio do Planalto, depois de reunir-se com o presidente Lula, Gil reconheceu que estava vendo a proporção de 80% de dedicação ao Ministério e 20% às atividades artísticas se desequilibrar. “Aquela dose inicial em que previ trabalhar foi se desequilibrando um pouco. Eu tive de me dedicar um pouco mais (à carreira).” Ao realizar um balanço de sua gestão à frente do Ministério, Gil fez uma autocrítica e uma crítica a Lula: não ter conseguido um orçamento mais generoso para a Cultura. “As dificuldades todas com as contas governamentais, o superávit e essas coisas todas que são conhecidas de todo mundo fizeram com que não atingíssemos a meta de 1% do Orçamento da União que era o desejado por nós e o recomendado pela Unesco”, disse um resignado ex-ministro. “O governo do presidente Lula significa uma refazenda extraordinária do País. Amanhecerá tomate e anoitecerá mamão…”, disse, declamando trechos de sua canção Refazenda, que simbolizaria seu ciclo na gestão petista.

Embora respeitado como artista no Brasil, durante sua passagem pelo Ministério da Cultura, Gil bateu de frente com produtores e artistas. Já em 2003 chegou a ser acusado de querer cercear a liberdade de expressão ao propor a criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav). “A atuação dele foi um fracasso. Ele foi ausente, não poderia estar no cargo dessa forma. Não combateu a pirataria ostensivamente, talvez porque nunca tenha sofrido pressões”, ataca o cantor Fagner. Mas outros apontam avanços, como o programa Pontos de Cultura, projeto de baixo custo que permitiu, em parceria com organizações da sociedade, a chegada de internet, ilhas de edição e pequenos estúdios de gravação a favelas, comunidades quilombolas e aldeias indígenas. Para o cineasta Luiz Carlos Barreto, Pontos de Cultura “foi a iniciativa mais importante que um político já fez pela cultura do Brasil”. Ao deixar o comando do Ministério, já que não conseguia mais conciliar a tarefa de ministro com a de artista, Gil acertou duas vezes: continuará sendo um embaixador da cultura brasileira mundo afora, ao mesmo tempo que entrega a Pasta a quem tem condições de dedicar-se a ela exclusivamente.