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SENSÍVEL
Kevorkian é retratado como
amante de música e pintura

Como alguém passa de vilão a herói? Três anos após deixar a prisão, é essa a situação do Doutor Morte – o médico americano Jack Kevorkian, 82 anos. Defensor do suicídio assistido, ele ajudou mais de 130 pacientes em estado terminal a acabar com suas vidas durante os anos 90. Em 1999, foi condenado pela morte de um deles. Atualmente, entretanto, sua imagem está sendo revista por causa de uma cinebiografia, “You Don’t Know Jack” (Você não conhece Jack), e um documentário, “Kevorkian”, ambos do canal HBO. O filme está em cartaz no canal a cabo do Brasil; o documentário, ainda não. Nos dois casos, o viés é simpático ao médico, revelando uma faceta poética e artística pouco conhecida por trás do homem que carrega a alcunha de Morte. Pintor, instrumentista e compositor ocasional, apaixonado por música erudita, especialmente Bach, Kevor­kian poderia ser descrito como uma pessoa de alma sensível.

A trajetória que levou o médico a se tornar mundialmente famoso começou em 1990, quando ele ajudou uma professora que sofria de Alzheimer a morrer. Em seus suicídios assistidos, o método se repetia: o próprio paciente acionava um mecanismo que liberava as drogas ou o gás que o levariam ao sono eterno. Em 1998, porém, Kevorkian aplicou a injeção que matou um de seus pacientes, caracterizando a chamada eutanásia ativa. Além disso, filmou o procedimento e fez com que fosse exibido na tevê. Condenado por homicídio, cumpriu oito anos e meio da sentença até obter liberdade condicional há três anos.

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NA TELA
Al Pacino interpreta o médico
em cinebiografia

Com Al Pacino no papel de Kevorkian, “You Don’t Know Jack” já deu mostras da revisão em curso sobre o Doutor Morte. Durante a cerimônia do Emmy, no mês passado, na qual o ator foi premiado, Kevorkian, que estava na plateia, foi ovacionado pelo público. Na obra, ele aparece pintando e tocando flauta. “O filme revela o lado humano dos envolvidos e corrige os mitos perpetrados por imprensa, igreja, governo e classe médica”, diz Neal Nicol, amigo que ajudou Kevorkian em diversos suicídios assistidos e autor do livro “Between the Dying and the Dead” (Entre os moribundos e os mortos), no qual o filme se baseou.

Assim como a cinebiografia, “Kevorkian” mostra um Doutor Morte que poucos conhecem, falando sobre música e sobre suas pinturas. “Essa humanização faz justiça ao indivíduo, pois o mostra sob outros prismas”, diz Carlos Vital, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina. O biólogo José Roberto Goldim, chefe do Serviço de Bioética do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, diz que os filmes podem gerar simpatia pelo retratado. “O bom é que essas obras promovem um debate importante na sociedade”, diz. Na vida real, porém, Kevorkian vive bem longe da glamourização que cerca seu nome atualmente. Com a saúde debilitada e dificuldades financeiras, ele se mantém apenas com o dinheiro da previdência social, uma vez que os suicídios não eram cobrados – um dos mitos derrubados pelos filmes, aliás.
 

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