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TRANSFORMAÇÃO
Desde a proclamação da república pelo herói nacional, Atatürk
(acima), a Turquia vem estreitando laços com países como o Brasil, que já levou para lá diversas
empresas pelas mãos do embaixador Jardim e do presidente do LIDE, João Doria Jr.

 

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Na franja da Ásia, no ponto exato da interseção com a Europa, fincado entre os dois continentes, existe um tigre engasgado que quer rugir mais alto. E sua economia robusta, em franca evolução – capaz de entregar taxas de crescimento anual da ordem de 11% –, está dando razões para tanto. A estrela comercial de cidades turcas como Istambul e arredores brilha forte e nos últimos tempos se empanturrou com um banho de ocidentalização, numa versão capitalista e inquieta do antigo dragão chinês, transformado em potência nas últimas décadas. A Turquia, a contragosto dos vizinhos, que ainda resistem em integrá-la à União Europeia, vem conseguindo a proeza de avançar sem auxílio dos países desenvolvidos. Criou um mercado consumidor jovem e efervescente, com mais de 70 milhões de habitantes aptos a comprar e já gera um Produto Interno Bruto (PIB) de algo em torno de US$ 600 bilhões. Nessa plataforma há hoje cerca de 250 zonas industriais e os usuários de celulares saltaram de virtualmente nenhum nos anos 90 para mais de 64 milhões recentemente. A Turquia, decerto, está produzindo seu próprio milagre, abrindo à força uma brecha entre as nações ricas. E olha para nichos econômicos pouco visados pelos demais. Dezenas de empresários turcos comandam cadeias de hotéis em Moscou, bancos na Bósnia e na Grécia, projetos de rodovias no Iraque e grandes operações comerciais com Irã e Síria. As exportações saltaram de US$ 3 bilhões nos anos 80 para algo em torno de US$ 132 bilhões neste ano.

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E agora, 20 anos depois do golpe militar que estabeleceu uma nova Carta Magna, a Turquia acaba de consolidar a maior de suas conquistas. Em plebiscito no domingo 12, após o Ramadã, a população aprovou, com 58% dos votos a favor e 42% contra, uma reforma constitucional modernizante. Antigas reivindicações, como o fim da imunidade de generais patrocinadores do golpe, o aprimoramento dos direitos civis, reforçando a igualdade entre os sexos, e a liberação de greves de fundo político, que até aqui eram proibidas, entraram em vigor. Pelas mãos do premier turco, Recep Tayyp Erdogan, maior beneficiado com a vitória na votação, que dá respaldo a seu governo, o país deseja finalmente quebrar a resistência à sua entrada na UE – um sonho acalentado há mais de 50 anos.

Nunca será demais lembrar que a Turquia ocupa uma posição geopolítica estratégica, particularmente no que se refere à segurança da Europa. O Mediterrâneo Oriental, o Mar Egeu, os Bálcãs Ocidentais, a região do Mar Cáspio e o Cáucaso Meridional, a Ásia Central e o Oriente Médio são áreas em que o Ocidente pouco ou nada conseguirá sem o apoio da Turquia. Causou tremor recentemente o fato de ela, juntamente com o Brasil, ter concedido apoio ao plano de desenvolvimento nuclear do Irã para fins pacíficos. Brasil e Turquia, desde então, vêm firmando uma espécie de aliança de interesses político-comerciais com grandes frutos. Corporações gigantes brasileiras estão avançando sobre esse território como quem enxerga um novo eldorado de oportunidades. O portento de aviões Embraer acaba de acertar uma encomenda de 14 aeronaves para lá, abrindo as portas de um mercado que pode ser seu cartão de visita na região. A Vale do Rio Doce também iniciou operações na Turquia neste ano. Um voo regular Brasil-Turquia passou a ser operado pela Turkish Airlines desde maio. Com um comércio bilateral ainda tímido, de pouco mais de US$ 2 bilhões anuais, estagnado por décadas, Brasil e Turquia vão paulatinamente estabelecendo uma nova cadência de aproximação. Há poucos meses Erdogan encontrou-se com o presidente Lula e fechou uma joint venture para a exploração de óleo no Mar Negro a uma profundidade de quatro mil metros. A expertise brasileira na exploração em águas profundas teve seu teste decisivo naquele país já em fins do ano passado, quando uma monumental operação de deslocamento de uma plataforma da Petrobras foi iniciada e atravessou o Estreito de Bósforo, sob a romântica ponte que liga o lado oriental ao ocidental de Istambul. “Brasil e Turquia estão vivendo em 2010 um movimento singular de êxito e estabilidade”, disse na ocasião Erdogan, para quem os dois países já entraram no palco das grandes potências.

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O embaixador brasileiro na Turquia, Marcelo Jardim, tem a convicção de que esses laços serão ainda mais estreitos daqui para a frente. Como grande articulador desse movimento, com credenciais e sinal verde para incrementar o fluxo de negócios bilaterais, Jardim recebeu há poucos dias uma caravana de empresários brasileiros, com mais de 30 representantes de companhias como Brasil Foods, Audi, Mapfre, Tetra Pak, Vivo, Amil e Itautec, liderados pelo presidente do LIDE-Grupo de Líderes Empresariais, João Doria Jr. A caravana teve oportunidade de travar contato com executivos locais, em jantares e encontros informais, e conheceu mais a fundo o potencial econômico do país. “Foi um grande intercâmbio”, disse Doria Jr. O que resulta dessa diversificação de parcerias turcas é uma economia mais aberta e dinâmica. Não faz muitos anos, o país concentrava suas atividades empreendedoras em organizações estatais, com restrição à entrada de capital estrangeiro. Isso mudou, como vêm mudando rapidamente várias das antigas crenças e valores nessa terra que abrigou o império otomano e por onde passaram mais de 12 civilizações – dos persas aos hititas, dos gregos aos romanos, que por lá permaneceram quase mil anos.

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CONECTADO COM O FUTURO
Um vibrante e jovem mercado consumidor nasceu em cidades
turcas como Istambul, trazendo para as empresas uma avalanche de mais de 64 milhões
de usuários de celulares

 A Turquia turbulenta de guerras e golpes militares ficou para trás. Iniciou sua trajetória transformadora ainda no início do século passado, quando Mustafa Kemal Atatürk proclamou a república e virou herói nacional, nos moldes do brasileiro dom Pedro I. Atatürk ainda hoje é considerado um mito por imprimir revoluções que marcaram para sempre a vida dos turcos. Foi ele quem aboliu a poligamia, a obrigatoriedade do véu, trocou a língua do país e a moeda. Fundou um Estado laico, parlamentar, nos moldes europeus, e adotou o alfabeto latino. De Atatürk a Erdogan, a Turquia não parou de se reinventar. É bem verdade que ainda convive com uma inflação renitente, de mais de 10% ao ano, e pratica a mais alta taxa de juros do planeta, batendo inclusive a do Brasil. Curiosamente também nesses trilhos de inflação e juros os dois países parecem andar colados. Brasil e Turquia, mesmo assim, converteram-se em locomotivas da retomada. Enquanto o mundo financeiro segue em caos, oferecendo sinais de retrocesso econômico tanto na Europa como nos EUA – e em boa parte do resto do mundo –, os dois atores em desenvolvimento estão galvanizando as atenções com suas marcas de investimento recorde, queda de desemprego e aumento da base industrial instalada. Plantada como uma ilha de prosperidade em meio ao retrocesso de nações próximas, Istambul virou uma miragem encantadora. Seus quase 15 milhões de moradores e 17 milhões de turistas/ano fizeram da metrópole um entreposto cosmopolita de ideias, seitas religiosas, comércio e produção. A cara resplandecente de uma Turquia que quer se projetar.

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EXPLORAÇÃO NO BÓSFORO
Lula e Erdogan acertaram uma joint venture para exploração de
óleo no Mar Negro com a Petrobras, presidida por José Sérgio Gabrielli

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