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IRONIA
Da Nova deveria moralizar as contas. Terminou flagrado pelo Disque-Denúncia

A Arquidiocese do Rio de Janeiro, um dos mais importantes postos da Igreja Católica no Brasil, está novamente envolvida em um ruidoso escândalo financeiro. O ecônomo Abílio Ferreira da Nova, 77 anos, cuja atribuição é administrar os bens e as contas bancárias da diocese carioca, foi preso pela polícia no domingo 5 no Aeroporto Internacional Tom Jobim, quando tentava embarcar para Portugal com 52 mil euros (cerca de R$ 115 mil) não declarados. Não há, por enquanto, nada que configure crime contra a Igreja e seus fiéis, por mais estranho que seja um padre ter tanto dinheiro vivo – ele alegou ser herança de família. “Meu único pecado foi não ter declarado o dinheiro”, disse ele, afirmando que a soma iria para seus parentes pobres de Portugal. É crime tentar sair do País com uma pequena fortuna de forma não oficial. A ironia é que o monsenhor foi colocado no cargo há pouco mais de um ano justamente para limpar as manchas deixadas por seu antecessor, o padre Edvino Steckel, acusado de ter gasto em torno de R$ 14 milhões em despesas não justificadas ou desnecessárias.

Toda essa situação vexaminosa ocorre nas barbas de dom Eugênio de Araújo Sales, uma das lideranças religiosas mais atuantes da segunda metade do século passado e cardeal dos mais poderosos do pontificado de João Paulo II (1978-2005), de quem era amigo pessoal. De 1971 a 2001, dom Eugênio comandou com mãos de ferro a arquidiocese do Rio, que seguiu à risca as orientações de Roma e ditou regras, mesmo que de forma não oficial, para as demais arquidioceses do País. Por isso, os sucessivos escândalos envolvendo a conservadora Igreja carioca ganham um significado que vai além dos possíveis golpes financeiros. “Talvez Dom Eugênio não tenha tido, ainda, um sucessor à altura de sua capacidade administrativa e seu conhecimento da realidade do Rio”, analisa o teólogo João Batista Libânio, da Faculdade de Filosofia e Teologia dos Jesuítas de Belo Horizonte. E ele já teve dois: dom Eusébio Scheid, até 2009, e dom Orani Tempesta, o atual.

A Polícia Federal chegou ao religioso por meio de uma ligação anônima para o Disque-Denúncia na qual detalhes como nome completo e voo foram fornecidos. Da Nova responderá por evasão de divisas, crime com pena de dois a seis anos de prisão. Já padre Steckel, protagonista do escândalo anterior, não tem nenhuma dívida com a Justiça e está apenas afastado da diocese. Ele teria comprado um apartamento de R$ 2,2 milhões para servir de residência a dom Eusébio Scheid, no Rio, quando este se tornasse ex-arcebispo. “Uma coisa são os problemas de gestão de recursos da Igreja. Outra, é um padre viajando com dinheiro que, até prova em contrário, era dele”, afirma o teólogo Névio Fiorin, da ONG Iser Assessoria.

O caso lembra o episódio ocorrido em 2007 com Estevam e Sônia Hernandes, da Igreja Renascer em Cristo, presos em Miami pelo FBI. O casal foi liberado dias depois, mediante pagamento de fiança e era monitorado 24 horas por dia. O monsenhor Da Nova ficou poucas horas detido. Segundo o advogado criminalista Wanderley Rebello, a lei prevê esse direito, mas ele acredita que o fato de se tratar de um padre pesou. “A Justiça é desigual. Já vi pessoas na mesma situação permanecerem presas”, diz.

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